Ditinho, O burrico apareceu!
O burrico apareceu
Um ano se passou desde que Ditinho emprestou seu burrico para o sacristão Prudêncio.
Ditinho nunca guardou mágoas, sempre foi à luta, apesar de ser um garotinho mirradinho, tinha “um calo no dedão do pé” que se fosse pisado... Ah! Rapaz, tava arrumado.
Mais uma festa no Quiririm, e o rapazinho se preparava alegremente, pois nesse ano foi escolhido para representar a escola no campeonato de jogo de botão, jogo que na naquela época realmente era feito de botões de roupas, lixados artesanalmente em formas exclusivas, não que o Ditinho fosse um artesão, mas tinha uma sorte danada ao preparar seus “jogadores”.
Antes de sair de casa, seu irmão Zé Milton relembrou...
“Ditinho... Vai a pé ou de burro”.
Danado, Ditinho não deixou pra menos a gozação...
“Se você abaixa aqui eu vou no cê... Mais se eu for pensar bem, você é um burro meio empacado, eu vou é a pé mesmo”.
Chegando na festa, Ditinho foi logo ganhando a primeira partida... Concentrado, preparado, estimulado, ganhou uma atrás da outra. As partidas eram eliminatórias rápidas, não tinha tempo para deslizes. A festa rolava solta, tinha bingo, doces, música, brindes, prêmios, palhaços e muito mais.
Os jogos foram chegando ao final, a última partida de botão estava prestes a começar e o árbitro pediu a atenção aos competidores...
“Gente peço um instante de atenção... O padre Ignácio vai falar do principal... Os prêmios...”.
“Para o vencedor no campeonato de bola de gude o prêmio é uma bicicleta que foi doada pelo doutor Marcondes”. E apareceu a bicicleta...
A criançada urrou...
“Para o vencedor dos jogos de corrida com saco, salto em distância e corrida com a bandeja, cinco sorvetes da mercearia do Seo Sauro, doces variados doados pela dona Zifirina e um patinete doado pelo senhor Miné.”.
E lá veio seo Sauro com cinco vales sorvetes e a dona Zefirina com um bandejão de quitutes, mais foi o patinete que chamou mais a atenção. A criançada cresceu os olhos e lambeu a testa...
“Outros prêmios foram anunciados, até que chegou a vez do jogo de Botão”.
“E para o vencedor do jogo de botão... Atenção!... Um burrico, doado pelo padre da paróquia de São José”.
A criançada caiu na risada, pois o burrico veio puxado por um velhinho que coitado quase não podia com o peso dele mesmo, e pra ajudar... o bichinho soltou um traque daqueles bem soltados...
Porém, Ditinho foi o único que não achou graça, olhou para aquele animal pequenino e pensou... não pode ser coincidência, o tamanho mini, uma orelha maior que a outra, a cor cinza desbotada, a letra “A” marcada no pescoço, e mais alguns outros detalhes tais como o bicho hipnotizados olhando o sanduíche que um rapazinho degustava ao lado do padre.
Ditinho não se conteve...
“Esse é o meu burrico que eu dei pro Prudêncio tomar conta, e ele comeu todinho...! Ou ele mentiu, ou o bicho é gêmeo!”.
Foi uma baita confusão, o dono do bicho tava pra ganhar o dito cujo de novo...
“Padre, pode ir me explicando, como é que o meu burrico saiu da barriga do seo Prudêncio, e tá aqui de novo”.
“Ah Ditinho... mistérios que só os sacristãos podem explicar, pergunte você mesmo, ele está na barraca do pãozinho de Santo Antônio”.
“É bom que Santo Antônio esteja do lado dele mesmo, porque eu vou lá pra dar um coice nele”.
Chegando lá Ditinho foi logo questionando Prudêncio...
“Me conta ai seo Prudêncio, como é que o meu burrico apareceu como prêmio”.
“Bom Ditinho, eu vou explicar sem rodeios... Quer saber, foi a sua mãe quem me pediu para dar um fim no animal, pois ela acreditava que se o bicho não desaparecesse você ia importunar até ela deixar você ficar com o bicho, e falar que comi ele foi o melhor que me surgiu naquele momento”.
“Ah, então é por isso que eles riram da minha cara. Falei pra eles que o burro tava na tua barriga e só falto eles me pedirem pra levar um pedaço, huumm.. deixa comigo”.
De volta ao jogo final, uma partida eletrizante... gritos, torcidas, vaias e palmas.
O vencedor pra variar, foi Ditinho, que levou o prêmio puxado pela mão esquerda e com a mão direita segurava o seu botão goleador... chamado “esquerdinha”, um velho botão lixado nas beiradas, havia pertencido a uma casaca portuguesa.
Juntou-se a ele o Prudêncio, e lá foram para casa de dona Valica... Chegando lá Ditinho correu para sala aos gritos...
“Mãe... mãe... mãe...”.
“O que é que aconteceu meu São Benedito, que gritaria é essa”.
“Mãe eu ganhei o jogo e o prêmio agente vai come agora... vai ligando o forno que é pra num perde tempo...”.
“Que é isso moleque, que prêmio, que come o que”.
“É mãe, vem vê... Chama os manos também”.
Quando Valica e os irmãos surgiram na porta e viram Prudêncio segurando o burrinho, os irmãos surpresos, e a mãe acanhada disse...
“Nossa Ditinho como esse bicho parece com seu burrico...”.
“Não mãe, não parece não... É ele mesmo. E a senhora não lembra que queria um pedaço? Pois então... é só assa”.
Finalizada as gozações Ditinho generosamente doou o seu prêmio para o sacristão, porém alertou o bendito dizendo...
“Vê se num come ele de novo heim”.