Comprando Mel
Final dos anos de 1990, Gumercindo e Gertrudes moravam no 11º andar num prédio, bem no centro de uma capital, e tinham somente uma filha, MariJane, com 10 anos de idade. MariJane era uma menina esperta, ia muito bem nas aulas do colégio, cursava inglês, jogava xadrez como gente grande, ela se achava e sempre tinha resposta para tudo, era uma sabe tudo da vida da cidade, mas raramente ia para o campo.
Gumercindo e Gertrudes iriam viajar para um velório de um parente distante, precisavam deixar sua filha MariJane com alguém, resolveram deixar com Tia jurema, irmã de Gertrudes, ela era viúva e morava num bairro próximo ao centro duma cidadezinha do interior, que era caminho e próximo da capital.
MariJane ficou com sua tia Jurema.
MariJane tinha visto poucas vezes a tia Jurema, e não lembrava de ter ido visita-la alguma vez. A casa era de madeira, bem simples mas bem cuidada e tudo em seu lugar, tia Jurema era bem simpática morava sozinha e não tivera filhos.
Diferente do apartamento em que morava, tia Jurema tinha um quintal enorme com frutas e legumes plantados e um galinheiro com algumas galinhas caipiras.
MariJane ficara espantada em saber como as coisas na cidade do interior eram diferente da cidade grande.
Tia Jurema iria fazer bolacha de mel, e MariJane queria ajudar, pois sua mãe raramente fazia alguma comida em casa, que não fosse enlatados, congelados ou a famosa pizza margherita por telefone. Após conferir os ingredientes tia Jurema percebeu que estava faltando o ingrediente principal, o mel. Tia Jurema pediu para sua sobrinha Marijane:
- MariJane vai até a “bodega” e compre um kilo de mel!
Marijane não entendeu:
- “bodega”?
Tia Jurema falou:
- há “bodega” é o mercadinho ali da esquina.
MariJane disse:
- há ... eu vou no “Small”, ele é um mercadão bem grande lá perto de casa, o pai vai de carro e deixa ele no estacionamento que fica no embaixo do mercado, e a gente sobe pela escada rolante, eu gosto de ficar subindo e descendo, a tia já andou de escada rolante?
Não deu tempo de a tia Jurema responder, Marijane continuou a falar:
- tem uma loja só de revista, bastante revista de novela, e do lado tem uma farmácia, minha mãe de vez em quando vai na farmácia compra remédio quando eu fico doente, sabe tia esses dias eu fiquei doente e fiquei com umas bolinhas em todo meu corpo, daí minha mãe comprou remédio lá na farmácia no mercado, mas agora eu já melhorei, eu fiquei alguns dias sem ir para a aula, eu fiquei com saudades de falar com minhas amigas do colégio. Sabia que lá tem uma lavanderia onde o pai manda lavar os ternos dele, tem locadora, onde eu escolho alguns desenhos que eu quero assistir, a tia gosta do desenho do “Máskara”, ele tem uma mascara que quando ele coloca ele fica com o rosto verde e se transforma no que ele quiser, a tia já viu?
Tia Jurema, só balançou a cabeça negativamente, MariJane continuou:
- ele é bem engraçado. Lá no “Small”, daí tem um montão de coisa, tem umas televisão bem grande de pendurar na parede, meu pai disse que vai comprar uma dessas para colocar no meu quarto, quando ele tiver dinheiro, a tia gosta de ver televisão?
Tia Jurema vendo que a sobrinha não parava de falar, disse:
- tá bom, depois você me conta o resto... mas vá logo se não estas bolachas não vão sair antes da janta!
O mercadinho ficava uns 50 metros da casa da tia Jurema, o bairro era tranquilo, bem sossegado, as crianças ainda brincavam na rua, não tinha problema em ir sozinha.
Chegando na “bodega”, aquela confusão e profusão de materiais pendurados, empilhados e amontoados atrás do balcão (pinicos, baldes, panelas, vassouras, linguiça, salame, carne, frutas, na verdade tinha de tudo um pouco), e encostado no balcão, o balconista: um senhor com cabelo “esgarciado”, barba por fazer, camisa surrada, a barriga queria saltar para fora da calça e forçava os botões da camisa, palito no canto da boca.
MariJane chegou alegre e falou bem confiante sabedora do que queria:
- boa tarde, quero um kilo de mel!
O balconista falou:
- sim mocinha, temos mel... temos esse mel de bracatinga, esse é mel de laranjeira, mel silvestre e mel de jataí, qual você quer?
MariJane, indagou cheia de si e indignada, como se o balconista não tivesse entendido o que ela queria:
- não... o senhor não entendeu... eu quero mel de abelha!!
O balconista disse com um sorriso largo no rosto redondo, vendo que mocinha não conhecia nada sobre o assunto:
- menina! Todo isso é mel de abelha!
Ela arregalou os olhos, MariJane enrubesceu, seu rosto corou, ficou vermelho... ela travou, engoliu em seco, abaixou a cabeça, não esperava esta resposta, ela estava sem argumentos, ela não sabia o que fazer, e muito menos qual mel levar.
O balconista continuou:
- o que diferencia todo esse mel é o tipo da flor e da época da colheita de cada um...mas todos eles são feitos por abelhas.
MariJane disse quase sussurrando:
- me dá um que dê para fazer bolacha de mel!