desejo de letras
sim!
desses poços instalados comumente em terras sertanejas -
instrumento rudimentar próprio de tirar boa água na secura do período - eram muito mais comuns
lá pras bandas da minha infância -
no sonho eu imprimia um esforço descomunal urgente
querendo ver diante de mim o balde d'água -
uma repetição calada atormentava-me delirantemente -
sede sede!
embora sofrida a empreitada a sede era maior que a pena -
a manivela rangia de dor diante do peso que vinha -
faltavam alguns centímetros de corda e
eis que o balde pesado despontou cheio - pela boca -
mas não de água!
travei a manivela - puxei o balde junto a borda madeirada -
para minha surpresa estava repleto de letras - todas e mais -
do alfabeto inteiro repetidas - e coloridas -
de múltiplas cores - e números e também sinais -
tudo ali misturado!
lentamente fui retirando do recipiente cansado aquelas formas magníficas surgidas das profundezas da minha sede -
uma a uma com todo cuidado e carícia -
eu sentia que tudo aquilo havia de fazer sentido -
mas por alguma razão ainda carecido de ser revelado!
logo a asfixiante sede de água deu lugar
a sede voraz de construir palavras sentenças causos enfim -
repentinamente uma infinidade de frases temperadas de cores
foram despencando na idéia feito fruto madurado
num faz desfaz refaz constante interminável!
engraçado!
entre o rio de letras e de sinais não encontrei ponto final - vírgula -
ponto e vírgula - dois pontos e maiúsculas - de resto tinha tudo até números que não usei na montoeira de escrevinhação -
todavia - no curioso sonho arranjei serventia pras belezuras ao meu bel-prazer
quem precisaria de mais?
eu não precisei!
despertei exclamando e interrogando