UMA GRATA SURPRESA E AS INTIMIDADES ALHEIAS
Dia destes ao sair de um consultório odontológico no centro de Bom Despacho, fui apanhar a lotação defronte ao sétimo batalhão. Em uma pracinha ajardinada e aconchegante, que numa justa homenagem, leva o nome e ostenta o busto de um militar bom-despachense que perdeu a vida heroicamente no cumprimento de seu dever quando tentava salvar uma família seqüestrada.
Como me sobrava tempo, dirigi até ao memorial. Sentada em um banco estava uma senhora de cor negra aparentando mais ou menos cinqüenta anos. Saudei-lhe com um bom dia, sorridente ela respondeu. Sentei-me no banco ao lado, meu telefone deu sinal, era mensagem de um amigo. Enquanto respondia a mensagem, percebi a aproximação de outra senhora também de cor, que sentou ao seu lado.
Guardei o telefone e permaneci à espera do coletivo. Logo as duas começaram a falar de intimidades pessoais, indiferentes a minha presença, como se estivessem isoladas. Percebi que uma, a mais velha é viúva e dedicada à família, residindo na capital paulista, e a mais nova casada moradora num bairro de Bom Despacho, mas com uma forte amizade com um vizinho que encontra nela o apoio que lhe nega a família. Até ai tudo bem. O surpreendente foi quando a mais velha falou da saudade que sente da terra natal, no caso o Engenho do Ribeiro. Ouvindo isso, percebi que se tratava de duas conterrâneas, apurei os ouvidos e passei a interessar pela conversa embora discretamente sem manifestar.
Dando seqüência ao assunto ela afirmou que vez por outra mata a saudade lendo um livro escrito pelo Geraldinho, cujo titulo é (Gente de Minha Terra em Contos do Vale). E que dia destes estava as gargalhadas com a história de um aleijadinho, quando a filha disse; - que isso mãe ta ficando louca? - Não filha, me divertindo com as estórias escritas por um meu conterrâneo. Interrompendo outra disse - Soube que o Geraldinho escreveu alguns livros, fiquei surpresa, trabalhei em sua fazenda, fás mais de trinta anos colhendo casulos de bicho da seda, nunca imaginei que teria essa capacidade. Vivia mergulhado no trabalho de roça, deve ter estudado depois disso! - Estudou nada inclusive no livro ele afirma que cursou apenas a escola da vida-, quero comprar mais alguns de seus livros, são ótimos pra gente que mora longe -, é bom para relembrar os amigos, e o tempo de escola.
-Eu nunca li já falei em comprar, mas ainda não tive oportunidade. Você já leu, ele fala sobre o pai? –Fala sim sobre todas as pessoas mais antigas.
Nesta altura eu que tentava ser indiferente, acabei traindo-me e falei para a mais nova; Você disse já ter trabalhado para o Geraldinho -, acaso você é filha do Zé Bilica? - Sim somos-, nós duas! – Oh mulher me perdoa eu não a reconheci! –Oh... Mas que surpresa é O Geraldinho? Também não o reconheci, mas fás tanto tempo! – A mais velha ficou ainda mais surpresa e disse lembrar-se de mim só no tempo de escola quando éramos crianças, e afirmou ainda bem que não estávamos falando mal de você! - Com isso, viajamos juntos até ao Engenho.
Se tivessem me reconhecido antes, jamais teriam dialogado a respeito de suas intimidades. Bem se dizem que: (parede tem ouvidos e mata fechada tem olhos).