O FANTASMA DO TIBURCINHO
Feriado prolongado, nenhum compromisso, destino: barranca do rio. Reunimos o pessoal, improvisamos algumas tralhas só pra disfarçar, compramos carne, cerveja e claro, cachaça, até por que ninguém é de ferro e partimos com destino à margem esquerda do Paranapanema. O lugar escolhido foi uma vila de pescador que tem por lá, pedimos a chave do barraco de um pescador amigo e lá fomos nós, mesmo sabendo que a pesca estava fechada e os barracos abandonados. Ninguém ia pescar mesmo, só garrafear.
Lá chegando, cada um foi fazer algum tipo de atividade. Alguns companheiros foram conferir a ceva de paca e quem sabe, se tivesse sorte abater uma para aumentar nosso estoque, os outros ficaram preparando churrasqueira e molhando as palavras.
Um dos amigos, o Edson, apesar de não ser garoto era bicho urbano, nunca tinha pernoitado à beira de um rio e Diego, mesmo tendo ido algumas vezes era ainda calouro, ficaram ali a nossa volta, fazendo perguntas e matando a curiosidade sobre os mistérios do Paranapanema.
A água que usávamos para cozinhar e beber vinha de uma mina distante aproximadamente uns seiscentos metros e era bombeada por um burrinho mecânico que fica com seu toc... toc intermitente, mas como estava distante ninguém ouvia, isso, até a noite se acalmar e os barulhos cessar, quando então, você pode ouvir até o murmurar das águas em sua longa jornada, e quando isso ocorreu, o toc... toc do burrinho passou a soar como marteladas nos ouvidos desacostumados, no caso, do Edson e Diego, que aliás vieram meio assustados perguntar o que era.
Percebendo que a curiosidade dos dois estava associada a uma boa dose de medo, resolvi botar pilha nos nervos deles com a ajuda é claro dos outros companheiros.
— Que barulho é esse? Perguntaram.
— É o Tiburcinho — disse eu (nome que veio ao acaso).
— E quem é Tiburcinho?
Carlos atento, de lá já emendou:
— É um pescador antigo que tinha aqui. Já morreu faz tempo.
— Se ele morreu como pode ser ele?
— É a alma dele disse João — fica o tempo todo lá no varjão arrancando minhoca com seu enxadão. Esse barulho são das “enxadãozadas”.
— Meus Deus! — murmurou baixinho o Edson.
— Minha nossa Senhora — emendou Diego.
Percebemos que eles ficaram assustados de verdade, mas não demos bola, continuamos nossos afazeres. A partir daquele momento os dois murcharam num canto e começaram a cochicharem, acho que confidenciando um ao outro o medo que estavam sentindo e dando mais espaço em suas mentes para enchermos com mais caraminholas.
Devido à própria dinâmica dos ventos, deixamos de ouvir o barulho do burrinho e passamos a ouvir um toc... toc atrás do barraco vizinho, quando então Carlos comentou em voz alta apontando para o barraco vizinho:
— O Tiburcinho está mais perto — escutem — fez uma pausa levando os dedos aos lábios pedindo silencio.
Realmente o toc...toc agora estava atrás do barraco. Prestaram bem atenção e nós só observando. Com os nervos à flor da pele, tremendo de medo e quase borrando nas calças, mais uma vez correram para junto de nós.
— Ouçam... É verdade, o Tiburcinho está atrás do barraco... E agora?
— Relaxa rapaziada — disse eu. O Tiburcinho é um fantasma do bem, só está um pouco nervoso — certamente está querendo uma cachaça.
— Ele bebe cachaça — perguntou Diego?
— E como bebe — vou colocar uma dose e vocês vão levar pra ele.
— É doido, eu não — gritaram os dois ao mesmo tempo.
— Seus medrosos — deixem comigo.
Peguei o litro de cachaça, despejei uma boa dose num copo e disse que ia oferecer ao Tiburcinho para ele parar com aquele barulho. Fui até os fundos do barraco vizinho, fechei a torneira do chuveiro improvisado que caía sobre um pedaço de lona preta, responsável pelo barulho assustador, bebi a “marvada” e resolvi o problema. É evidente que, quando retornei, eles estavam ainda mais assustados. E mais assustados ficaram quando os que estavam no mato retornaram, pois correram ao encontro do grupo para falarem do tal fantasma, no que um dos amigos, por coincidência, pura coincidência, pois não tinha nada combinado respondeu na bucha: Dá nada não — é o Tiburcinho — falou um dos companheiros e virando as costas, foi tomar uma
Foi a gota d’água, se recolheram dentro do barraco com direito a pesadelos. Não foi nem uma hora depois, Diego aparece gritando — o barraco está pegando fogo — saiu correndo e pulou no rio.