O INADIMPLENTE ASSUSTADO

Da série - Causos de Mostradanus

Histórias de um caixeiro viajante

O INADIMPLENTE ASSUSTADO

Trabalhando no ramo do comércio, durante muitos anos, aliás por toda a minha vida, sempre estive intimamente ligado à arte de vender, ou como dizem alguns: produzir e vender bens que satisfaçam às necessidades do consumidor a gente registra ocorrências pitorescas e algumas de arrepiar. Umas, dignas de serem contadas sem correr o risco de represália do protagonista principal da história, outras que a gente tem que procurar ser discreto para não ferir suscetibilidades.

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Enveredei-me pelo ramo de prestação de serviços e como representante comercial a gente pode colecionar perolas e essa abaixo é de morrer de rir.

Um cliente meu tradicional de muitos anos, comprando e pagando com regularidade, gozando de bom conceito de repente se torna vítima de um desses tsunamis do mercado: Crise violenta, culpa disso, culpa daquilo, culpa do governo, culpa dos impostos altos, enfim sobra culpa por todos os lados, menos aquele famoso e escondido e ou indisfarçável “mea-culpa”. Esse ninguém assume, pois ele não admite que comprou uma chácara sem poder, ou um carro zero daquele tipo “sonho de consumo” e exagerou na dose, enfim, não soube distinguir o dinheiro seu de fato, daquele que pertence a fornecedores, empregados e até mesmo aquela reserva de segurança que todos nós devemos ter para suportar uma crise, sem ter que desesperar e depois fazer parte daquele tal grupo 318 que anda por ai, fazendo milagres – rsss.

Resumindo: Sentamos-nos e discutimos a situação: Eu como representante do credor e ele como devedor assumido e pronto para pagar, fosse como fosse. Existia a chácara e então conversamos com a diretoria e essa resolveu aceitar negociar e fazer o acerto. Ele se prontificou a me levar no local, me mostrar a propriedade e lá fomos nós, no meu carro.

No meio do caminho, na volta, boquinha da noite, já com uma penumbra envolvendo o céu, aquele clima meio de crepúsculo, com praticamente tudo acertado, a gasolina dá sinal de que zerou. A luzinha amarela acendeu no meu painel e eu lhe disse que tinha que pedir socorro. O celular já existia, mas era ainda uma novidade. Usei e fiz uma ligação para minha esposa pedindo socorro (gasolina).

Olhei pra ele, sempre branco, muito branco, já estava muito mais pra um branco cera, bem pálido, suando e lhe disse : Fique calmo, fulano, eu vou abrir o porta malas e retirar o triangulo para sinalizar e daqui a pouco a minha mulher chega com a gasolina e vamos embora.

Quando eu abri o porta-malas e me abaixei pra pegar o sinalizador e ao procurar o meu amigo e cliente, onde estava ele? Olhei no horizonte, e o vi sumindo na curva, correndo feito um desesperado. Fiquei perplexo assistindo aquela fuga e ao mesmo tempo em que a decepção bateu por ele ter imaginado um absurdo daquele, fiquei rindo e fui embora.

Depois ele me procurou, pediu desculpas e confessou-se assustado e ficou tudo bem, fizemos o acerto e ele se tornou um fiel e regular cliente na condição à vista antecipado, compra até hoje e Nunca mais quis dever ninguém.

Luiz Bento (Mostradanus)
Enviado por Luiz Bento (Mostradanus) em 23/02/2012
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