DRIGO E O PRIMEIRO DIA

Era mais uma segunda-feira na vida de Drigo, estava uma manhã radiante, lembrado uma orquestra teatral, abrindo as cortinas do céu tendo na platéia como convidado único o Sol, apreciando a melodia singela dos pássaros, entoando em coral. Mas nada disso tirava a lombeira de Drigo, que encolhia-se no canto da cama, feito um vira-lata tomando chuva. E aos berros na cozinha, sua mãe o chamava:

-Acorda muleque! São seis e meia, cê vai chega atrasado!

Os rúgidos foram inúteis, ela foi até o quarto e chacolhou-o impetuosidamente, esperando alguma reação. Mas a inércia era tanta, que nem Newton poderia exemplificar físicamente como aquele corpo não se alterava em seu estado de repouso. Então, sua mãe, já uma fera pela desobediência do mandrião, voltou a cozinha, trazendo mansamente até a ponta da cama um copo d'água e sampou-lhe na cara. Drigo desvencilhou-se tão rápido dos lençóis, lembrando uma manhã de natal que ansiosamente aguardou por vários meses um videogame, trocado por camisas, cuecas e um suéter xadrez, que pisou num objeto pontíagudo, fazendo-o imitar os pulos do Saci-Pererê, sem bastar, ainda cabeçea a prateleira dos velhos gibis. Enfim encontrou arrego no chão, onde massageava seu pobre pé. A mãe, pelo título de progenitora deveria propor auxílio a seu amado filho, só esbanjou um irônico sorriso e disse:

-Bem feito, o café tá na mesa.

Cambalendo, Drigo ajeito-se em uma das cadeiras da mesa, sonolento apoiou o cotovelo em cima dela e desgutou seu cereal. Sua mãe enxugando a louça, perguntou:

-E aí, preparado pro primeiro dia no ensino médio?

Enrustido, disse:

-Tô.

-Não parece, tá mais pra lá do que pra cá.

-E que eu tô com dor de barriga, acho que num vai dá pra ir hoje, não...

-Ah, mais cê vai nem que for amarrado numa cadeira de roda! Come seu cereal e vai se arruma!

Após a inútil tentativa de ludibriar sua mãe, Drigo foi preparar-se para escola.

No ponto de ônibus ele sentiu um leve desconforto estomacal, não produzido pelo alimento que consumiu, mas pela ansiedade que o fazia transpirar. Chegando na escola, Drigo atarantado, procurou sua sala de aula, achando-a postou-se na última carteira, talvez quisesse se isolar, evitando algum constragimento.

No final da terceira aula Drigo estava quase dormindo, exausto de ouvir tantas apresentações e conselhos, foi despertado pelo confortante sino do recreio, ops...! do intervalo, Drigo não poderia comenter esse erro, pronunciar "recreio" no ensino médio, significava que sua mãe o levava até a entrada da escola, arrumava a gola da camisa e dava um beijo na bochecha, mas por sorte ou astúcia, Drigo não caiu nesse buraco. Indo para o INTERVALO, sentiu um aroma peculiar vindo do banheiro, tomado por uma súbita curiosidade, dirigiu-se à fonte do cheiro. Entrando no banheiro, Drigo viu um grupo de skatistas, compartilhando do mesmo cigarro, ele não teve nenhuma reação espantosa, há milhares de anos as pessoas dragam um fumo, mas Drigo ficou um pouco confuso com a atitude daqueles jovens, a primeira vista, com os olhos rubros, pensou que os playboys choravam, então essa verdade desmentiu-se, quando as risadinhas entre eles começaram, um deles disse que o Kurt Cobain mandou um "salve" do além. Um pouco tonto, Drigo saiu de lá.

Parado na fila da cantina, Drigo esperava e de longe secava uma empada, chegando sua vez, freneticamete pediu o último salgado, como de costume admirava sua forma dourada, frágil, a quentura aquecia sua mão naquela manhã fria. Ele escolhia o local exato para dar a primeira dentada, quando no fundo do refeitório ouve-se um grito:

-Guerra de comidaaaaa!

Abordado por uma grande balburdia repentina, Drigo se encontrava nos Desembarques da Normandia, onde rastejou-se para escapulir da mira dos bombardeiros de comida. Desesperado por um reduto, Drigo deixou cair a empada, por um lapso de tempo ele via o salgado, como um companheiro ferido na guerra, todos ali gritavam, mas Drigo fixamente olhava para empada, buscando um força sobrehumana que pussese suas pernas petrificadas em movimento para tentar salva-lá, mas era tarde demais para ela, logo foi pisoteada por um gordinho que escorregou e de bunda caiu, passou o dedo na calça para descobrir que comida era. Drigo conseguiu sair do meio da algazarra, e foi parar na parte de trás da escola, Drigo explorou o local e encontrou um muro quase cedendo, estava pixado com alguns nomes, declarações de amor, palavrões e do outro lado havia um terreno baldio, andando um pouco mais, Drigo começou a ouvir uns gemidos que o levaram até um pequena fenda que dividia o muro, por mais essa situação curiosa que comandava sua vontade própria, inocentemente Drigo pôs somente a cabeça do outro lado, quando ele viu uma cena inédita em sua vida, suas reações foram internas, pois seus olhos regalados e sua boca aberta continuaram por segundos intactos, até aquele momento de sua vida, nunca tinha visto dois adolescentes se beijando daquele jeito, especificamente quando só a garota usava os lábios... enfim, Drigo tornou-se mais maduro depois daquele momento. O alarme soou, despertando-o da hipnose e cativando-o a correr, já que o casal de jovens viu-o espionar, voltou para a classe de aula aguardando o fim daquele seu primeiro dia no ensino médio.

Chegando em casa, sua mãe pergunto-lhe:

-E aí, como foi?

Com uma voz fúnebre, respondeu:

-Legal...

Logo trancou-se em seu quarto, e não quis saber de papo.

No jantar, Drigo fazia contornos no prato com o garfo, ainda cheio pela falta de apetite, a mãe percebendo sua tristeza abordou:

-Vamô, desembucha.

Timidamente, Drigo recolheu o cotovelo da mesa, e retrucou:

-Não gostei do ensino médio.

A mãe pela vasta experiência de vida, pensou em perguntar o motivo do desgosto que amargava seu filho, mas preferiu dar um conselho, dizendo:

-Querido, a vida não é um jogo de videogame. Você não pode desliga-lá quando você se cansa dela. As decepções virão, quanto mais cedo enfrenta-lás, melhor será. Hoje não foi um dia bom, mas poderá ser melhor amanhã. Tudo bem?

-Tudo.

-Então, me diga como foi seu dia?

Já que a mãe insistira na pergunta, Drigo contou tudo, tim tim por tim tim. Ouvindo todas as situações inusitadas desde dia turbulento, sua mãe trancou-se no quarto e não quis saber mais de papo.

drigo andarilho
Enviado por drigo andarilho em 02/07/2012
Reeditado em 01/08/2012
Código do texto: T3757027
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