LIMA DUARTE E O SERTÃO DA ZAGAIA - SACRAMENTO-MG (PASSA PERTO)

Estação de Sacramento

Submitted by Jornalismo on 12 April, 2008 - 08:55

Era ali sua estação:

Passa Perto,Passa Perto!

Sacramento! Sacramento!

Apear,descarregar,baldeação!

Sopé da serra do Cipó,

trem pra cima/trem pra baixo.

Fuligem no guarda-pó

e resfolego da Maria -fumaça:

“-Tô cansada,tô cansada!”

Acaba a ligeira parada;

o passageiro desperto,

o “guarda-chaves” se apressa,

o “limpa-trilhos” se move,

o bonde não existe mais

e o armazém já não guarda

o fruto dos cafezais! "-Viagem derradeira;

vou sem volta, vou pro nada, vou me embora,tô cansada

e deixo o adeus no meu apito:

-Piuí... Piuí... Piuí... Nunca mais eu passo aqui!

Deixo carros na estrada,

que corta terra e capoeira

e sobe a Serra do Cipó,

passa um corte, cachoeira, chega à gruta dos Palhares,

a Sacramento e seus pomares,

mas é apenas um caminho,

com acre cheiro de poeira!"

Que fazer do “tombamento”,

da estação de Sacramento?

-Nada, tempos já passaram

e vândalos a destroçaram

com o “apoio” do descaso!

Muitos passam indiferentes

e nem reparam nos seus restos,

ou olham com pouco caso,

para as ruínas espalhadas,

impregnadas de história,

e sonhos de tantas gentes,

que as vestiram de glória

e tocadas pelo hálito frio

de um outrora “Grande Rio”,

que preso mui lento corre,

pelo vento de outono que varre,

seus tristes restos imortais

e o nosso passado que morre,

cada dia um pouco mais!

Lima Duarte e o Desemboque

Submitted by SacraHome on 18 February, 2008 - 19:41

Artigo publicado na Revista Destaque In n. 67

"Ali...

Onde brotam as águas cristalinas

No cascalho virgem do córrego do Rolim

Sob as pedras redondinhas que escondem

A palha de arroz, o marumbé, a ferragem bonita...

Prelúdio de uma riqueza"

Insólito Desemboque

C.A. Cerchi, in Apologia Naturalista

Lima Duarte em DesemboqueNum domingo ensolarado de fevereiro de 2005 saímos de Sacramento com destino ao Desemboque. 70 km de uma viagem agradável ouvindo canções de Dr. Denizart e histórias do artista Lima Duarte. Ligeira parada no Tião da Curandeira, depois vertentes da Água Emendada, ribeirão Rifaina, chapadão do Bugre e da Azagaia. Permaneceram os nomes, hoje o reflorestamento de pinus e eucaliptos predomina. Cenário modificado, porém, existe ainda os ribeirões, serras e matas ciliares, resquícios de uma paisagem adormecida nos séculos da história do Julgado goiano que originou o Triângulo Mineiro. Na estrada batida cavada no cascalho o veiculo pára. Lá está o Desemboque, identificado por dois pontos claros na serra de vegetação rala à ribanceira do rio das velhas. As igrejas de Nossa Senhora do Desterro e um pouco acima a Igreja dos negros de Nossa Senhora do Rosário.

Lima Duarte desce do carro, abre os braços e exclama palavras que certamente acalentaram a sua existência de artista e ser humano sensível. Seus amigos fotografam, registrando o momento inusitado.

“O Tejo é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia,

Mas o Tejo não é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia.

Porque o Tejo não é o rio que corre pela minha aldeia”

Fernando Pessoa, Poemas de Alberto Caieiro

Lima Duarte buscou as suas origens ao longo de sua existência. Na ribalta, nas ondas sonoras, na maratona de gravações para a televisão, ou ainda nos filmes da sétima arte. O ator desemboquense criou personagens que estão no cotidiano do brasileiro. Para Lima Duarte o Desemboque tornou-se fonte de inspiração, misto de realidade e fantasia. É a sua terra natal? Irrelevante pergunta. Importa a criatividade e a utopia de atingir as estrelas. A rosa dos ventos deixa de existir como referência. O universo passa a ser o limite. Lima Duarte nasceu no Desemboque porque o espírito é universal. Seus personagens simples e puros tornaram-se paradigmas de autenticidade. Sassá Mutema pulou das telas do vídeo e faz parte do imaginário popular como Pedro Malazarte e Jeca Tatu.

“Visitei países, povos diversos. Molhei os pés no rio Nilo de vargens férteis. As profecias de Moisés se cumpriram. Do Tibet desce o mais extenso rio da China, o Yang-Tse. Nele afoguei minhas angústias. Caminhei no Tâmisa, principal rio da Inglaterra. No rio Ganges fiz também a minha profissão de fé como os hindus que banham em suas águas pelo menos uma vez no ano. Vou molhar os meus pés no rio das Velhas, o rio da minha infância sobre o qual meu pai se referia com respeito e admiração. Vou sentir a mesma emoção que senti ao imergir nas águas do velho São Francisco que nasce na outra vertente da Serra da Canastra.”

Lima Duarte em DesemboqueO retorno ao Desemboque para Lima Duarte teve o inigualável sabor de infância, de nostalgia. Raros momentos de sintonia com a solidão e o bucolismo da terra mineira. Palmilhar as agruras do cascalho, prelúdio e sonho dos garimpeiros e bandeirantes. Mirar o azul suave na verticalidade profunda do céu. Curtir as ondulações do horizonte na mais versátil das cores – o verde, prenúncio da vida. Abraçar crianças, jovens e gente arredia que saiu às portas e adentrou à igreja para ouvir a “ave Maria”de Gonoud na bela voz emocionada de Denizart.

A chuva morna deu boas vindas aos visitantes do Desemboque, passou pela vargem do Chico França, balançou a capoeira do cemitério dos negros e afastou para o sumidouro nas furnas do Caxambu.

Lima Duarte entrou na água turva do rio das velhas, maludo e profundo no verão e respirou o ar das quebradas da canastra. O que fazemos da vida sem o retorno às origens? Naquele momento o rio tornou-se o eldorado e despertou a mesma imagem da admiração paterna latente no seu coração.

“O rio da minha aldeia não faz pensar em nada.

Quem está ao pé dele está só ao pé dele”

De volta a Sacramento e depois à labuta do dia-a-dia dos estúdios para as telas do mundo. Lima Duarte esteve perto da fonte da juventude, bebeu da sua água e resgatou os sonhos da infância. Manancial de virtudes e fonte inesgotável de inspiração.

“Pelo Tejo vai-se para o Mundo

Para além do Tejo há a América

E a fortuna daqueles que a encontram

Ninguém nunca pensou no que há para além do rio da minha aldeia.

O rio da minha aldeia não faz pensar em nada.

Quem está ao pé dele está só ao pé dele”

Fernando Pessoa, Poemas de Alberto Caieiro

O ator Lima Duarte durante visita ao povoado de Desemboque

Artigo publicado na Revista Destaque In n. 67 Submitted by Jornalismo on 12 April, 2008 - 08:55

C.A. Cerchi e in Apologia Naturalista
Enviado por estreladamantiqueira em 17/02/2012
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