PREMONIÇÃO DE UMA CIGANA
Pedro era filho de fazendeiro e colega de Onofre, filho de metalúrgico, ambos com a mesma idade. Morava na mesma rua de uma pequena cidade.
Localizada em uma região fértil, seus recursos econômicos dividiam entre a única metalúrgica existente e o setor rural. Sua gente ordeira e trabalhadora migrava durante o dia para a área rural do município que absorvia grande parte da mão obra produzindo os gêneros de primeira necessidade, indispensáveis à subsistência humana.
Os dois garotos eram como carne e unha, iseparaveis. Estavam sempre juntos. Em fins de semana após a aula iam para a fazenda onde o pai de Pedro os aguardava. Correndo pelos campos como dois vitelos em plena puberdade,cavalgando, e nadando nas águas puras do rio que rolavam cristalinas numa ânsia de mar, aonde os cardumes de peixes coloridos enchiam os olhos com seu malabarismo encantador sob a luz do sol. Na cidade, após a aula estavam sempre juntos jogando peladas com bola de meia em campos de terra batida. Construíram uma solida amizade.
Ambas as famílias sonhavam uma carreira brilhante para os filhos. Onofre por ser filho de metalúrgico teria que cursar engenharia enquanto Pedro filho de fazendeiro teria que estudar biogenética animal. Sonho dos pais contrários a vocação dos filhos.
Pedro acabou por fazer um curso técnico e apadrinhado pelo pai de Onofre conseguiu emprego na metalúrgica como escriturário. Onofre foi mais além cursando direito na capital com bolsa de estudo mantida pela empresa fazendo jus ao pai premiado pelos bons serviços, a ela prestados.
O tempo corria e a amizade entre ambos solidificando cada vez mais. Embora distantes tendo apenas as férias para se divertirem, mais e mais se apegavam como se fossem irmãos. Certo dia juntos em um feriado prolongado Pedro se encantou com a beleza de uma jovem cigana, lendo sorte, na praça principal da cidade. Mais com intenção em paquerá-la do que interessado na vidência resolveu jogar seu charme assediando a jovem. Onofre não concordou com idéia, mas ele insistiu.
– Hein coisinha linda veja lá se tenho a sorte de viajar com uma linda cigana pelo mundo afora, leia minha mão! –Vamos a minha barraca faço primeiro você depois seu amigo! – De minha parte eu agradeço não acredito nisso! Afirmou Onofre! Enfeitiçado por seus encantos, Pedro a acompanhou adentrando a barraca. Segurando sua mão esquerda espalmada a jovem cigana lhe disse: - Teu amigo não crê em vidência, no entanto o maior romance de tua vida só virá até você, através dele. Terás que ter muita cautela, mesmo não querendo vai decepcioná-lo amargamente.
–Olha você é linda, mas, nada sabe, jamais irei decepcionar meu amigo-, de qualquer forma só estar contigo estes momentos encheu-me de felicidade e com prazer lhe gratifico em dobro.
Após o feriado seguindo a rotina normal, Onofre retornou aos estudos Pedro ao trabalho. Anos mais tarde Onofre concluiu seu curso aperfeiçoou no estudo e chegou a magistrado. Venceu um concurso público e foi designado para atuar numa grande metrópole. Conheceu Selma com quem se casou. Sua amizade com o Pedro era tamanha que chegava a causar ciúmes na esposa.
Vivia se lamentando não ter o amigo comparecido no dia de seu casamento, uma vez que substituiu seu pai na metalúrgica, para que o mesmo comparecesse ao matrimonio do filho.
A metalúrgica ia muito bem, e cresceu significativamente, influenciado pelo prestigio de Onofre, abriu uma filial na grande metrópole onde ele atuava como magistrado. Para sua felicidade seu amigo, agora um homem experiente de grande conhecimento no ramo metalurgico foi escolhido para dirigir a nova indústria. Ficaram ambos felicíssimos. Ao chegar à cidade para se instalar Pedro foi recebido pelo amigo e esposa que fizeram questão em hospedá-lo em sua residência. Onofre sentiu-se realizado tendo o amigo por perto.
Mas, Pedro não se sentia muito à vontade ao notar que Selma estava se excedendo tanto nos olhares como nas gentilezas. Longe do marido ela o fulminava com seus olhares e gestos provocantes. Procurou apressar o alojamento na empresa que dirigia, e se mudou, evitando assim maiores contatos com o casal de amigos. Onofre reclamava sempre do amigo dizendo que sua amizade estava se desgastando. Pedro atribuía o fato à falta de tempo.
Selma não lhe dava trégua e vez por outra o requisitava através do marido para sanar pequenos reparos em sua residência. Como ele não sabia dizer não ao amigão acabava o atendendo, embora constrangido com as insinuações de sua mulher. A incômoda situação estava se tornando insustentável e as palavras da cigana martelando sua mente, um verdadeiro martírio. Trair seu amigo jamais! De um lado aquela amizade sólida, do outro a tentação da bela criatura. Chegou a cogitar desistir do emprego, e voltar à terra natal, mas, Onofre quando soube interveio lhe assegurando que jamais permitiria seu afastamento.
Pedro imaginava mil coisas que pudesse solucionar aquela situação. Até que não resistindo acabou por ceder ao assédio. Por algum tempo manteve o romance embora de consciência pesada. Fugia o máximo que podia, e ela sempre reclamando e procurando oportunidade para estar com ele. Extremamente aborrecido com a situação ele resolveu cortar definitivamente aqueles encontros.
Surgiu um problema com o ar condicionado em sua residência e a pedido da esposa Onofre ligou para o amigo, que por precaução já não atendia mais os pedidos de Selma. Embora lhe cortasse o coração, ele recusou atendê-lo de forma um tanto grosseiro afirmando ter problemas suficientes na empresa. Onofre estranhou a atitude do amigo, mas, julgou ser seu nervosismo, excesso de trabalho e não levou em conta.
Pedro conseguiu por um paradeiro naquela situação, mas, doía muito à falta do amigo. Onofre que sempre foi compreensivo com a esposa tornou-se intolerante, sempre lhe cobrando o que fizera com seu amigo, que o levou a afastar daquela forma.
Atarefado com a direção da empresa Pedro dava seu caso por encerrado. Até ao dia que recebeu um telefonema do amigo exigindo sua presença em sua casa às dezessete horas daquele dia e dizendo ser um caso de vida ou morte. Pelo tom melancólico da voz do amigo, logo imaginou se tratar de um fato gravíssimo. Passou o dia encabulado imaginando como encará-lo, tudo indicava que havia descoberto sua traição. Tentava evitar o confronto pensou em fugir e não mais voltar, mas, e se ele estivesse querendo tratar outro assunto completamente diferente de seu grande dilema. Ao encerrar seu expediente no trabalho, decidiu seja qual fora o assunto vou em frente afinal somos amigos. Entrou no carro e tomou a direção de sua residência. Pela metade do caminho uma batida envolvendo vários veículos causou um congestionamento gigantesco. Sem alternativa para seguir, decidiu estacionar seu carro e caminhou rua afora meio sem rumo tentando colocar em ordem seu equilibro mental. Parou defronte um lote vago onde uma barraca de ciganos estava instalada. Logo uma cigana o abordou oferecendo ler sua mão, por incrível que pareça ele a reconheceu como sendo mesma de muitos anos atrás apenas mais envelhecida. Nem soube por que, mas, estendeu a mão e lhe disse: - Vamos lá veja o que me aguarda. Ela o tranqüilizou dizendo: - uma grande duvida o atormenta é seu destino não há como fugir, acalme seu coração, vai dar tudo certo. Você tentou, mas, a força do amor foi maior e agora esta na reta final, a mais de dez anos eu o avisei que tomasse cautela que iria decepcionar seu melhor amigo, você zombou de mim veja como são as coisas tantos anos se passaram e nos encontramos novamente. É chegado o momento que será colocado um ponto final. Não vai te acontecer nada esta tudo na mais perfeita ordem aquiete seu coração seu amigo o chamou para que façam as pazes ele quer apenas brindar sua amizade.
Pedro que passou o dia no maior sufoca, se acalmou com os conselhos da cigana. A rua foi desobstruída ele seguiu viagem. Chegando à casa do amigo notou uma grande calmaria, o casal o aguardava na sala de visita. – Puxa vida você me deixou preocupado o dia inteiro, do que se trata amigo? –Nada demais que possa haver preocupação, você é a única pessoa nesta metrópole em quem eu posso confiar e será sempre meu melhor amigo, no entanto se afastou de mim sem nenhuma explicção. Eu o chamei por que preciso de sua amizade e quero que façamos um brinde a este recomeço. Só isso e nada mais. Dirigiram-se ao refeitório, Pedro, Onofre e Selma; sobre uma mesa uma garrafa de champanhe e três taças os aguardavam. Onofre estourou a tampa serviu as taças e exclamou: – agora brindemos nossa bela amizade. Selma tirou da bolsa uma caixinha contendo uma pequena cápsula e colocou na sua taça afirmando ter se esquecido do medicamento recomendado pelo Médico.
Os três brindaram. Ela sentiu uma vertigem, Onofre a amparou conduzindo-a até o sofá da sala. Voltou ao refeitório e analisou a embalagem do medicamento ingerido por ela. Pedro quis chamar um medico, ele afirmou ser desnecessário, e apontando para a embalagem sobre a mesa disse: - veja amigo o veneno colocado por ela própria em sua taça! É letal e irreversível-, aí está à embalagem. Estou confuso com sua atitude. Ela mesma me convenceu a convidá-lo afirmando ter algo muito importante a me revelar e fazia questão da tua presença como testemunha por ser melhor meu amigo. Cheguei a imaginar que estaria grávida e queria me fazer uma surpresa, jamais eu imaginei perdê-la, e de forma tão trágica. Agora sua revelação se tornou um segredo que irá com ela para o tumulo e só Deus saberá do que se trata.