Uma boa pastagem, ou seja, um suculento e verdejante gramado é de importância fundamental para os grandes e pequenos rebanhos se alimentarem. Na roça quando se diz que a grama cresce, não é exatamente em gramados que pensamos. Pensamos mais na grama/capim das pastagens.
Havia um sitiozinho solitário perdido na imensidão da Canastra, casa de avós, onde crianças alegres passavam as férias. Toda manhã tinham leite puro, leite que estava diretamente ligado à grama que é consumida e ruminada lentamente em horas de silencioso mastigar dos animais com seus grandes olhos voltados para o chão e para o céu, olhos enormes e quietos. Daquele ruminar ao entardecer, dependia o leite tão saboroso na manhã seguinte.
Além das vacas, cabritos e aves, havia ali um burrinho velho deixado pelo boiadeiro que pediu pouso e ao tentar pagar a hospedagem, o avô se recusou a cobrar. O animal era de cor marrom, pelo ralo e olhos mansos. Virou montaria de intrépidos cavaleiros e amazonas, passava os dias pastando a grama que crescia verdinha, ali em volta da casa. Puseram-lhe o nome de Burrim Véi.
A menina começou a protegê-lo, tão manso e indefeso parecia ser. Até convenceu o avô a construir um cocho, onde depois dos passeios pelos pastos, o deixavam ficar comendo farta e sossegadamente o milho, as canas e até cenouras que as crianças traziam da horta.
Dizem que os burros têm mais intuição que os cavalos, principalmente para distinguir o perigo, em estrada molhada, para descer morro e até para atravessar rio, o burro é mais garantido.
Nas férias de final do ano a menina foi a primeira a chegar, procurou no gramado onde o burrinho ficava e não o encontrou. Com o coração apertado perguntou ao avô:
—Cadê o Burrim Véi, vovô?
O avó nunca mentia para os netos e com semblante triste contou:
—Seu tio vendeu ele...
—Vovô, cumé qui o sinhor teve corage de deixá vendê ele? Por quê?
—Ieu num dexei minha fia, sabia qui ocêis tinha amor nele. Foi seu tio qui vendeu, no dia qui o vô num tava im casa.
O tio apareceu e sem um pingo de dó foi logo dizendo aos sobrinhos
—O burro véi docêis, uma hora dessas já virô salame. Oia as butina novinha qui ieu comprei com os cobre...
A menina chorou sem parar. Se recusava olhar para o tio, não falava com ele. Não pedia mais a benção. Era seu inimigo. Não gostava nem de ver as roupas dele no varal. Um dia o tio ficou doente e quase morreu.
O avô pegou a neta pela mão e levou-a até o tio. Ela olhou-o e saiu do quarto correndo. Sentia um mal estar enorme diante dele, uma coisa inexplicável.
Depois de algum tempo a convenceram voltar a falar com o tio. A benção ela tomou de longe, com medo que ele morresse. Não disse mais nada. Sua presença a magoava, isso durou anos.
A cicatriz ficou, apesar do tempo ter se encarregado de amenizar, fazer doer menos.
Restou a saudade do Burrim Véi... Em volta da casa a grama cresceu.
*Esse texto faz parte do Exercício Criativo: "A grama cresceu". Acessem o link abaixo e leiam os outros autores que desenvolveram textos com o mesmo tema.
http://encantodasletras.50webs.com/agramacresceu.htm
Havia um sitiozinho solitário perdido na imensidão da Canastra, casa de avós, onde crianças alegres passavam as férias. Toda manhã tinham leite puro, leite que estava diretamente ligado à grama que é consumida e ruminada lentamente em horas de silencioso mastigar dos animais com seus grandes olhos voltados para o chão e para o céu, olhos enormes e quietos. Daquele ruminar ao entardecer, dependia o leite tão saboroso na manhã seguinte.
Além das vacas, cabritos e aves, havia ali um burrinho velho deixado pelo boiadeiro que pediu pouso e ao tentar pagar a hospedagem, o avô se recusou a cobrar. O animal era de cor marrom, pelo ralo e olhos mansos. Virou montaria de intrépidos cavaleiros e amazonas, passava os dias pastando a grama que crescia verdinha, ali em volta da casa. Puseram-lhe o nome de Burrim Véi.
A menina começou a protegê-lo, tão manso e indefeso parecia ser. Até convenceu o avô a construir um cocho, onde depois dos passeios pelos pastos, o deixavam ficar comendo farta e sossegadamente o milho, as canas e até cenouras que as crianças traziam da horta.
Dizem que os burros têm mais intuição que os cavalos, principalmente para distinguir o perigo, em estrada molhada, para descer morro e até para atravessar rio, o burro é mais garantido.
Nas férias de final do ano a menina foi a primeira a chegar, procurou no gramado onde o burrinho ficava e não o encontrou. Com o coração apertado perguntou ao avô:
—Cadê o Burrim Véi, vovô?
O avó nunca mentia para os netos e com semblante triste contou:
—Seu tio vendeu ele...
—Vovô, cumé qui o sinhor teve corage de deixá vendê ele? Por quê?
—Ieu num dexei minha fia, sabia qui ocêis tinha amor nele. Foi seu tio qui vendeu, no dia qui o vô num tava im casa.
O tio apareceu e sem um pingo de dó foi logo dizendo aos sobrinhos
—O burro véi docêis, uma hora dessas já virô salame. Oia as butina novinha qui ieu comprei com os cobre...
A menina chorou sem parar. Se recusava olhar para o tio, não falava com ele. Não pedia mais a benção. Era seu inimigo. Não gostava nem de ver as roupas dele no varal. Um dia o tio ficou doente e quase morreu.
O avô pegou a neta pela mão e levou-a até o tio. Ela olhou-o e saiu do quarto correndo. Sentia um mal estar enorme diante dele, uma coisa inexplicável.
Depois de algum tempo a convenceram voltar a falar com o tio. A benção ela tomou de longe, com medo que ele morresse. Não disse mais nada. Sua presença a magoava, isso durou anos.
A cicatriz ficou, apesar do tempo ter se encarregado de amenizar, fazer doer menos.
Restou a saudade do Burrim Véi... Em volta da casa a grama cresceu.
*Esse texto faz parte do Exercício Criativo: "A grama cresceu". Acessem o link abaixo e leiam os outros autores que desenvolveram textos com o mesmo tema.
http://encantodasletras.50webs.com/agramacresceu.htm