A PEDRA DAS DUAS FORMIGAS

Estava um dia enevoado nas serras que circundam Itapipoca, em forma de L. A de Santa Rita, diz quem mora em Itapipoca, quando fumaça é chuva na certa. A dos Picos, que tem vários picos daí vem seu nome também é bom sinal de chuva, quando fica enevoada. Já estava em meados de fevereiro e o inverno havia chegado acerca de quinze dias. Muitos já tinham feito sua roça, incluindo-se o Seu João Quebra Queixo, caboclo bom de enxada, como ninguém. Roçadinho de três hectares ele limpava em dois dias, num piscar de olhos.

Neste dia vinte de fevereiro estava enevoado, como já se disse. Entretanto, o sol de oito horas da manhã estava dando sumiço à névoa e a serra estava ficando mais clara. Seu João Quebra Queixo, sentado no batente da porta de sua casa, olhava para a serra com o olhar deslumbrado. A mata verde como asa de papagaio da terra ou farda antiga de soldado do exército brasileiro(hoje é toda camuflada) deixava seu encanto natural para o embevecimento de todos. O pintassilgo cantava no galho da aroeira de tronco largo, os canários da terra trinavam e os galos de campina que também faziam sua moradia na serra gorjeavam de tal maneira que mais vermelhas ficavam as penas de sua cabeça. Enfim, a natureza exultava, estava em festa, com o chuá das cascatas dos picos e águas cristalinas correndo pelos rochedos.

Mas, como já se disse, Seu João Quebra Queixo sentado no batente da porta de sua casa observava aquela beleza natural, de boca aberta de tanta alegria. Pensava em seu roçado que, certamente, iria lhe dar sete espigas em cada pé. Como a terra era boa, o feijão também não iria faltar. Seu João enxergava muito, tinha verdadeiros olhos de lince ou da águia harpia. De longe avistava seus pés de milho, ainda pequenos porque o inverno apenas havia começado.

Estava Seu João com este olhar enfeitiçado, quando passa o Manuel Severino, querendo fazer graça com ele:

- Olá Seu João, bom dia. Como está sua família?

- Bom dia Manuel, minha família está boa. E a sua?

- Todo mundo bem. Seu João o que o senhor olha tanto pra serra? Está vendo alguma coisa?

- Estou sim. Vendo mocós, punarés e até as abas de seu chapéu que ficou pendurado nos garranchos daquela jurema preta, depois da carreira que você levou no forró do Chico Caím, no ano passado.

- O que é isso Seu João? Eu gosto muito do senhor, mas aposto um alqueire de milho como o senhor não está enxergando aquela formiga, lá naquele rochedo preto.

O Seu João com seus olhos de lince do batente de sua casa até a pedra a dois mil metros de distância respondeu:

- Como é que não estou vendo cabra besta. Você está falando da que está subindo ou da outra que está descendo?

Seu João, com toda sinceridade disse que é fato acontecido em 1940, na II Guerra Mundial.

Antonio Tavares de Lima
Enviado por Antonio Tavares de Lima em 03/03/2012
Reeditado em 09/04/2014
Código do texto: T3532692
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