As Fichas do Jogo

Já estava quase escurecendo, quando chegamos ao local onde seria o nosso acampamento por aquela noite. Fomos até a localidade chamada de Riacho de Santo Antônio, porque fomos informados que os “avoantes” e/ou “arribaçã” estavam dormindo por ali. Aproveitamos a claridade do dia para armarmos o nosso rancho. Tomamos um café reforçado e nos mandamos guiados por um morador da região até o local da 'DORMIDA". A macambira e o caruá tomavam conta da região, se não estivéssemos vestidos com calças de couro e calçados com pesadas botas, jamais havíamos chegado a “dormida” das arribaçãs. Ficamos escondidos por trás das moitas aguardando a chegada dos “avoantes”. Para nossa azar, as aves pareciam que haviam se hospedado em outro hotel, só algumas apareceram, mesmo assim as poucas que assentaram para dormir , foram abatidas a cacetadas. Se muito, todo o grupo abateu uma vinte aves, só dava mesmo para fazer um torrado que seria servido como “tira-gosto” com muita cachaça.

Retornamos ao acampamento, quando um dos membros do grupo chamado Geraldo teve uma idéia, reuniu o pessoal, e. .

- Olha pessoal, já que as arribaçãs nos passaram um “checho”, porque

não organizamos uma caçada de peba ?

- Boa idéia ! Gritou a maioria do grupo

Um dos caçadores vai até a casa de um conhecido que morava ali por perto, depois de meia hora retorna ao acampamento com o tal conhecido e mais três cachorros de peba

Depois de tudo pronto para a nova caçada, soltamos os cachorros e sentamos em torno de uma pequena fogueira assando umas espigas de milho, enquanto os cachorros 'acuavam" alguma caça..

Quinze minutos após os cachorros terem sidos soltos, passamos a escutar uns latidos distantes, vindos de uma grota de serra, apagamos a fogueira, pegamos as espingardas e corremos em direção aos latidos.

Correr numa noite escura num cariri cheio de macambira e caruá, é mesmo coisa pra malucos, “as folhas destas plantas tem espinhos em forma de unha de gato, um olhando para no outro, quando prende na roupa não larga, só sai rasgando; imaginem no couro da pessoa” com toda aquela dificuldade chegamos até o local onde os cachorros encurralaram a presa. Naquele escuro só se escutava a quebradeira do mato quando os cachorros corriam atrás do animal. Em dado momento a quebradeira de mato parou, agora os cães ladravam mais forte, sempre orientados pelos latidos, fomos nos aproximando do local. Agora a caça estava acuada, num “suvaco” formado por duas grandes pedras, com o auxilio de lanternas fomos nos aproximando, quando dirigi o foco de luz até o local onde os cachorros estavam, descobrimos surpresos que o animal perseguido era uma “tacacá”. Os cachorros formaram um circulo em torno do pequeno animal, e, quando o mais afoito dedes se preparava para agarrar-la pelo pescoço, a tacaca da as costas para o trio, levanta a ponta da cauda, apontando em direção aos focinhos dos cães, e. . .

- TUUMMMM. . .Aquele jato mal cheiroso acerta

diretamente os olhos da cachorrada.

Foi aquele “Deus nos acuda” a cachorrada gania, esperneava, latia esfregando os focinhos na terra, parecia até que alguém havia atirado acido nos olhos dos bichos. Voltamos rapidamente para o rancho para socorrer os animais. Fizemos o possível e até o impossível para aliviar a dor dos animais, lavamos com água e sabão, colocamos garapa de açúcar nos olhos dos bichos, e nada. Depois do ocorrido os cachorros pareciam que haviam entrado em greve, todos estavam “mufino” deitados pelos cantos, ninguém queria nada com nada. Mais vez nossa caçada transformou-se num verdadeiro desastre.

Como ainda era cedo da noite e o pessoal sem sono, resolvemos jogar um carteado para matar o tempo. Alguém retira do embornal o que um dia fora um baralho. As cartas talvez por excesso de uso, tinha o volume de três baralhos juntos, mesmo assim foi organizada uma mesa de sueca.

A luz que iluminava o acampamento era proveniente de uma lâmpada acionada à carbureto, muito em uso naquela época, mas, que emitia uma relativa luminosidade, em contra partida atraia tudo que era de mosquitos e besouros.

Tudo pronto para iniciar o jogo, só faltava agora as fichas, um dos caçadores levanta-se e vai até uma arvore ali perto, retornando em seguida com um monte de sementes pretas e redondas, que serviriam de fichas no jogo. As fichas (sementes) foram convertidas em dinheiro, e começa o jogo. Enquanto a turma jogava iam tomando suas lapadinhas de cana com arribaçã, servida pelo cozinheiro do rancho. Lá para as tantas da noite Geraldo, já havia ganho algumas rodadas no tal jogo de sueca, seu montinho de fichas já estava bem maior que dos demais jogadores.

Em dado momento Geraldo que era prezepeiro como os diabos, olha para o seu montinho de fichas , espantado grita para todos:

- OPA GENTE, ou eu estou bêbado demais, ou minhas fichas estão

fugindo ! ! !

Realmente Geraldo estava com razão, quando olhamos para o seu montinho de fichas (sementes) o mesmo estava reduzido a poucas unidades. A maioria das suas fichas caminhavam vagarosamente por sobre a mesa de jogo.

...o...

A lâmpada de carbureto atraíra para a mesa uns besourinhos no formato e cor das fichas utilizadas no jogo. Como os jogadores estavam já melados de tanto tomar cana com arribaçã, que não percebiam, e juntavam os besouros as fichas do jogo.