UM CAIPIRA PAGANDO MICO

Zé Zabé... Um caipira analfabeto e chucro, mal Educado por natureza, bisbilhoteiro pra caramba. Gostava de meter sua colher de pau em tudo que era assunto alheio como se soubesse alguma coisa. Nunca se calçou; nem alpercatas de couro cru o matuto usou, caminhava tranqüilamente sobre espinhos de juazeiro e benzinhos sem espetar os pés, tal era a espessura de sua planta. Com estes atributos atípicos, que identifica um caipira o homem era um leão no trabalho braçal.

Meio gago tinha um palavreado especifico que o identificava de longe a quem o ouvia. Numa ocasião lá pelo inicio dos anos sessenta cismou em se mudar para o sertão das gerais em busca da sorte, enfiando donde poderia desbravar mata virgem e plantar suas lavouras na tentativa de fazer seu pé de meia e melhorar sua vida.

Acolhido por um conterrâneo que havia adquirido uma fazenda no município de Unaí, ele foi tentar a sorte como meeiro naquele soturno sem eira nem beira. Sua pobre mulher comeu o pão que o diabo amassou. Com pouca saúde e meia dúzia de crianças pequenas quase uma escadinha no dizer popular, e uma saudade louca dos parentes que aqui ficaram a pobre mulher derramou rios de lágrimas. E o grosseiro do marido se limitava em lhe dizer: -ma-ma- pó-pó-pode bé-be-berrá Patrucina véia! Qui nois vai fica aqui memo muié!

À noite Zé acompanhado de dois filhos mais velhos, andava quase uma légua até uma fazenda vizinha pra ouvir no rádio as modas de violas caipiras dos três batutas do sertão, um programa que era patrocinado pela indústria de sabão minerva. A mulher ficava em casa chorando e lamentando a sorte com as crianças pequenas.

-Ma-ma- pó-pó ficá alegre P-pa- Patrucina na coiêta vô vendê mucado de mantimento e vô comprá um rádio pra mode nois iscutá os trêis batutas, mais os zôtus Caipira tudu danadebão; cê vaivê!

Enfim chegou o tão sonhado dia. Zé foi à cidade comprar o rádio. Levantou de madrugada e rasgou a pé. Atendido pelo vendedor foi logo dizendo:- - m-má ocê falô cumió o tar mó-mó motor radio-, ieu num ajéito muito quês negoço de motor não! - Não moço o senhor não entendeu motorrádio é a marca do rádio. Pode levar este despreocupado à marca é ótimo o senhor vai gostar!

Lá se foi o Zé com seu motor radio todo feliz. Chegou á casa já era noite. Ligou o Rádio justo na hora do Brasil, mudou de estação durante uma hora o mesmo programa. Terminada iniciou o projeto minerva que era apresentado também em rede nacional. O Zé mudava de emissora a nesma coisa. - Má-má qui-qui-qui diabo do inferno falei pu home quesse negoço de motor num presta ere me vendeu um radio cum defeito o trem tá falano uma coisa só-, vô guardá essa merda amanhã de madrugada vô intregá isso e pega meus cobre de vorta!

No dia seguinte qundo a loja abiu Zé foi o primeiro cliente a entar. --vim mó-mó movê cume qui nois fais o rádio cocê vendeu pra ieu, num presta não! Só fala negoço de guverno deputado às dispois o negoço di iscola projeto minerva, pudia inté falá no sabão minerva in pedaço, desqui fosse cus caipira, cevê cumé fica isso pranois nuncê priciso de brigá. Ieu num quero sabê coisa de guverno nem deputado essa cambada de robadô qui só vê os pobre quando pricisa de voto!

-- Que isso seu moço não precisa nada disso vamos testar o rádio. Ligando, o aparelho ele funcionou certo. —Má-ma lá incasa ele falava um treim só! Ieu vô levá dinovo mai ocê fica sabeno qui se num prestá trago de vorta, ieu num quero nem sabê! Cê tem-me passá de vorta meus cobre.

Chegando a casa em um horário diferente ao da voz do Brasil, deu tudo certo, mais tarde ele descobre que na hora do Brasil todas as rádios entravam em cadeia apresentando o mesmo programa.

Anos depois, Zé voltou de mudança as suas origens, estava um pouco mais instruído e sempre gaguejando e as gargalhadas, contava o mico que pagou no seu tempo de aventuras como caipira sertanejo.

Geraldinho do Engenho
Enviado por Geraldinho do Engenho em 06/02/2012
Reeditado em 28/08/2012
Código do texto: T3483521
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