A ESCRITA SAI DA ALMA
A gente quando toma gosto pela escrita fica parecendo uma criança que quando ganha um presente sai para a rua para mostrar o bem adquirido. Pelo menos comigo foi assim. Em meus primeiros artigos no pequeno jornal de minha cidade saía para a rua todo entusiasmado perguntando a meus amigos se tinham gostado. Com raras exceções, todos me olhavam com aquele olhar comprido, talvez se perguntando onde iria parar minha loucura. Cheguei a publicar dois livros artesanalmente; coloquei-os debaixo do braço e fui à luta. Fiquei parecendo um chinês na Praça Sete, em BH, vendendo lotes na lua. De oferendas aos parentes e amigos mais próximos com dedicatória, a doação para a secretaria de educação de minha cidade e até colocá-los consignados em algum botequim, foi um verdadeiro fracasso de vendas. Dos amigos e parentes quase nenhum comentário, dos meninos da rede pública, alguns que me conheciam me perguntavam qual foi a cor de meu cachorro Peri. E só. E minhas filhas. A segunda, talvez com treze anos na época, sem tempo de ler meu livreto, com um livro do Paulo Coelho debaixo do braço dizendo: Quando ele escreveu esse livro estava na Índia pai! Ficava pê da vida como se fosse um tonto que depois de derrubar um copo, discutia com o garçom dizendo que não foi ele e sim sua mão.
Como toda mão que ordenha as pernas da professora, com o tempo aprende acariciar o rosto de sua filha; também na escrita temos nossos tempos de amadurecimento.
Minha filha do Paulo Coelho, hoje com vinte, fez um pequeno estágio na Argentina e me disse que lá em todo quarteirão tem uma biblioteca. No Brasil, em todo quarteirão tem um boteco e se procurar bastante vai achar uma banca de revista vendendo revista de mulheres peladas ou jornais falando de futebol ou crimes hediondos. Assim é nossa fadada cultura.
De antes um revoltado, me sinto o maior privilegiado em gostar de escrever. Como disse um colega de infância que talvez não tenha tido paciência de ler um pedaço do livro que lhe dei: Escrever é seu robe, não é Zé?
Com certeza. Quando não estou escrevendo algum livro, quando estou trabalhando no meio de meus cafezais me sinto sem assunto. Como se estivesse numa mesa junto de meus antigos colegas de escola e acabasse a última repetitiva lembrança: “Cê lembra Zé?”
Sou daqueles que não gosta de achar graça sobre o mesmo assunto mais de uma vez. É revoltante. Nunca me daria um ator.
Mas veio a internet. Num dia desses que estava sem assunto e cansado de jogar damas cliquei em contos e apareceu o Recanto das Letras. Foi como se na minha vida tivesse aparecido uma biblioteca virtual. E é aqui que nos finais de semana, leio e conto meus causos ou até alguma revolta que a rede televisiva joga, durante a semana, nos puros ares de minha roça.
Como hoje escrevo meu centésimo artigo no Recanto, não poderia deixar de agradecer ao site e a todos que comungam nossos causos.
Para não passar sem um causo...
Um casal de mineiros, “dos antigo”, recebeu o pretendente a genro com um quilo de doce de goiaba. Quando o infeliz falou que não gostava de doce foi rejeitado pela futura sogra. Já na cama, escutando os soluços da filha o coronel perguntou:
- Por que você não gostou do moço muié?
- Esse home num presta pra nossa fia.
- Caos de quê?
- Quem num gosta de doce é cachaceiro...
- ...
JOSÉ EDUARDO ANTUNES