O BARCO DOURO PARTEIRO

Autor: José Gomes Paes

08/08/2011

Ele chamava-se Douro. Um barco feito de Itaúba madeira de lei, de uns 13 metros de comprimento, motor Seffre de procedência alemã, de 15 cavalos. O motor para funcionar esquentava-se o cabeçote com maçarico, até ficar bem vermelhinho e girava a alavanca, soltando no ponto para que pudesse funcionar.

Não era qualquer um que o fazia funcionar, o Douro, tinha o seu motorista, quando não era o Eduardo, era o Zé Antonio que conhecia bem o processo para fazê-lo virar. Quando virava era uma tremedeira danada.

Na cidade, o Douro era um dos barcos mais velozes na época e um dos mais fretados, principalmente em caso de urgência.

Não havia na cidade hospital, nem tão pouco médico, havia uma ou duas pessoas que se passavam como tal, orientavam e receitavam algum remédio que o comércio vendia, como por exemplo: benzetacil, antitetânica, tetraciclina, era tudo na base da injeção e além do mais era muito escasso. Usava-se muito o remédio caseiro, por exemplo, para dor de dente, eu e meus irmãos fomos curados pela mamãe com resina de cuia; para a inflamação, crajiru, assim como óleo de copaíba e andiroba, coisa que nunca esqueço.

No caso das gestantes, eram as santas parteiras que cuidavam da mulher, desde a gestação até o parto. A minha mãe teve 11 filhos com as santas parteiras e todos estão em perfeitas condições de saúde, graças as santas parteiras e ao nosso bom Deus.

Entretanto havia situações que as santas parteiras não conseguiam resolver, nestes casos havia a necessidade de se fretar um barco, para levar a gestante ou doente à cidade mais próxima, como Itacoatiara ou Parintins, cidades estas com mais recursos para o devido tratamento, distante de 10 a 12 horas da cidade. O barco mais procurado para essa missão era o Douro, pela sua velocidade.

E assim o Douro fazia o seu papel.

Certa vez, o Douro fora fretado para levar uma gestante a Itacoatiara, já que a criança se encontrava de atravessado na barriga da mãe e a parteira já havia esgotado todos os meios e conhecimentos para fazê-la nascer. Durante a viagem, a parteira que acompanhava a gestante, orientava-a para que ficasse em posição que ajudasse a criança voltar ao normal para nascer. E assim, com a trepidação do Barco a criança foi se acomodando, ficando em posição de parto, e nasceu.

O Douro retornou do meio da viagem, pois não havia necessidade de continuar, a mãe e a criança estavam bem. A parteira atribuiu o sucesso à colaboração do Douro com a trepidação que desenvolvia quando estava funcionando.

A mãe agradeceu muito a Deus e a Nossa Senhora de Santana pelo nascimento de seu filho, a santa parteira que a acompanhou e ao Douro Parteiro, como passou a ser conhecido, pela sua colaboração.

O barco Douro Parteiro, continuou fazendo suas proezas no seu trabalho de salvar vidas, quando era fretado e passou a ser conhecido em toda a redondeza.

Um dia, um milagre aconteceu. Uma mulher gestante e o nenê que ela esperava, encontrava-se em perigo de morte, pois não havia tempo de chegar a Parintins ou Itacoatiara. Foi aí que surgiu a idéia. Emprestaram o Douro, colocaram a gestante dentro, acompanhada da santa parteira e começaram a dar voltas no rio em frente à cidade, na terceira volta à criança nasceu.

A mãe aliviada e feliz agradeceu a Deus, a santa parteira e ao Douro Parteiro, que mais uma vez salvaram uma vida.

As parteiras eram e são pessoas santas, que se dispunha a ajudar como se fossem anjos enviados por Deus, elas estavam sempre prontas a colaborar e ajudavam a salvar muitas vidas, por isso eu as denominei de: “Santas Parteiras”. Ocorre que muitas das vezes, as possibilidades fugiam de sua sabedoria e muitas crianças morriam ou mãe e filho morriam juntas, sem o direito de poder nascer.

Por necessidade de seu dono, O barco Douro Parteiro foi vendido ao estado do Pará, talvez continue a fazer seus milagres por lá. Isso só Deus sabe.

FIM

José Gomes Paes
Enviado por José Gomes Paes em 08/08/2011
Reeditado em 23/08/2011
Código do texto: T3147918