ARDóSIA 25 : Repercussão
* “U.T.I. do Hospital Estadual – Bauru”
De acordo com as informações mais recentes do médico de plantão, o estado de saúde de Tânia é “estável”. Após dois dias em coma, respira sem a ajuda de aparelhos.
- Moça de sorte essa aí. Tomou uma bala na cabeça e sobreviveu!
- Homem não presta mesmo, né? Não valem um saco de cocô!
- Já vi muita mulher ser baleada pelo marido quando é flagrada junto com o amante... mas o inverso, é a primeira vez! Só podia ser mesmo lá em Ardósia.
- Tanto faz marido, amante, namorado... O último homem decente morreu na cruz faz mais de dois mil anos!
- Puxa, minha mãe tava querendo mudar pra lá. Dizem que é bem sossegado, quase sem violência... Mas agora isso. Assassinato por ciúme.
- Chifrudo tem em tudo que é lugar! E cê tá pensando que lá homem é melhor? É tudo a mesma caca!
- Amiga, você dormiu de novo com o Ariosto?
* “Centro comercial – Ardósia”
As pessoas caminham fechadas em seus agasalhos; o clima frio é acentuado pelo vento cortante. No bar, tomam seus cafés, suas cervejas, comem seus salgados... Um “por favor” daqui; um “obrigado” acolá... Não se ouve muito mais que isso. O clima é sombrio. A notícia do primeiro assassinato na cidade deixou a população estupefata. Até mesmo quem sequer tem noção do significado de “estupefato”. Seu Ananias e seu Zirbone, dois velhos aposentados que vivem discutindo num dos bancos da praça, estão sentados, lado a lado, em incomum silêncio. Os rostos de quem passa são tensos, sobrancelhas eriçadas. Agnaldo, engenheiro ardosiense, é a primeira vítima registrada de um crime tão violento na cidade. Sua esposa, Tânia, de fama não muito agradável, sobreviveu, mas foi por pouco. Transferida para um hospital em Bauru, está entre a vida e a morte.
* “Delegacia Seccional de Polícia – Jaú”
- Doutor Pampulha, e esse caso de Ardósia? Por que é que a gente tá nele? Já não temos roubos suficientes por aqui para investigar?
- Pois é, Epaminondas... Estamos só dando uma mão pros caras. O pessoal de lá tá perdidinho! De vez em quando tem um furto... Prendem quem deve pensão alimentícia... Mas homicídio? Acho que a polícia tá até assustada!
O delegado Pampulha e o investigador Epaminondas caem na gargalhada.
* “Delegacia de Polícia - Ardósia”
...
* “Residência da Família Dota – Ardósia”
Téo, Gil e Laura estão sentados no quintal da casa, xícaras de café nas mãos. Um olha para os detalhes da cerâmica do piso... outro balança a colher para melhor misturar o açúcar na bebida... o terceiro observa o pardal que passa rasante. De repente, o silêncio é rompido.
- Gente, não pode ser... O Roni nunca faria uma coisa dessas!
Laura esbraveja:
- Amor, esse teu amigo sempre foi um tarado sem-noção. Acho que desta vez passou dos limites! – esbraveja a garota.
- Olha, ele pode ser completamente sem-noção, mas não é assassino. – pondera Gil – Se fosse matar toda mulher que desdenha dele, a ala feminina de Ardósia estaria pela metade!
- Não sei.... O que eu sei é que minha amiga tinha decidido acertar sua vida com o Naldo! Ela ia mudar de verdade! Contou pra mim, ia ser uma esposa perfeita! E o Roni estragou tudo... Matou o Naldo e a Tânia.... Putz, nem sei como ela tá viva.
- Eu conversei com ele... Fui até a Cadeia e ele tá arrasado. Jura que não fez nada. É verdade que também não deu nenhuma explicação convincente. Mas os policiais confirmaram que o patrão de Roni pediu para ele ir até lá dar um recado pro Naldo.
Laura levanta-se.
- Téo, não acredito que você foi conversar com um assassino!
- Amor! É o Roni!
Ela já lhe deu as costas...
* “Cela da Delegacia de Polícia – Ardósia”
No interior da pequena cela, Roni está sentado no chão em um dos cantos. Do outro lado, três homens assustados, de pé, conversam baixinho entre si. Estão ali porque deixaram de pagar pensão alimentícia a filhos e/ou ex-mulheres. Com exceção de um ou outro batedor de carteira, são esses os freqüentadores daquele precário local.
Roni sente uma espécie de poder em seu peito. Afinal, é temido por seus conterrâneos. Ao mesmo tempo, porém, não quer passar o resto de seus dias atrás das grades e nem, principalmente, como o primeiro assassino de Ardósia. As recordações, aos poucos, chegam à sua memória. Nada ainda que explique o que aconteceu. Já sabe, entretanto, que foi até a casa de Tânia para dar-lhe um recado sobre a cama nova que encomendara. Conversava com ela quando, de repente, tudo se apagou. Nada mais. Ela estava, sim, de camisola naquele dia, mas não tão transparente quanto parecia ao vê-la morta no chão. “Isso só pode ser coisa daquele velho safado, o Nicolau. Ele sabe o que aconteceu. Tem tudo escrito lá!”.
Tais informações já foram devidamente passadas por Roni à polícia. Até o momento, em nada alteraram a situação, como se percebe.
* “Delegacia Seccional de Polícia – Jaú”
- Caraca, num tô entendendo porque cargas d’água é que o Anilton precisou esperar a carona dos “polícia” de Ardósia para ir até lá?
- Melhor assim. É uma tremenda dificuldade achar o caminho daquela cidade! Eu mesmo nunca consegui chegar! Nem é bom que as pessoas fiquem sabendo disso... A fama da polícia na comunidade já não é lá essas coisas!
Alguém enfia a cabeça pela porta do escritório: “Doutor Pampulha! É o Anilton no telefone”!
O delegado ouve satisfeito as informações do outro lado da linha. Ao desligar, conta para Epaminondas:
- Novidades! A vítima acordou e, apesar de ainda não conseguir falar muito, contou onde encontraremos uma prova importantíssima. O Anilton vai com o pessoal de Ardósia encontrar a tal pista e resolver logo esse caso!
Agora é esperar pra ver.