A MALHAÇÃO DO JUDAS

Como em todo Sábado de Aleluia, a garotada se reunia. A primeira tarefa era a eleição de quem seria “homenageado”, quem mais de chato se representaria diante daqueles reunidos.

O voto já era certo, Seu Benedito, um velho mais que avarento, furava as bolas que em seu quintal caíam, não dava aos moleques as frutas maduras das árvores frondosas, deixando-as apodrecer lá mesmo.

Tamanha figura asquerosa não escapava da malhação (ou queima), os garotos preparavam um boneco caprichado para aquele velho. Enfeitavam o boneco com cabelos brancos, óculos e tudo que podiam desde que ficasse a cara do Benedito.

Em determinado ano, um dos garotos resolveu inovar. Falou entre os amigos “pra ele não acabar a brincadeira cedo, vamos pendurar o boneco no lugar mais alto que der”. Os outros não tiveram dúvida, aceitaram a proposta e, de quebra, ainda elegeram o responsável pela ideia para ele mesmo pendurar o boneco.

O inventor de tal futuro feito, na hora, aceitou e prometeu não amarelar. Lá se foram os meninos, correndo em animação que não tinha quem segurasse. Aguardaram que o velho Benedito fosse dormir, para o garoto mais travesso subisse no muro, depois saltar num coqueiro, subir por ele até perto da copa, para ali amarrar o danado do boneco, para depois esperar a malhação, cedinho, já que o velho tinha a mania de acordar entre cinco e seis horas da manhã.

Quando o disposto garoto já estava subindo no coqueiro, sem que por qualquer atropelo esperasse. Eis que seu Benedito sai da casa para o quintal, para guardar um saco de lixo no canto do muro. A garotada que ficou no lado de fora assobiava, acenava, gesticulava de todo jeito, quase chamando a atenção do velho e não do menino. Já o garoto do coqueiro só percebeu a presença de seu Benedito quando este já estava embaixo dele. Segurou a respiração, quando sentiu que ele iria olhar para cima, não teve dúvida, se fez de boneco de Judas. Trincou as pernas no coqueiro, vestiu o paletó velho que serviria para o dito enfeite, o chapéu colocou todo troncho, pois não era do seu tamanho, e abriu os braços.

Seu Benedito, que não era lá bom das vistas, olhou, balançou a cabeça em negativa dizendo “garotos de uma figa” (....) entre outros adjetivos. E voltou a adentrar em sua casa. O moleque logo pensou “escapei por pouco”. E bote pouco, pois sai de lá o velho com uma vara de bambu nas mãos em direção ao coqueiro.

Quando o velho se preparava para desferir uma pontada por baixo, do que pensava ser o boneco, o garoto, em pânico, segurou a ponta da vara na rapidez que a idade lhe permitiu. O velho Benedito quando observou o movimento do “boneco”, saltou para trás, deu uma carreira e gritou a todo pulmão e garganta “NÃO SABIA QUE EU ERA TÃO RUIM. MEU DEUS! MANDARAM O PRÓPRIO ANTICRISTO!!!!!!!!!!”.

Inaldo Santos
Enviado por Inaldo Santos em 07/08/2011
Reeditado em 07/08/2011
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