O Lago dos Botos

Numa de minhas andanças pelas cidades do baixo Amazonas, estive em uma cidade onde morava um pescador, caboclo muito conhecido e muito experiente, devido aos longos anos que passou na proa de uma canoa pescando. O seu nome era Teodorico, mas do nome dele quase ninguém sabia, entretanto os conheciam pela alcunha de Cobra Grande, pescador que abarrotava na pescaria. Contou-me o Sr. Cobra Grande, que certa vez fora pescar no lago do Miuá, lago que tinha a boca estreita, mas o seu interior era bastante largo e grande, cheio de Igapó, Aningau e Pastos, onde os peixes se aconchegavam, tinha toda e qualquer qualidade de peixe, do Acari Bodó ao Pirarucu (maior peixe da região), mas também tinha uma enorme quantidade de Botos, tanto o Tucuxi como o Boto Vermelho, como também, a famosa Anaconda, mas conhecida como Sucuri, que atinge até 10 metros de comprimento e é capaz de engolir um Boi. Ocorre que nessa época a pescaria estava escassa, os peixes estavam desovando e difícil de ser pescado.

Nesse dia o Sr. Cobra Grande estava muito panema, não conseguiu sequer pegar um Mandiizinho ou até mesmo um Sulamba(Aruanã)para levar para sua mulher e os curumins. Já no final da tarde quando retornava da cabeceira do lago, observou que um Pirarucu boiava de vez em quando no meio do pasto, próximo a boca do lago, pegou sua Igarité (canoa) e rumou na direção, com a maior calma possível e silêncio profundo para ajeitar o peixe, armou sua malhadeira bem próximo ao local. Passado meia hora, viu que a malhadeira havia apreendido um peixe dos grandes, só que não era um Pirarucu e sim um Boto Vermelho, contrariando a sua perspectiva, começou a maltratar peixe, bateu, feriu o peixe com seu remo e depois o soltou.

Em seguida arrumou seu apetrechos para retornar a sua casa, isso por volta das 18 hs, com a noite chegando, quando já vinha remando, viu que um cardume de Botos o seguia, remou mais que depressa para sair de dentro do Lago, quanto mais remava mais os Botos se aproximavam, teve que abandonar a canoa e subir para Terra, visto que os Botos estavam bem próximo, os Botos pulavam por cima da canoa, soltando rebujos formando um redemoinho na água que levaram a sua Igarité ao fundo com todos os seus apetrechos. Passado alguns minutos veio à calmaria tudo voltou ao normal e o nosso personagem ficou ilhado pensando como iria retornar a sua casa, a única saída era esperar que alguém passasse e pudesse lhe dar uma carona.

E foi o que aconteceu, passou um amigo e lhe ofereceu a carona. Durante a viagem contou ao amigo todo o ocorrido e que ficou muito com medo e triste por ter perdido sua canoa e todo o seu apetrecho de pescaria e falou que nunca mais retornaria a pescar naquele lago.

Chegando em casa, cansado, com medo e sem nenhum peixinho para jantar, contou a sua esposa o que aconteceu e onde repetiu que jamais voltaria ao lago para pescar. Quando então sua esposa falou: “Os meus pais diziam que não se deve matar nem maltratar os Botos, porque eles são peixes que se encantam e transformam em pessoas, principalmente no horário das 18 hs”. O Sr. Cobra Grande como pescador experiente que foi, já havia ouvido falar, mas que nunca acreditou nessas crendices. No entanto a partir daquele dia prometeu nunca mais malinar ou matar os Botos. Nessa noite o Sr. Cobra Grande quase não dormiu teve muita insônia e pesadelos.

Que sirva de lição para todos nós. Uma coisa é certa, nas profundezas dos rios e lagos da Amazônia há muitos mistérios ainda não desvendados.

FIM

José Gomes Paes
Enviado por José Gomes Paes em 12/07/2011
Reeditado em 29/08/2011
Código do texto: T3089790
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