O CASO DO DOCE DE GOIABA
 
     Lembrando-me de meu pai e das muitas estórias que ele contava, não sei dizer de verdade se ele inventava ou, se de ouvir, ia repassando, mas o certo é que sempre tinha uma estória inusitada pra contar; as mais mirabolantes possíveis. Hoje, me peguei lembrando de uma, que ele gostava sempre de contar, não de caçador ou pescador, com seus números exatos de peixes, em quantidades ímpares e definidas, mas uma estória de dois compadres que resolveram fabricar doce de goiaba. Vou tentar reproduzir aqui.

     Esses dois sitiantes vendo o desperdício de goiabas em suas propriedades resolveram aproveitar esse fruto fazendo doces e vendê-los nas feiras livres da cidade. E assim iniciaram a produção; mas cada qual com a sua, que era pra não dar confusão na hora da partilha. Algum tempo depois, um deles que tinha a maior plantação de goiabeiras percebeu que o companheiro conseguia uma produção bem maior de doce, com uma plantação menor de goiabeiras, portanto, obtendo maior lucro. Ele pensou, pensou, e resolveu sondar o amigo pra ver se descobria o que estava acontecendo:

     - Ô, Compadre... Como é que pode ocê com tão pouca goiaba tá bem de vida e eu aqui neste sacrifício, tô que nem vaca atolada no brejo... “Ajuda eu” aí que num tá dando...

     - Óia, cumpadre, vô contá o segredo: É que, como eu não tenho tanta goiaba, eu complemento com abóbora, que é baratinho e dá volume e a goiaba dá o gosto.

     Segredo descoberto, voltaram a produzir doces.
     Algum tempo depois o primeiro sitiante percebe que nada mudou. Estava na mesma dificuldade e o amigo cada vez mais rico.

     Lá foi ele ver o que estava fazendo de errado.
     - Ô Compadre... A estória da abóbora num tá funcionando “não”...
     - Uai, cumpadre, comé qu‘ce tá fazendo?
     - Como ocê falô. Misturando metade de goiaba e metade de abóbora!
     - Não, prest’enção, cumpadre... Num é metade, a proporção correta é de 3 pra 1. Três de abóbora e uma de goiaba.
     - Mas isso num vai ficá meio ralo não compadre?
     - Claro que não. Já disse a abóbora dá volume e a goiaba dá o gosto, ninguém nem vai perceber que tem outra coisa misturado. Tem que ficá mais isperto cumpadre... oh, sô!

     Problema esclarecido, voltaram a produzir os doces.
     Mais algum tempo e nada de melhorar a produção de doce. Já meio nervoso e decidido a dizer poucas e boas lá foi o sitiante novamente ter com o amigo.

     - Ô Compadre... Acho que ocê tá brincando comigo. “Faiz” um tempão que tô tentando fabricar doce e o negócio só dá prejuízo e ocê ta indo de vento em popa. Acho que ocê tá zoando comigo. A medida que ocê me deu num tá funcionando.

     O amigo puxa o chapéu de palha pra trás, coça a cabeça, vendo o nervosismo do compadre, e preocupado resolve tirar todas as dúvidas logo de uma vez pra ajudar o compadre.

     - “Mais”... é memo, cumpadi... Me diz uma coisa, com’é memo qu’ocê tá fazendo?
     - Uai, eu to fazendo iguarzinho ocê me falô, pra cada três quilos de abóbora eu coloco um quilo de goiaba que é pra render bastante.

     - Nããããoo, cumpadre... Tá tudo errado. Deixa de sê bobo sô! Ninguém aqui falô em quilo. Vem aqui dentro que vô te mostrá. Ispia só... Ocê tem que colocá treis abobrona deste tamanhão aqui ó... pra cada goiabinha desta aqui ó...



                            






Walter Peixoto
08/04/2012
Walter Peixoto
Enviado por Walter Peixoto em 23/04/2012
Reeditado em 24/04/2012
Código do texto: T3629656
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