AI!! QUE MEDA DO VOVÔ

FARSA - Um tipo de peça teatral que surgiu por volta do século XIV. Em geral é breve, tem poucas personagens e pretende provocar o riso explorando situações engraçadas, grotescas, ridículas da vida cotidiana, apelando para a caricatura e os exageros. (Tufano Douglas,1995, p. 23).

AI! QUE MEDA DO VOVÔ

Vovô era um menino com cara de velho, tinha os cabelos espetados, quase brancos, não possuía lábios, não sei como falava e como falava.

Eu, naquela idade... Nem menina, nem mulher, sei lá...Desprovida de qualquer volume.

Magérrima, seca e porque não dizer quase esturricada.

Eis que o desgraçado do Vovô encasquetou com minha magreza vergonhosa e passou a me torturar.

Não podia me ver, começava gritar alto para o mundo inteirinho ouvir: - Magricela, magricela, magricela...

Quando eu o avistava, disfarçava, até cortava caminho para chegar em casa, quase grudada com a dele.

O tratava com formalidade com intuito de não ser achocalhada, não surtia efeito.

Era quase um fiapo, minha mãe se esmerava para satisfazer meu paladar, na esperança que minhas tripas não grudassem uma na outra.

Nas tardes, mamãe me presenteava com o quitute mais saboroso, na esquina havia uma padaria que confeccionava um pão doce coberto com doce de leite, hum! Delícia!

Não podia ir comprar, o Vovô não deixava, ademais, tinha meda de contar meu drama para meus irmãos mais velhos e depois Vovô me matar.

Resolvi fazer um pacto de cordialidade com Vovô, eu lhe daria MAIS da metade do meu pão se deixasse de me xingar, quase morria vendo o infeliz se deliciando com meu pertence, mas não adiantou, piorou, agora ele queria o pão inteiro e quando não estava se deliciando com minha merenda, a palavra magricela, magricela...Não parava de sair daquele orifício bucal (desculpe, leitor refinado).

Então,Vovô começou a me empurrar, xingava, empurrava e comia meu pão, fazia tudo ao mesmo tempo.

O melhor presente ofertado por Deus, para nós mulheres, atende pela sigla TPM.

Dormi com receio do Vovô e acordei estranha, quase esquisita!

Decidida esconder do mundo minha magreza e comer meu pão doce.

Antes de abrir os olhos, propositei encerrar aquele ciclo de tortura.

Dei um pulo da cama, pela primeira vez vi balançar meu rabão rajado de onça.

Pulei fortalecida, destemida,vingativa, brava.

Contratei um comparsa, meu irmão caçula.

Esperamos todos saírem, escondi um cinto grosso atrás da porta e fui à cata do meu algoz, nem demorou, lá veio ele: - Magricela, magricela...

O convidei, ir até minha casa comer bolo, fui o toreando com palavras dóceis e ouvindo Vovô recitar aquele mantra que o leitor já sabe.

Quando ele colocou o pé dentro da sala, meu irmão o puxou, tranquei a porta, passei a chave para meu ajudante, a escondeu.

Ainda, Vovô me xingava, achava ter poder sobre mim, até ver a grossura do cinto dobrado na minha magra mão, magra, contudo, firme.

Não sei como minha voz ganhou entonação masculinizada e a dele, afeminada:

- Vovô, hoje você vai apanhar tudo que merece, vai me xingar de magricela e depois nunca mais...

Vou arrancar tua língua e dar para o Duque comer.

Duque, um cachorro guaipeca com título aristocrático, no entanto, não lhe era servido ração balanceada.

- Não! Não! Dédinha! - Hã! então, sabe meu apelido?

Mas agora você vai continuar me chamando de magricela.

- Me chama de magricela Vovô??

E dê-lhe cintadas, ele pulava mais alto que jumento novo.

- Eu nunca mais vou te chamar de magricela! Você é a Dédinha!

E o cinto "véio" zunia nas pernas do ex torturador.

Meu irmão, misericordioso abriu a porta e Vovô saiu tropeçando, comendo vento, nunca mais meu pão!!

Naquela tarde, saboreei meu pãozinho gostoso, deitada no sofá, lambendo meus finos dedos.

Encontrei um colega da época, trouxe notícias frescas do Vovô, ele é muito alto, pesa mais de 100 kg.

Pasmem! Vovô é Vovô.

Considerações Finais:

A construção textual causa ao leitor, impressão lúdica quando encadeamento frasal é organizado com simplicidade.

No mundo do discurso não há estados emocionais indiferentes, competência nula ou sujeito neutro.