Memórias Finais De Um Condenado

Nesta fria cela continuo esperando

Enquanto o tempo segue contra mim

Ouço a morte tocando baladas em seu bandolim

O prenúncio de que está chegando

Em um milhão de coisas penso

Meu coração pulsa forte

Pois fui abandonado pelo destino e pela sorte

Minhas mãos tremulam, estou tenso

Clamo a Alá, Buda, Jesus Cristo

Mas a culpa grita em meus ouvidos

Não vejo o porquê de meus erros serem absolvidos

Olho nos olhos da lua e digo-lhe que desisto

Em frente à minha cela, o velho relógio de cordas

Olhando para mim com o brilho da prata de suas bordas

Quando à meia-noite se ouvir a última badalada

Minha voz será eternamente calada

Lá fora os corvos cercam famintos

Estão aos montes,em grande número

Devorar-me-ão dos pés a cabeça,do joelho ao úmero

Amaldiçoando minha alma no agouro de seus instintos

Num mundo medieval

Tornei-me prisioneiro de um passado

Cada avanço que eu trouxe foi rechaçado

E o mundo não evoluiu,em razão de um motivo trivial

Não me submeti à pressão da igreja

Pois acreditava que a escravidão

Não tinha nexo com a razão

E que não é isso o que Deus nos deseja

Caçaram-me como se eu fosse um bruxo malfeitor

E eu vivi sobre a sombra de um inferno inquisidor

Anos se foram e eu enfim achei a paz

Que se esvaiu entre minhas mãos ao som de um galope voraz

Tomado pela angústia da visão de um cavaleiro

Ergui minha espada e assassinei

Um...bondoso e inocente tropeiro

O sangue em meus dedos deixou meus olhos vermelhos

E o arrependimento pesou meu coração e caiu de joelhos

Então eu desisti e me entreguei

Prenderam-me e impiedosamente fui torturado

Estupraram minha filha e minha esposa

Deram suas carcaças de alimento a uma raposa

Tudo isso pra que meu nome fosse desonrado

Puseram-me nu e preso aos pés da estátua do imperador

Envolto por multidões no meio de uma praça

Para que sob um calor que queima e assa

O sol do dia atiçasse minha dor

Em seqüência, mandaram-me a ilha dos isolados

Para onde vão todos os condenados

Um lugar sem céu azul ou sol nascente

Apenas uma fria escuridão latente

Quisera eu voltar

Mas nesta era sou incapaz

Mas se pudesse...não,eu não faria o contrário

Aquilo era uma ideologia,não um pensamento temerário

O algoz do destino

Pronuncia meu nome

E então o medo some

E minha ultima oração...eu não termino

Quando meu primeiro passo é dado

Já consigo me ver no topo da colina

Agonizando abraçado com a neblina

Sem os pés no chão...enforcado

Ao meu lado a morte silencia sua canção

Em honra a meu coração

Olho para ela,não mais apreensivo

E sinto o sabor de seu beijo doce,fúnebre e lascivo

Quando a corda me enlaça

Vejo a lua num horizonte brilhoso

Sorrio para ela,num momento esperançoso

Ouço ela dizer adeus enquanto me abraça

Olho para a morte e digo obrigado

Não desejo que este segundo seja prorrogado

O carrasco puxa a alavanca,caio em direção ao nada

Minha lenda está enfim...terminada!

Éderson Rosa
Enviado por Éderson Rosa em 09/06/2012
Código do texto: T3715147