UM BICHO DO MATO NA ESCOLA
Com o pensamento preso às maravilhas daquele paraíso encantado aonde eu nasci, sem a minina idéia do que era a escola, cheguei como um bichinho do mato à sala de aula pela primeira vez. Encontrei um anjo de voz mansa igual ao que imaginava ter em minha guarda, descrito pelos ensinamentos de minha querida mãe. Mas este era real e se chamava Maria Guerra. Já prestes a se aposentar após sua longa jornada, sem jamais esmorecer, mantinha a disposição e o mesmo entusiasmo como uma recém formada. Enfrentava todas as dificuldades que a carência da época oforecia. Muitas vezes usando o dedo envolto por um pano molhado substituindo a falta do giz, em um quadro que já não era mais negro devido aos anos de uso. D. Maria com seu esforço ilimitado, ensinando a todos com o mesmo amor e dedicação, colocando sua missão acima de sua própria condição humana, às vezes adoentada, com os vencimentos atrasados até por um semestre sem se quer manifestar insatisfação na sala de aula. Jamais levou qualquer problema pessoal para descarregar em seus alunos.
Por mais que me esforce sou incapaz de descrevê-la em sua grandeza e na dimensão de amor a sua profissão, tamanha foi sua capacidade de superação. Foi ela a grande responsável pela harmonia que perdura em nossa comunidade ao transmitir seu calor humano na formação da personalidade dos habitantes que até a minha geração fomos todos seus alunos. Foi espelhada na magia de seu exemplo que nossas famílias foram constituídas formando esta invejável sociedade a qual orgulhamo-nos de pertencer. Permita-nos Deus, que os órgãos governamentais deste imenso Brasil sejam dirigidos por elementos formados por mestras como nossa saudosa Maria Guerra. Orgulho-me por ter meus ensinamentos primários ministrados por ela.
Após meu primeiro dia de aula sentia-me um bichinho do mato forçado a adaptar a nova realidade, e logo percebi que meu paraíso encantado havia apenas transferido de local e meu sonho de criança continuava vivo não morrera com a nossa mudança. Comecei a tomar gosto pelo meu aprendizado dividido ente as lições gramaticais de dona Maria Guerra e as de vida que meu avô Guilhermino me passava. Ele um autodidata extraordinário cercando-me de uma atenção toda especial, procurando decifrar os enigmas da natureza satisfazendo minha curiosidade, sempre encontrando resposta para minhas perguntas muitas das quais até infundadas. Eu, um selvagenzinho orgulhoso julgando-me dono absoluto do seu afeto.
Enquanto alguns de meus primos menosprezaram seus ideais, eu os acatavam procurando cultivá-los com o Maximo de atenção. Nossos laços afetivos tornaram-se sólidos e verdadeiros. Sô Guilhermino como ficou conhecido era uma verdadeira enciclopédia em conhecimentos gerais. Nunca freqüentou escola alguma se não a escola da vida. Autodidata foi um líder nato não por escolha própria, mas colocado por Deus para socorrer as carências que o destino lhe impôs. Dedicou a vida ao bem comum colocando sempre as necessidades alheias acima de seu próprio interesse. “Orgulho-me ter nascido neste berço cujo protagonista foi este grande homem”.