"SEU" TEIXEIRA

“SEU” TEIXEIRA

(Levy Pereira de Menezes)

Este quem me contou foi um Oficial de Justiça, hoje já aposentado.

Montanha era - e continua sendo - uma comarca de primeira entrância, situada no norte do Estado, na divisa com a Bahia. Cidade pequena, com pouca ou quase nenhuma infraestrutura. Tudo lá era mais ou menos improvisado, inclusive o Forum da nova comarca. Só existia uma pensão, a de Dona Orozina, cozinheira e tanto, que tinha a preocupação de sempre reservar os melhores quartos para os Juízes, Promotores e advogados.

Pois bem! Certo dia chegou à comarca um Juiz de Direito, recém promovido. Já sabia, por informação de colegas, que a hospedagem deveria ser na pensão de Dona Orozina. Não foi difícil encontrá-la. Bem recebido pela proprietária, foi logo encaminhado para o melhor quarto. Entretanto, o Juiz, ao abrir a mala, verificou que havia esquecido de levar pasta de dente, sabonete, pente, etc. Do quarto onde estava percebeu que não muito distante, do outro lado da rua, tinha um pequeno armarinho. Para lá se dirigiu e ao entrar na casa comercial, um baiano muito simpático, de sorriso largo, foi logo perguntando:

- Em que posso servi-lo, seu Teixeira ?

O Juiz, pessoa bastante sisuda, embora agradável, delicado, estranhou o tratamento, já que não tinha nada de Teixeira no nome. Poderia ser um engano, quem sabe ?

- O senhor tem pasta de dente ?

- Tem, seu Teixeira - disse o comerciante, já com umas três marcas diferentes nas mãos.

- Tem sabonete - pergunta o Juiz.

- Tem, sim, seu Teixeira.

O Juiz já estava na hora de explodir, mas manteve a calma, levando-se em consideração que se tratava de pessoa humilde, despreparada para o trato com uma autoridade. Por outro lado, o comerciante não deveria saber de quem se tratava o freguês. Após comprar tudo de que precisava, perguntou:

- Quanto é ?

- Tantos cruzeiros (era cruzeiro a moeda na época), seu Teixeira.

O Juiz pagou, e quando ia saindo, o comerciante disse:

- Muito obrigado, seu Teixeira. Apareça sempre. Aqui estamos sempre às ordens, tá, seu Teixeira ?

O Juiz, ao chegar ao Forum, determinou a um Oficial de Justiça que trouxesse o comerciante à sua presença, imediatamente. Cumprida a ordem, lá estava o baiano.

- Eu sou o Juiz de Direito da Comarca - disse, dirigindo-se ao atônito comerciante. Gosto de ser respeitado, da mesma forma que respeito a todos. O senhor chamou-me de Teixeira, com alguma intimidade, que não lhe dei. O meu nome é...(declinou o nome). Se tal novamente ocorrer, isto é, se o senhor novamente tratar-me de Teixeira vou prendê-lo.

- O Sr. Entendeu ? – perguntou-lhe o juiz

- Entendi, seu Teixeira – respondeu o comerciante.

Não foi preso, pois do rosto do Magistrado surgiu um longo sorriso, escondido pelos autos de um processo que colocou à sua frente.

Passados alguns segundos, o Juiz colocou o processo em cima da mesa e, já refeito, disse ao comerciante que, em pé, tremia dos pés à cabeça:

-- O Sr. está dispensado. Pode ir.

-- Obrigado. Que Deus abençoe o senhor e sua família, “seu” Teixeira. Nunca mais vou-me esquecer deste dia, tá ,“seu” Teixeira

levy pereira de menezes
Enviado por levy pereira de menezes em 03/11/2006
Reeditado em 01/10/2007
Código do texto: T281576