VAI EXPLODIR... VAI EXPLODIR !

Uma aventura no Rio Araguaia ou na beira de um lago

Protagonistas: Eu, Wanderley e Luiz Carlos Siqueira da Hannover Tecidos da Moda, Jaime e Histênio, O Barriga, O Chiquinho, etc

Depois de estar morando em Goiás por bem mais de 20 anos e antes de vir, sem nunca ter molhado os pés nas águas do Rio Piranga em Ponte Nova, e sempre resistente a idéia de ficar em beira de rios, fui finalmente conhecer o majestoso Rio Araguaia, com todos os requintes que a tecnologia moderna oferece.

A insistência sempre foi e ainda é muito grande por parte dos amigos que aqui conquistei, mas a verdade é que eu sempre detestei ficar segurando vara de pescar por duas ou três horas seguidas em beira de rio, assistindo aqueles peixinhos malandros roubar a isca, que dá um trabalho danado pra repor.

Fiz um passeio em Formiga há cerca de 25 anos em Formiga, quando me reuni com meus primos Célio e Sodiel e mais uma turma boa, mas somente ficou a lembrança das cervejas e das brincadeiras e do Galdino comendo uma cebola num canto da sala, porque havíamos esquecido a comida na cidade. De peixe mesmo, não me lembro.

Meu negócio definitivamente não é ficar dando banho em minhocas mortas, ressecadas ou gosmentas. Sempre apreciei de fato as areias brancas de Cabo Frio, ou Guaraparí ou o tapete verde da minha mesa de sinuca ou o azul limpinho da água da minha piscina ou de uma mesa redonda para um bom jogo de canastra. Lar, doce lar, sempre fui amarrado à minha família e a minha poltrona.

Esse pavor de beira de rio sempre foi muito mais pelos mosquitos que ficam ali a fim de chupar o meu sangue que parece ser o preferido de todos eles. Se eu estou, a mosquitada faz a festa, parece que o meu sangue é do tipo especial, mais saboroso, mais doce e assim, o mais desejado. Mas isto, absolutamente não me envaidece, me deixa sim, irritado porque detesto ser o prato preferido em banquete de insetos.

Mas enfim chegamos em Aruanã, 300 kms. de Goiânia que tem uma população de 3.500 habitantes, mas que nos feriados e fins de semana deve chegar a 30.000 por causa dos Goianos sem nada que fazer nos fins de semana ou que querem ficar livres de muitas coisas que não vale a pena mencionar, pois não sou psicanalista e assim nos instalamos no famoso hotel Cangas e o simpático anfitrião dono da pequena pousada, o Eurípedes veio nos receber pessoalmente.

Carregamos bagagem e tralhas pra dentro dos aposentos simples e rústicos e já se podia ouvir o estalar das latinhas de cerveja pipocando no ar. Depois de um almoço diferente com peixes fritos da região e algumas carnes exóticas (uma farofinha de carne desfiada) e um pequeno descanso partimos para a etapa seguinte.

Um passeio de barco para fazer o reconhecimento do terreno, era o que eu mais queria como marinheiro de primeira viagem e assim fui atendido, cervejas geladas e repelentes se misturavam às varas e molinetes e a aventura começava, com todos seguindo à risca as recomendações de segurança com salva-vidas etc. Dizem que o mundo vai ficar sem água doce e eu digo a vocês, quem conhece o Rio Araguaia deve ficar morrendo de rir desses ativistas.

Eu com um tênis branco, novo, importado já começava a ser “repreendido” pelos amigos e alguns gritavam: - vamos batizar esse tênis. Mais à frente eu faço um pedido que não deveria ter feito:

- Dêem uma parada ali na frente que eu quero tirar a água do joelho. Ah... pra que ?

Quase me mataram. Alguns riam e queriam levar esse mineiro fresco de volta pra Goiânia e outras coisas desse tipo. Outros vociferavam: Jogue esse mineiro comedor de queijo dentro do rio pras piranhas (rs).

Eu agüentei o tranco e o pior estava pra acontecer. Pararam numa clareira, encostaram o barco e eu teria que descer e chegar até a praia. Disseram-me:

- pode pular isso é terra seca. Pode “irriga-la” à vontade. Como é que eu pude acreditar naquilo.

Pulei e atolei meu tênis novinho uns 40 cms. pra dentro do barro e gritei apavorado: Estou afundando..E todos caíram na gargalhada. Quando vi que parei de afundar, aliviado, olhei pra frente, um filhote de jacaré me encarando e surpreendentemente se assustou e correu. Foi um pesadelo. Fiquei traumatizado o tempo todo. Eu nunca havia enfrentado um filhote de jacaré a dois metros de distância, com o pé atolado, imobilizado, e talvez a expressão do meu rosto, o pavor que vinha dos meus olhos, tenha assustado o pobre bichinho.

No dia seguinte fomos acampar antes de Cocalinho e o Wanderley geléia, também chamado pé de ema, o mais encapetado de todos me recomendou que fincasse a minha barraca, próximo à margem da lagoa porque era mais seguro.

Que fincar barraca coisa nenhuma, fincaram pra mim. Eu achei que era fácil armar uma barraquinha daquelas, levei uma surra, pois quanto mais nervoso, menos você raciocina.

Enfim armaram a barraca pra mim e fiquei finalmente ali sozinho (eu e uma lanterna com pilha fraca que logo se acabou) e numa escuridão danada, sem experiência e o sono não chegava, quando o silencio na madrugada já me deixava maluco, eu ouvi barulho entre as folhas e um som parecido com um ronco e que foram se multiplicando e o barulho confuso, longe, de alguns passos.

Pensei, vem aí um porco do mato e vai me transformar do seu prato predileto. Rodeou, rodeou a barraca e meus batimentos cardíacos devem ter ido a 140, ou mais sei lá, a ponto quase de enfartar-me. O grito de socorro não saia, também pedir socorro pra quem? E o complexo de superioridade que fala mais alto? “Eu sou macho e não vou aqui dar meu braço a torcer mais uma vez”. Ainda mais, pra uma turma de bêbados e “inimigos” que queriam me ver ganhar experiência ou sei lá acabarem com o meu amor próprio de vez e pasmem, no fundo, no fundo, apesar das brincadeiras de mau gosto, todos ou quase todos, achavam que eu estava adorando aquela aventura e que com certeza eu voltaria mais e mais vezes.

Os roncos sumiram, adormeci vencido pelo medo e cansaço e no dia seguinte todos me perguntando se eu não ouvi o barulho das siriemas que deviam ser umas quinze passeando entre as barracas.

Eu disse, aliviado: Ah... Foram as siriemas sim, eu estava muito cansado e dormi.

No dia seguinte, fomos à pescaria. Lambuzamo-nos de óleo, estávamos munidos de repelentes, etc e finalmente aprendi a pescar e até dirigi a lancha e fiquei encantado com a minha audácia e já começava a tomar gosto, quando percebi que a noite chegava novamente e olhando o céu percebi que um temporal ameaçava chegar junto e sem pedir licença.

Todos na barraca, contando piadas, bebendo, outros contando vantagem dos peixes que haviam fisgado e outros elogiando a minha postura de já ter perdido a compostura e ter feito pipi várias vezes de dentro do barco mesmo e tentaram acender o lampião e a noticio ruim era de que o gás havia acabado e estava muito tarde pra voltar ao hotel e pegar o outro botijão que estava na caminhonete.

Foi ai que eu me lembrei que um cara prevenido vale por dois. Na minha sacola de tralhas havia dois pequenos bujões desses mini-lampeões e galhardamente os apresentei e fui saudado com o salvador da pátria.

Quando fui encaixá-lo, acho que muito nervoso eu o enrosquei de banda e aquele gás branco começou a sair chiando e o Wanderley geléia, aquele sacana, gritou VAI EXPLODIR... VAI EXPLODIR...

Eu sem mais nem menos, apavorado joguei o bujãozinho dentro do lago. Todos riram e diziam esse mineiro tem jeito não. Oh!!! Mineiro desajeitado, sô, etc.

Eu disse: Isso é o que vocês pensam: Eu tenho outro aqui de reserva e esse não vai falhar, vai ser nossa salvação: E todos olhavam e sussurravam, riam, cochichavam e eu parti pro encaixe.

Novamente encrencou e o Wanderley de novo: VAI EXPLODIR... VAI EXPLODIR

Não funcionou, realmente não era o meu dia de salvador da pátria e eu joguei o segundo bujãozinho fora, com medo daquela merda explodir mesmo.

O clima, não ficou bom, e decidiram voltar pro hotel e não acampar naquela noite e na volta 18 kms rio acima e com tempestade, mas chegamos não sei como.

No dia seguinte, pra me sentir mais seguro eu disse : Wanderley, eu vou ficar por aqui mesmo no hotel e vou me sentar aqui na margem e pronto. Amanhã nós vamos embora mesmo e assim eu não preciso me arriscar mais.

Mal comecei minha pescaria e os mosquitos invadiram meu braço de um jeito que o campo de pouso ficou lotado. Não havia mais lugar pra nenhum mosquito mergulhar e morder.

Cai na besteira de olhar pro Wanderley e dizer: Olhe só como esses mosquitos gostam de mim.

Ele como sempre sarcástico e gozador, me disse: Isso é psicológico, não tem mosquito algum no seu braço, você está apavorado a toa e com medo e fica inventando coisas.

Eu disse, filho da... e entrei pro restaurante do hotel e enchi a cara.

Querem saber ? Nunca mais fui pescar na minha vida. Vendi minha barraca, meu molinete, varas, anzóis, lanternas, lampião, muitas miudezas dei de presente, enfim foi um pequeno investimento na época de quase R$1.500,00 jogado fora.

Valeu a pena? Claro que sim. Ninguém fala mais em pescaria comigo. Fiquei livre de todos os pescadores aqui de Goiás. Pra não dizerem que estou mentindo, encontrei-me com um deles ontem na Chácara Cedro, aqui em Goiânia, na comemoração do dia Panamericano do Representante Comercial, na época, promovido pelo SIRCEG, com farta comida e muito chopp e ele me disse que o tempo faz a gente esquecer os desajeitados e que eu estava perdoado(rs) e que numa próxima ele faz questão de me convidar para que eu de uma vez por todas me convença de que pescaria é uma ótima diversão.

Fiquei caladinho e mudei de assunto.

Luiz Bento (Mostradanus)
Enviado por Luiz Bento (Mostradanus) em 24/02/2012
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