A história  é um roteiro para casamento caipira, baseado em fatos reais que aconteceram na família. Não escrevo sobre roceiros de um modo pejorativo, pois, nasci e cresci na roça e tenho orgulho disso. No texto não há armas de fogo nem noiva grávida. Espero que gostem.

     Sô Osvardo Quintão é  viúvo e pai de  Mané Rodorfo Quintão, os dois foram numa fazenda lá da Serra da Canastra, de propriedade do Sinfrônio Capitão,  para marcar casamento do Mané com a Frorentina, filha mais nova do fazendeiro. A moça tem uma irmã mais velha solteirona, a Crementina. No dia do casamento estava  tudo pronto:  povo no altar, toca a música  e entra uma noiva com o rosto coberto por um véu.
     No início da cerimônia o  padre manda a noiva descobrir o rosto  e aí  começa a confusão.

 
                                   Personagens

 
 
*Padre: 
 
*Mané Rodorfo Quintão: o noivo (em traje típico do caipira, e paletó amassado, um pé de  botina e outro de chinelo, com um curativo no dedão, lenço ao pescoço)
 
*Frorentina: uma das noivas (em vestido típico caipira, buquê, ela fica escondida durante a primeira parte)
 
*Crementina: a  noiva encalhada (vestida de noiva também, usa véu no rosto)
 
*Osvardo Quintão: O  pai do noivo é viúvo, usa uma botina e também tem o dedão do pé com curativo, compraram só um par de botinas e cada um calçou um pé.
 
* Sinfrônio Capitão e Sinhá Chica: (Os pais da noiva. Ele de bota e ela de salto alto)
 
*Expedito e Tunica:  padrinhos do noivo: vestidos de caipiras.
 
*Valdomiro  Zulmira: padrinhos da noiva: entram em cena vestidos de caipiras.
 
                        Altar arrumado    
 
     O padre entra devagar, muito sério, vestido de batina, faz sinal da cruz, abençoando os presentes. 
 
     Em seguida entra o noivo de braço dado com o pai, pois é órfão de mãe. Os dois mostram ao público que estão ambos com um pé de botina num pé e um chinelo noutro pé.
 
     Depois entram os pais da noiva:  Sinfrônio Capitão e a esposa Sinhá Chica.  Eles tomam os seus lugares no altar. ao lado do padre.                                                                          
 
     Entram um a um os casais de padrinhos dos noivos e também se acomodam no altar.                    
                                                             
     Ouve-se a música (Tunico e Tinoco) e todos aguardam ansiosos  a noiva, que entra lentamente com o rosto coberto por um véu.
 
     O padre levanta as mãos para  o público  e abençoa dizendo:  
 
Padre: Orapronóbis, quiabus, abemus chester! 
 
Padre: Istamu tudo riunido aqui hoje pá modi casá o Mané Rodorfo Quintão, fio do Sô Osvardo Quintão mais a finada dona  Antonha Perpeta Quintão,  cá fia do fazendero Sinfrono Capitão e Sinhá Chica. 
 
O coronel Sinfrônio: levanta a mão:  
 
Sinfrônio Capitão: Ô padi, ieu quiria falá um trem, uma coisa pru sinhô.
 
Padre: agora não meu fio, dexa pa dispois, agora bamu casá a Frorentina mais o Mané.
 
(falando isso o padre continua a cerimônia e pede a noiva para retirar o véu)
 
Padre: Minha fia, pode tirá o véu pá nóis vê ocê dizeno o Sim.
 
A  noiva meio relutante retira o véu e todos se assustam.

Todos: OHHH!!!
 
Mané Rodorfo Quintão: Essa moça aí num é a minha noiva  Frorentina! Essa aí é irmã dela. Ocêis tão quereno mi passá manta, a impurrano a Crimintina  qui num ranjô casamento inté hoje!
 
Crimintina: Agora cê tem qui casá cumigo, já tamo aqui na frente do sô vigaru!
 
Mané Rodorfo Quintão: Num caso cocê nem morto. Ieu quero a Forentina!!!
 
Padre: Arguém pode mi ixpricá o qui tá aconteceno aqui?
 
 Sinfrônio Capitão: Bem qui ieu tentei avisá pru sinhô, mas num mim dexô falá...
 
Sinhá Chica:  Na nossa famia as moça mais nova num  casa in antes das mais véia não. A Crimintina já tá prá lá dos trinta e a Frorentina tem só dizoito. Aí nóis trocô as noiva. Mais posso agaranti qui a Crimintina é moça boa e trabaiadera, sabe fazê biscoito, torrá farinha, fritá toicim, fazê quêjo, fazê sabão...Inda torra café!
 
Mané Rodorfo Quintão: Ô dona Chica. Ieu lá quero sabê si minha muié sabi torrá café? Ocêis tá cuma fia incaiada e ieu qui pago o pato? Prifiro morrê sortêro e virgi.
 
Padre:  Ocêis arresorvi essa pendenga qui ieu num tenho o dia intero pá ficá aqui não.
 
Crimintina: (Com cara de choro) A nem! Num diantô nada ieu cuá café prele na minha carcinha, num diantô nada ieu ponhá o Santoantõe de cabeça pra baxo. Ieu quiria tanto mi casá...
 
Osvardo Quintão: Oia aqui minha gente... Ieu tô matutano, a Crimintina tá memo  mei passada pru Mané, meu fio. Mais ieu só viúvo e já andei negaciano ela e acho qui ela é uma moça munto trabaiadera e bunita, si fô da vontade dela ieu caso qu’ela é agora memo sô!
 
Crimintina: Ieu quero! Ieu caso cum o sinhor, sô Osvardo Quintão. Num vô sê pinguela da Frorentina de jeito ninhum!
 
Mané Rodorfo Quintão: E ieu uai! Cumé qui ieu fico? Cadê a minha Frorentina?
 
A Frorentina grita lá do fundo e entra apressada, usando um vestido de noiva também.
 
Frorentina: Pera aí gente! Tô aqui meu amô! Ieu num sei fazê sabão, nem torrá café, memo assim ocê inda qué casá cumigo?
 
Mané Rodorfo Quintão: Num picisa trabaiá não minha frô, nóis compra sabão im pó e café torrado. Corri aqui modi nóis casá!
 
Toca outra vez a música de casamento e agora finalmente entra a noiva do Mané. O viúvo Osvardo Quintão de braço dado à noiva Crimintina, o Mané Rodorfo dá o braço à  Frorentina e todos ficam diante do padre:
 
Padre: Então,  vô logo acabá cum esse fuá, isso já demorô dimais da conta, eu declaro o pai o fio e as duas irmã, uma véia e otra nova tudo  casados, maridos e muiés. Práocês vivê cum muito amô, lá  nos  rancho docêis, sem oiá pa mais ninguém. Capinandu a roça de mío, cuidanoo das prantação i povoandu o arraiá cum argumas dúzia de fios.
 
E abençoa:
 
Padre: Em nome do cravo, da rosa e do manjericão! Agora o povo já podi jogá arroiz nos noivo qui é preles  sê filizes.
 
 E viva us noivo minhas gente!

 E Viva Saõ João!

( Entra alguém com um cesto grande e joga pétalas de flores com arroz)
 
 


                           Dicionário mineirês:
 
Passar manta: enganar, ludibriar.
Fazer pinguela:  é quando uma irmã mais nova se casa antes da mais velha.
Fuá: confusão.
Negaciano:Espreitando, olhando de longe.

 
    *Na roça antigamente, as moças que não eram bonitas e queriam se casar,  precisavam aprender: costurar, bordar, fazer doces,  quitandas e muito mais! As bonitas aprendiam só se quisessem. 
  

 Nota:  Agradeço aos meus leitores,  pelo carinho e incentivo  que sempre me dedicaram, desde que comecei a publicar minhas histórias e causos aqui no Recanto das Letras.
Muito obrigada a todos e um abraço do tamanho da Serra da Canastra!!!

 



 
 
 
 
 

 
 
 
 

 
 
 

 
 
 
 
Maria Mineira
Enviado por Maria Mineira em 24/05/2012
Reeditado em 28/05/2012
Código do texto: T3685234
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