As chaves do Marcha Lenta

Marcha Lenta faz jus ao apelido. Devagar, devagar, devagarinho. Mas, mesmo com toda a sua lerdeza consegiu se empregar. Auxiliar no

bar do João. Foi um pedido pessoal. Pediram ao prefeito que intimou o

João:

_ Quebra essa...

E assim Marcha Lenta estava lá recebendo as orientações do João

que não iria, é claro, perder a oportunidade de curtir com a cara do

menino. Depois das instruções primordiais, ele, João, afirmou:

_Olha aqui, Marcha, presta muita atenção... esta chave aqui, ó, olha

bem, com essa marquinha, é pra abrir o bar e esta outra, lisinha, ( a

cópia ) é pra fechar. Não vai me perder nenhuma delas, senão nós ta-

mos ferrados.

E saiu, deixando o Marcha Lenta decorando a lição. É claro que o João

espalhou, rindo muito, a piada pra todo mundo.

Religioso, o Marcha não podia ver o padre passar na porta do bar:

_ Bença, padre...

_ Deus te abençoe, meu filho...

Só que se o padre passasse dez vezes por lá, ah, dez vezes tinha

que abençoar o Marcha. Até que um a tarde, já pela oitava benção

do dia, o padre apelou:

_ Olha aqui , meu filho, em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo,

eu te abençoo pelo resto da sua vida...

Três dias depois, sábado, um calor dos infernos, sol já na casa das

onze horas, João chega e encontra o bar fechado e num canto, sen-

tado, a cabeça entre as pernas, chorando, o Marcha Lenta.

_ Que isso, pirralho, ficou doido. Num abriu o bar até agora, com um

solão desses, quer me derrubar, é?

Marcha Lenta engoliu um soluço e entre os dentes, confessou:

_Ô sô João me perdoe... eu perdi a chave.

_As duas??!!

_Não ( chorando ), não... só a de abrir, a de fechar tá aqui no meu

bolso.