A VOZ DO ALÉM NO GRAVADOR

Eu tenho uma amiga, quase irmã que se chama Katia, pra mim é Katinha, que é uma pessoa meio desligada da vida, apesar de ser uma maravilhosa amiga, inteligente, meiga e sempre pronta pra ajudar a todo mundo que dela se aproxima. Mas ali, acolá, ela dispara um dos seus mísseis. Só pra você ter uma idéia, fomos ao teatro certa vez, ver um show de humor, com um humorista engraçadíssimo, o teatro quase ia abaixo de tanto que o povo gargalhava, quando olhei para o lado em que Katinha estava, ela estava dormindo.Cutuquei a dita cuja:-Mulher, acorda, tu estás perdendo o show! E ela: - Menina, eu tava era sonhando um sonho tão engraçado. Sonhei que estava ...aonde mesmo? Esqueci, só sei que eu estava rindo que só!

Essa é minha amiga Katinha.Mas o que eu quero aqui relatar é um causo meio maluco, que aconteceu com ela quando era mais jovem e estudava danadamente para o vestibular. A coitada não agüentava mais de tanto ler e decorar que resolveu gravar em fita K7 todo o texto de história do Brasil. Ligava o gravador antes de dormir, para ouvir aquele texto até o sono chegar e muitas vezes ele passava a noite no automático, porque ela achava que seu inconsciente adormecido assimilaria tudo.

Uma vez acordou no meio da noite, o gravador repetindo sem parar e ela resolveu desligá-lo, nisso, uma voz de uma moça que não era a sua, mas saía do gravador, começou a chorar e gemer e a pedir ajuda desesperadamente.

-Me ajude, me ajude, eu quero sair desse lugar... Por favor, tenha dó de mim, me ajude! Está escuro aqui, eu tenho medo...

Katinha levantou-se de um pulo e desligou o gravador. Os cabelos estavam em pé e ela tremia mais do vara de bambu. Olhava para o gravador e parecia que via assombração. Não dormiu mais. No dia seguinte, contou a sua mãe dona Carmelita o que tinha acontecido. A mãe foi buscar o gravador, colocou em cima da mesa e disse:-Vamos ouvir a fita.

Ouviram uma, duas, três vezes e nada. Somente a história do Brasil estava relatada ali.

_Juro que ouvi mamãe. Juro que ouvi!

-Você deve estar com a mente muito cansada de estudar, minha filha, ou sonhou com essa bobagem.

-Manhinha , eu ouvi, juro por Deus.

-Pra você ficar sossegada, vá estudar outra coisa, deixe esse gravador aqui, vá estudar pelos livros.

-È hoje vou estudar Literatura. Falou mais calma acreditando na possibilidade do sonho.

Depois do café, sentou-se na sua escrivaninha e pegou um livro de um autor local, muito conhecido onde na primeira folha estava escrito:

DEDICATÓRIA

Homenagem póstuma a minha filha Cátia, que suicidou-se aos dezesseis anos porque não conseguiu passar no seu primeiro vestibular.

Que Deus a perdoe!