O Caso do “De gustibus et coloribus non est disputandum”

I

Eu estava no balcão da 6ª. Vara do Trabalho de Belo Horizonte tentando captar algum novo caso para este livro quando um advogado de uns sessenta anos entrou e pediu ao Agnaldo - meu amigo e balconista do turno da tarde naquela Secretaria - para que fizesse a “carga” de um determinado processo. O balconista solicitou ao advogado o número do registro dele na Ordem dos Advogados do Brasil, seção de Minas Gerais, (OAB/MG).

Expliquei ao advogado que eu estava recolhendo histórias acontecidas na Justiça do Trabalho com o objetivo de reunir num livro os relatos de todos os seus freqüentadores, advogados, juízes, peritos, partes, balconistas, estagiários de direito, oficiais de Justiças, etc.

Então o advogado me confiou os seguintes fatos:

- “Comecei a militar na Justiça do Trabalho por volta de 1967 ou 1968. Naquele tempo os balconistas nos conheciam pelo nome e não pelo número do nosso registro na Ordem. Em verdade constituíamos um número bem menor de procuradores do que o que existe hoje em dia e creio que isso muito ajudava na memorização dos nossos nomes e rostos por parte dos servidores. Por outro lado, os tempos eram outros também. Olhando daqui para trás, não há como negar que a vida e o mundo mudaram radicalmente nos últimos anos.

Naquela época – continuou ele - existiam apenas seis Varas do Trabalho que eram designadas pelo nome de Juntas de Conciliação e Julgamento. As audiências eram realizadas na parte da tarde. Então, ali por volta das quinze horas o juiz suspendia momentaneamente a sequência das audiências e nós nos dirigíamos a um pequeno recinto existente na Secretaria para tomarmos um “cafezinho” e nos distrairmos um pouco daquela trabalheira. Íamos todos – advogados e juízes.

Havia entre nós um “combinado” em relação àquelas rápidas reuniões: podia-se falar de tudo exceto sobre os processos em que estivéssemos atuando e em relação a quaisquer outras questões relativas ao Direito em geral e ao Direito do Trabalho em particular. Evitávamos ainda qualquer comentário sobre futebol, pois este geralmente também abriga inúmeras rivalidades e gostos. Naquela época nós nos fazíamos adeptos do seguinte provérbio escolástico: “de gustibus et coloribus non est disputandum”, que significa que não se deve discutir à respeito de gostos e cores.

Temos aqui no Brasil – prosseguiu ele - uma variante popular bastante interessante daquele provérbio antigo. É aquele que diz que “se todos gostassem do vermelho (ou do verde ou do azul, alterando-se a cor conforme se queira), o que seria do amarelo?”

Entretanto, assim que retornávamos à sala de audiência, voltávamos igualmente aos nossos propósitos trabalhistas e à razão de nossa presença naquela sala. Então a coisa pegava fogo outra vez!”

II

Fica guardada aqui uma breve homenagem a esses ilustres juízes e advogados, eminentes juristas daquelas primeiras horas. Alguns deles – como pudemos ver no exemplo desse advogado encontrado por acaso no balcão de uma Secretaria - continuam exercendo as suas atividades profissionais; outros provavelmente se encontram curtindo os seus netos e bisnetos, saboreando e vivendo o melhor da vida no templo da melhor idade.

É possível também que uns terceiros já se encontrem exercendo o Direito noutras misteriosas fronteiras além do espaço e do tempo.

Eis a nossa homenagem a cada um deles!