RETRATO DA SOGRA

Quem quiser pode me chamar de puxa saco que eu não me importo. O que é verdade tem que ser dito. Eu gosto da minha sogra como se ela fosse a minha própria mãe. Não estou blefando nem fazendo jogo de cena para agradar minha mulher. Ela sabe que estou sendo sincero.
Gostar de sogra pode parecer estranho para muita gente. Aliás, não sei por que essas nossas simpáticas segundas mães adquiriram essa fama de britadeiras de casamentos dos seus filhos. A minha, ao contrário, tem sido mais uma fada madrinha, que tem guardado os nossos caminhos, do que uma bruxa malvada que vive lançando maus sortilégios sobre a nossa vida conjugal. Isso pode parecer até um tanto estranho, mas é a mais pura verdade.
Aliás, a nossa história está longe de ser banal. A minha atual sogra já foi antes minha cunhada, de sorte que a sua filha, que hoje é minha mulher, já foi minha sobrinha. Ou melhor, sobrinha da minha falecida esposa, que aliás, era irmã da minha atual sogra. Pode parecer meio confuso tudo isso, mas é assim mesmo que as coisas são. Depois que a minha primeira esposa faleceu eu me casei com a sobrinha dela. E a minha atual sogra, que então era minha cunhada, já era, naquela época, a minha melhor amiga. Coisas de família. Meu casamento com a primeira esposa durou vinte e cinco anos e eu achei tão bom que não quis trocar de comunidade. Fui logo me ajeitando com a única mulher disponível dentro da família, e por sinal, foi uma das melhores escolhas que eu já fiz na vida. Vai fazer doze anos que estamos juntos agora, eu e a minha ex-sobrinha, e em perfeita paz com a minha antiga cunhada que agora é sogra.
Para provar que isto não é apenas uma estória que eu inventei para cumprir uma missão que eu me impus ─ escrever no mínimo um texto por dia ─ quero dizer que um dia desses ganhei um prêmio numa festiva do Lions Clube de Bertioga. Sabem por quê? Porque eu era o único genro naquele salão que tinha uma fotografia da sogra na carteira. O desafio era esse: quem carrega uma foto da sogra na carteira? Evidentemente que ninguém tinha. Bem, para ser hobnesto, confesso que eu também não. Na verdade eu trapaceei. Minha sogra estava comigo e me passou uma foto dela por baixo da mesa. Mas não faz mal, eu ganhei assim mesmo. Era um belo vaso de flores que, eu, claro, dei para ela. Afinal, o simples fato de eu ter levado a minha sogra num evento desses já justifica todo o meu comportamento. Bom, talvez eu não chegue ao ponto de carregar a foto da minha sogra na minha carteira, mas isso não é preciso. Ela tem lugar cativo no meu coração. Aliás, tenho certeza que ela prefere essa alternativa. Carteiras podem ser perdidas ou roubadas. Corações também. Mas como o meu eu já dei para a filha dela, esse perigo ela não corre.  


João Anatalino
Enviado por João Anatalino em 02/06/2011
Reeditado em 02/07/2011
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