O AMOR DA VELHA

O AMOR DA VELHA

Rosana já não aguentava mais aquelas visitas da senhora da outra rua. Já fazia mais ou menos três meses, que ela vinha todas as tardes no mesmo horário, pontual como sempre. Lá pelas quatro e quinze ela chegava, cumprimentava e ia direto sentando-se em uma das cadeiras disponíveis na varanda da frente. Ficava ali sentada calada, olhando o quintal, às vezes contava uma ou outra coisa que tinha acontecido com ela ou o marido, depois desfilava as novidades dos conhecidos e ia embora.

No inicio, Rosana achava a prosa da velha muito interessante, depois caiu na rotina, e começou a observar as visitas cada vez mais contínuas, sempre no mesmo horário. Tinha dias que ela trancava-se em casa, com vontade de fingir que tinha saído, mas a inconveniente senhora continuava vindo todos os dias de segunda a segunda, só falhava aos domingos.

Rosana cuidava para não mostrar-se aborrecida, com a freqüência da outra em sua casa, até que um dia resolveu indagar-lhe diretamente porque ela vinha a sua casa com tanta freqüência. A senhora se endireitou toda na cadeira, engoliu em seco e começou a confissão:

- Já faz tempos que eu conheço ele, sabe no inicio parecia apenas um simples conhecido, sempre me cumprimentava, quando eu o encontrava na missa, e tal e tal. Depois, parecia sempre que era coincidência, passei a encontrá-lo no mercado, e em muitos outros lugares. Imagina que já sei tudo sobre a vida dele, inclusive ele mora lá perto da minha neta.

Continuou contando, Rosana notou que os olhos dela se encheram de´lágrimas, mas não a interrompeu. Ela fez uma linda narrativa, e Rosana já estava ficando enjoada de tantos detalhes. Até que a velha senhora tirou dois pedaços de papel de dentro da bolsa pequena que sempre carregava. Um era o recorte de um jornal recente com uma página da coluna social, falando sobre um tal Breno Borjaski, que ele era um comerciante próspero na cidade e todos os detalhes de sua vida. O outro pedaço de papel estava bem amarelado pelo tempo, e lá estava escrito os detalhes do nascimento de Breno.

Rosana perguntou-lhe: - Quem é ele?

A velha senhora respondeu: - não sei mais, porque não tenho coragem de perguntar abertamente, é tudo o que consegui, mas algumas coisas aqui e ali. Sabe eu sou fiel ao meu marido, sou casada há 52 anos e nunca olhei para outro homem, Deus é testemunha, mas este homem revira minha alma. Ele se parece com alguém que conheci antes de me casar, sabe ainda na minha cidade natal. Eles são muito parecidos, não sei. E afundou-se em lágrimas e suspiros. Rosana não perguntou mais nada. Ela foi embora. Passou algumas semanas sem aparecer.

Voltou pela última vez envergonhada, chegou a ficar vermelha e confessou para Rosana: - Eu tento esquecê-lo, mas continuo só pensando nele. E quando penso parece que um imã o puxa para o meu caminho e o encontro sempre. Estes dias ele me ofereceu carona, estava chovendo, e pensei que não era nada demais, eu tenho setenta e cinco anos, ele nem tem cinquenta, ninguém iria falar mal de uma velha senhora. Peguei carona, ficamos conversando no meio do caminho ele errou o caminho e nos perdemos naquela estradinha que fica paralela a lagoa. Acabamos perdidos. Rimos muito. A hora passou e quase não me dei conta, quando cheguei em casa já estava escurecendo, e o Fernando preocupado já tinha saído de bicicleta para me procurar. Eu sinto uma coisa estranha, quando não o vejo, e quando não falo com ele. Pois agora ele me liga todos os dias no celular. Me chamou para fazer parte do grupo de voluntárias que atua na ONG onde ele preside. Eu sinto que gosto dele, como não me lembro de ter gostado de outra pessoa.

Pelo amor de Deus, Rosana, não me leve a mal, sou fiel ao meu marido.

E peço que não conte para ninguém o que lhe conto. Eu mesma não sei o que é este sentimento que sinto por ele.

Rosana imaginava a inquietação que vivia a velha senhora. Certa tarde, o Fernando veio até sua casa, procurando pela mulher, a Rosana respondeu que já fazia tempo, ela não vinha. Ele achou estranho, pois pensava, ou se enganara, mas achava que ela vinha todas as tardes visitar a amiga. Rosana não falou nada. No dia seguinte a velha senhora, voltou a visitá-la e pediu desculpas sem graça, pois afirmava que em suas saídas secretas com o Breno, dizia para o marido Fernando que estava com a Rosana.

Rosana achava aquilo tudo maluquice da velha. Um mês depois o Fernando morreu, três meses, depois a velha senhora e o Breno juntaram os trapinhos, depois de terem sido apanhados pela ex-esposa do Breno em uma cena de amor duvidosa, dentro do carro em uma rua lateral a lagoa.

Aradia Rhianon
Enviado por Aradia Rhianon em 29/02/2012
Código do texto: T3527204
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