A Pinga
Zé Jacinto e Jacinto José são dois amigos inseparáveis. Desde o berço. Nasceram no mesmo dia, mês, ano e hora. E se pareciam muito um com o outro. Tanto que as más línguas diziam que as mães eram duas, mas o pai...
E foram crescendo pro mundo, aprendendo o que se tem que aprender pra se viver naquele lugar perdido de tão longe no interior das Minas Gerais. E um não largava do outro. Viraram tropeiros e saíram por este mundão de Deus, tocando os burros, tocando viola, tocando a vida. Em cada parada era um montão de novos amigos, namoradas, prosa boa, comida farta e boa pinga.
Numa dessas viagens de muitos dias bateram num arraial de nome Pedra Furada, por conta de uma pedra grande que o tempo abriu no meio um furo, por onde corria um córrego manso. Quando apearam chovia muito . Cuidaram da tropa e foram buscar a vendinha, se encostaram próximo ao "fogão de lenha", pra secar a roupa, pois, para o corpo pediram dois dedos de pinga da mais brava do lugar. O dono olhou a freguesia curiosa e vendo que os rapazes pareciam gente boa, de paz, serviu a amargosa, produto caseiro, curtido com as ervas mais danadas que o capeta plantara naquele rincão. Zé Jacinto levou o copo ao nariz, sentiu o cheiro, agradou-se, mirou um canto pra jogar pro Santo e sob o silêncio e o olhar da platéia mandou de vez, goela abaixo, a ¨mardita¨. De repente o homem foi ficando vermelho, teve um ataque ininterrupto de tosse e fazia tanta careta, colocando a língua pra fora e pra dentro, passando a mão na garganta, abria e fechava os olhos, apertava a barriga e ainda estava nesta transformação, quando o dono da venda perguntou pro Jacinto José:_ E o sinhô, moço, num bebe pinga não?
Jacinto José mirando o Zé Jacinto que já se recuperava pálido num canto, respondeu: _ Beber eu bebo, meu velho, mas desta que vira os outros pelo avesso eu não quero não...