O Casal de Trinca-Ferro e o Saci-Perê
“... o homem erra, Deus perdoa e a Natureza se vinga...”
Em 2002, num encontro de educadores em Ilha Solteira, estavam presente vários escritores, entre eles Rose Marie Muraro (feminista) e Marina Colasanti. Fui convidado para ser o mediador. Na abertura as professoras das Emeis, apresentaram uma dramatização, na qual o poder Sagrado da Liberdade era reverenciado. Várias dessas meninas tinham sido minhas alunas no curso do Magistério do antigo CIU (Colégio Integrado de Urubupungá). Trabalho fantástico no aspecto técnico, mas a narrativa, ao que tudo indicava, caminharia para um final catastrófico. Assisti e por isso não gostei. Tragédia não é minha praia. Tem tudo pra ser chantagem emocional. Há pouco tempo atrás rememorando nostalgicamente, fui lembrado pelo meu Anjo da Guarda que estava de plantão, que surgia uma oportunidade de dar um final naquela história de forma feliz e ecologicamente correto, como eu gosto e tenho como companhia todas as Crianças do Mundo. Então ai está: Um casal de Trinca Ferro (ave da fauna brasileira) estava na tarefa de construção de seu ninho com a finalidade de participar da perpetuação de sua espécie. Posso dizer que seu canto é muito bonito. Mas todos os cantos são bonitos!!! Acontece que, entre os Reis da Criação (num sei quem inventou essa asneira) há os que aprisionam os pássaros só pra ter a exclusividade de seu canto. Terminado a obra que resultou num seguro ninho, vieram os ovos. E consequentemente os três filhotes. O malfeitor estava à espreita. Tão logo apareceram as primeiras penas, transferiu o ninho para dentro de uma grande gaiola. Sabia que a Natureza é perfeita e que o casal os alimentaria independente das grades que os separavam. O momento do desfrute da Liberdade estava cada vez mais próximo, mas a realidade se mostrava implacável. Sua prática seria impossível. O casal saiu para a floresta com objetivo de encontrar uma planta ou um pequeno inseto que trouxesse a morte na sua essência. Seria melhor vê-los mortos a serem privados da maior dádiva da Natureza: A LIBERDADE. Mas o Guardião das coisas naturais só liberava plantas e insetos para a cura, e para a morte, nunca. De Guardião mesmo, ele só tinha o espírito. Era um negrinho, pequeno, vestia apenas uma tanga e na cabeça um barrete, ambos na cor vermelha. E pra completar tinha uma perna só. Fazendo seu papel interferiu. Depois de muita argumentação por parte dos Pais, ele cedeu, mas impôs uma condição: A refeição fatal só seria liberada no dia em que os rebentos estivessem em condições plenas de voar. E o malfeitor não podia estar presente. Eis que chega a esperada data. Quando casal pousa na base da janela, a imagem que se descortina dentro da sala e outros cômodos era de absoluta destruição. A coleção de livros raros da fauna ardia por completo na lareira. A coleção de louças de origem oriental, aos cacos. Espingardas aos pedaços. Gaiolas e alçapões vazios, esmagados. Cadeiras, mesas e demais móveis, todos fora da mínima possibilidade de uso. Só a gaiola com os três pequenos estava intacta. Então aquela minúscula figura da floresta apanhou o objeto, colocou-o embaixo do braço e com o auxílio do outro, vazou pela janela e sumiu mata adentro. O casal perplexo deixou cair as migalhas fatídicas e foi chorar como despedida no alto de uma Caneleira. Repentinamente, começam ouvir um assovio forte, fino e estridente, como se fosse um chamado. Atenderam. E o Guardião, com pito no canto da boca sorria. A portinhola foi aberta e as pequenas aves voaram em direção a copa florida de um Ipê-Amarelo. Os Pais foram ter com Eles. Juntos ouviram o ruído das abelhas acompanhadas pelo cantar dos outros pássaros e fazendo fundo, o rumor da grande cachoeira, completava o som da grande orquestra. Sem ser vista, mas estando em todo lugar ao mesmo tempo, a Maestrina-Natureza regia o grande concerto. (oldack/14/09/011). Tel. 018 3362 1477.X