MEG, A CAÇADORA

“Nunca se mentiu tanto quanto antes de uma eleição; depois de uma caçada e durante uma guerra”.

(Bismark)

“Meu Cantinho” era um boteco, que tinha como proprietário o saudoso Miguelito, figura extremamente querida na cidade de Boa Vista e já conhecido de outros “causos”. Seu boteco estava sempre cheio, justificado pela limpeza do ambiente, tratamento lhano dispensado aos fregueses, mercadorias (destaque para a cachaça) de boa qualidade e a oportunidade de bons papos.

Naquele sábado a casa estava cheia. Numa das mesas, Orozimbo, o grande caçador, acompanhado de mais seis amigos: Tilinho – o Mineiro; Wantuil – o Blusão; Gentil – o Fio Elétrico; Luna – o Deixa Comigo; Ary – o Guimba de Charuto, e Peixoto – o Mistura.

A conversa, naquele momento, girava em torno de caçada, assunto que a todos agradava, já que se consideravam bons caçadores, inclusive de mulheres. Luna ou Deixa Comigo, quando lá cheguei, contava uma historinha, já bastante envelhecida pelo tempo, mas que, contada por ele, causava risos.

-- Pois é. Como eu dizia, no quintal da casa do meu avô tinha um pé de laranja, que estava sempre cheio de periquitos. Naquele dia meu avô, na ânsia de fazer uma exibição de sua pontaria, mandou que eu contasse os periquitos. 30 – disse-lhe eu. O velho pegou a espingarda e preparou-a com 30 caroços de chumbo. Apontou, atirou, encostou a espingarda no pé de laranjeira, virou-se e entrou na cozinha de sua casa, ordenando-me que apanhasse os periquitos. Eu os apanhei. Eram 29. Meu avô não se conformou. Eu nunca erro – disse ele. Então fomos ao terreiro e realmente não tinha outro periquito caído, mas olhamos para cima e vimos um periquito voando em zig-zag, desesperadamente, e um chumbinho atrás dele buscando atingi-lo.

Ary – o Guimba de Charuto para os íntimos, tomou a palavra, salientando que gostava muito de caçada, mas não de pássaros. Gostava de caçar paca, cutia, capivara, etc., ressaltando que aprendeu a arte com o seu avô que, no seu modesto modo de entender, era melhor que o avô do Luna.

-- Eu era bem jovem, sete anos, se muito – dizia Guimba de Charuto – quando meu avô me contou que, certa vez, foi caçar sozinho. Lá pelas tantas, já cansado, resolveu fumar um cigarrinho. Repentinamente ouviu um barulho constante. Era um bando de quatis, que descia a trilha na mata com incrível velocidade . Meu avô pegou a espingarda, encostou-se a uma árvore, e, à medida que os quatis passavam, ou melhor, tentavam passar, os tiros iam saindo. Pou...pou...pou...resultado: 10 tiros, 10 quatis mortos. Perguntei, então, ao meu avô: - o senhor não carregava a espingarda, que era de dois canos ? – Cadê tempo, meu filho – disse-me ele..

Já ia me esquecendo do Blusão, grande caçador, mas de mulheres. Arranjou, certa noite, uma quenga. Deixou-a dentro da kombe e entrou às pressas na farmácia do compadre para comprar uma camisinha. Mas deu de cara com a comadre. Chiiiiiiiii, pensou ele, to lascado, mas raciocinou rápido: - comadre, boa noite. Um pente e um sabonete, por favor. A comadre entregou-lhe o pedido e recebeu uma nota de Cr$5,00. Foi ao caixa e voltou, dizendo: compadre, estou sem moeda de troco, leve, então, uma camisinha..

Peixoto – o Mistura – no passado era Limonada. Mudou porque, certa vez, sabedores de que ele não gostava de ser chamado de Limonada, três amigos resolveram fazer uma brincadeira com ele. Ficaram ao longo de uma calçada, cada um a dois metros do outro. À medida que Limonada ia passando, um dizia: limão; o outro, água; o terceiro, açúcar. Limonada virou-se, de inopino, já com uma arma de fogo em punho, apontada para os três, e sentenciou: - mistura, seus f.d.p.

Hoje os três rapazes, que são amigos do Mistura, brincam com ele dizendo que misturar faz mal à saúde.

Mas, Peixoto, Mistura ou Limonada, fechou um olho mais do que o outro, característica de quem quer passar a idéia de que está falando a verdade, mas a sua verdade é a dos vendedores de carros usados. Começou a sua história. Só que o personagem era ele mesmo e não o seu avô.

-- Todos vocês sabem – começou o Mistura – que eu sempre tive bons cachorros de caça. Nem podia ser diferente, pois sou caçador inveterado. Aqui mesmo neste boteco, eu estava a comentar, no mês passado, com amigos sobre uma das minhas cachorras, a Meg, a maior levantadora de pacas que eu já vi, quando um cidadão, desconhecido, disse que ninguém nesse Brasil tinha cachorros, principalmente levantadores de pacas, melhores do que os dele. Conversa vai, conversa .vem; discute daqui, discute dali, resolvemos fazer uma aposta, uma aposta alta. Faríamos duas caçadas: uma, lá no sul do estado, onde ele mora; outra, aqui no norte. Eu iria lá primeiro, pois disputamos na porrinha e eu perdi.

-- Os trinta dias que tive de esperar – continuou Mistura – foram dolorosos, pois a ânsia de pegar o dinheiro do “mala” era grande. Arrumei a caminhonete, convidei dois amigos,e, na véspera da caçada, pé-na-tábua. No Frechiani resolvemos tomar um café. Deixamos a caminhonete na porta do bar, com a Meg na carroceria. Quando voltamos, cadê a Meg, desapareceu. Um rapaz que estava sentado na calçada, percebendo meu desespero, disse-me que a cachorra saiu correndo atrás de um caminhão. Rapidamente entrei na caminhonete e tome aceleração. Já estava escurecendo e eu corria tanto que quase passei à frente dos faróis. Depois de andar uns dez quilômetros, visualizei o caminhão. Ao ultrapassá-lo percebi que a Meg estava pendurada na placa do caminhão. Que estranho! Fiz sinal, o motorista parou. Saltamos os três da caminhonete e corremos para a traseira do caminhão e lá estava a Meg. Mordeu na placa e ali permanecia, pendurada. O que era estranho a princípio, ficou logo esclarecido. Como a Meg era uma caçadora de Pacas, ela “leu” mal a placa do caminhão, que era de PANCAS, uma cidade do Espírito Santo.

levy pereira de menezes
Enviado por levy pereira de menezes em 08/12/2006
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