HOJE ESTOU FELIZ
Somos tão felizes! Quando criança adorava um agrado, um elogio. Nunca fui presenteado no material porque meus valores eram da vida mesmo. Adorava quando meu pai me via laçando um bezerro para curar. Chegava batendo palmas me deixando vangloriado. Aquilo fazia com que me sentisse gente.
Como estou feliz não posso vagar pelo mundo de meus filhos, tão computadorizados e globalizados. Minha infância foi tão grande, tão grande que hoje consigo lembrar até de minha primeira laçada. Meu pai, meu primeiro amigo; da janela dando as coordenadas: “Levanta mais o braço, deixa o bicho correr....” Não consigo transformar em palavras aquela sensação de ser arrastado por aquele bezerro naquele curral lamacento. Meu pai apareceu como sempre, me ajudou a segurar o bicho e fez questão que eu mesmo curasse como se aquilo fosse um diploma. Tinha lá meus míseros sete anos de idade. Ponto.
Meu vício capitalista queria dizer dos filhos de hoje e não vou falar. Só vou falar que adoro escrever e nunca meu pai esteve por perto porque partiu para a outra. Nem sei se gostaria porque nunca foi de muita leitura, mas de uma sabedoria...
Como disse, adoro escrever. Quando escrevemos, lavamos nossa alma. A escrita e também a leitura nos leva a outras dimensões, nos livrando dos vícios capitalistas. Como sonho de pelo menos um livro meu vagar pelo mundo propagando alguma coisa boa; não no intuito do ganho e sim da idéia de um que disse: “Devemos ter um filho, plantar uma árvore e escrever um livro”.
Pois bem. Hoje, 06 de maio de 20l2. Cheguei de BH onde fui visitar minha filha aniversariante vinda de Moçambique; tem base? Por lá ela trabalha para ganhar e crescer seu conhecimento. Esqueci de como os brancos são chamados por lá. Disse ela que por lá os brancos são uma minoria danada! Cá já estou eu esquecendo da felicidade falando do tal do preconceito.
Nessa viagem, antes de minha filha aparecer, conheci uma pessoa, secretária da cultura num daqueles municípios da grande BH, professora de português e de uma sabedoria lingüística muito maior que a minha. Fiquei pequeno perto dela e ao mesmo tempo me senti grande porque ela valorizou o que fiz.
Quando invocamos a escrever deveria ser como aprender laçar. Mas não o é. Naquele tempo era eu, meu pai e o bezerro. Coitado do bezerro! Hoje o bezerro novo sou eu! Meus próprios filhos não gostam do que escrevo. Hoje, a máquina florescente é muito maior que o pensamento fazendo com que um vídeo game substitui um pai. Nunca. Nunca. Nunca! Inda bem que o ser humano é mutável e com o tempo até filho meu vai descobrir que a beleza de uma flor depende de suas raízes.
JOSÉ EDUARDO ANTUNES