Sem Pai
Sem pai
Essa história titio me contou quando eu era pequeno, não aconteceu com o tio Benedito. Pois bem não consigo imaginar uma outra pessoa para ser o interlocutor do drama vivido pelo seu colega.
Desprezar o pai por motivos fúteis é normal em filhos adolescentes e rebeldes, eles sempre acham que são espertos e independentes, e no dia que perdem o ente querido geralmente caem na real de uma forma muito triste, pois não podem mais recuperar o tempo perdido.
Ditinho estava chegando em casa, vinha do trabalho quando seu Manoel se despedia de sua mãe. Percebeu então que o homem havia deixado alguma noticia séria, sua mãe estava em prantos. Ele nunca tinha visto a mãe tão triste. Manoel colocou o chapéu, virou-se para Ditinho fez um gesto com a cabeça e partiu.
Ditinho correu para perto da mãe a perguntar o que tinha acontecido...
“Mãe o que esta acontecendo mãe...”.
“Seu pai filho, seu pai Morreu...”.
“Como mãe, morreu de que...”.
“Foi a influenza filho...”.
Ditinho vidrou o olhar. Não falou nem demonstrou gesto algum.
Não via muito o pai, pois ele viajava muito, comprava farmácias falidas e depois de torná-las rentáveis as vendia.
Sua mãe pediu para ele se trocar para saírem, ela naquele momento inesperado precisava muito da companhia do filho.
Arrumaram-se e saíram em direção ao centro da cidade para pegar um carro de praça, o chofer senhor José Joaquim estava passando um pano em seu automóvel quando Valica e Ditinho chegaram. Valica pediu a seu José que os levassem rapidamente a vila onde o corpo aguardava um familiar para liberação. Aqueles momentos silêncios pareciam eternos.
Papeis para assinar, nomes, números, roupas... Coisas tão banais... Valica acabava de perder seu grande amor.
Contudo Ditinho não queria estar ali. Só estava indo para não deixar a mãe sozinha. Ela sabia que o filho era meio avesso ao pai. Mas aquele momento era único e Ditinho precisava participar.
O pai ausente, quando estava em casa escutava as queixas de Valica...
“Zé, seu filho foi mal na escola... Bateu no Cicrano... Quebrou a bicicleta do Beltrano... Saiu do castigo sem me avisar para ir brincar com o Fulano...”.
Seu pai sem opção ralhava e dava-lhe umas palmadas no menino arteiro, isso aliado a ausência do pai fez com que Ditinho fechasse seu coração para o pai, vendo-o como uma pessoa que só estava ali para reprimi-lo...
Logo estava no velório, aquele corre-corre, não deu tempo para avisar quase ninguém, poucos estavam ali para confortar Valica que chorava compulsivamente.
Ditinho viu pela primeira vez na sua vida um caixão, enfeitado com flores, pessoas que choravam e outras sussurravam o jovem não se deixou vencer, sério não mostrava sentimento algum.
Aquele longo dia passou e voltaram para casa e foram dormir. Pela manhã após o lanche, Valica entrou em seu quarto e logo saiu, e antes que Ditinho saísse para o trabalho, a mãe lhe deu um abraço pegou sua mão e entregou uma pequena caixinha e disse:
“Filho eu devia ter lhe dado isso a mais tempo, porém antes tarde do que nunca”.
Ditinho beijou a mãe e foi trabalhar curioso logo que entrou no bondinho puxado a cavalo, abriu a caixinha... Dentro dela havia um diário com muitas anotações, mas logo na primeira página...
“Hoje é um dia especial, nasceu meu filho, robusto, com certeza um vencedor, hoje é o dia mais feliz da minha vida...”.
A medida que Ditinho passava as páginas, sentia uma dor profunda, as lembranças boas ao lado de seu pai vinham lhe a memória... Os escritos contavam detalhes que até então Ditinho achava que só ele mesmo sabia.
Em certo trecho o pai dizia...
“Deus, meu filho esta doente, uma febre terrível, Deus passe para mim este sofrimento, poupe meu filhinho...”.
Ditinho estava perplexo, porém o que mais lhe machucaria estava por vir...
“Hoje é o dia mais feliz da minha vida, vou conseguir fazer um pé de meia para o futuro do meu filhão, esse não passara as necessidades pelas quais passei... Sei que fico fora de casa muito tempo, mas fazer o que, prejudico minha vida, mas dou condições para meu Benedito ser inteligente e trabalhador”. Em outro trecho o pai dizia... “Sei que Ditinho não gosta de mim, chega a me odiar, não imagino o que fiz... Nunca quis mal para ele, tudo que fiz foi sempre pensando no seu bem... Amo ele demais, e hoje só me resta torcer para que ele seja feliz, mesmo que ausente”.
Ditinho estava inconsolável, percebia que havia perdido a coisa mais importante do mundo, trocará seu pai por mesquinharias de adolescente.
Escrevi este caso contado pra mim pelo tio Benedito, que não teve a sorte de conhecer o pai, e por isso não aceitava a idéia de tratar um “Ser” tão importante com indiferença.
Para quem já teve e para quem tem um, um beijo nele.