Se despedindo da felicidade

O término de uma relação nunca é fácil, ainda mais o término de uma relação duradoura, onde tantos momentos foram vividos, tantas lembranças foram criadas e num único momento, parece que nada fez sentido, onde algo que parecia tão grande, tão infinito simplesmente acaba parecendo não ter tido significado algum. Mas e quando esse infinito ainda vive, quando os sonhos ainda planejam e a paixão ainda lateja em nós e mesmo assim, somos obrigados a ter que abrir mão de tudo? Não é fácil… Buscamos respostas, lutamos por isso, mas quanto mais lutamos, mais sofremos, pois quanto maior o esforço, mais nós percebemos que estamos sozinhos nisso e isso dói, pois é mais intenso quando é mais fácil e quanto mais difícil se torna, é porque realmente acabou. Ás vezes a forma como se acaba uma relação, pode definir se ela foi importante ou não, no meu caso, acredito que não teve importância alguma, aconteceu exatamente assim.

Quando se convive um certo tempo com uma pessoa, acabamos conhecendo detalhes que ela mesma não percebe, como a forma como ela conversa conosco, quando ela está chateada, quando ela está interessada ou quanto está distante e com o tempo, notei que ela estava distante, já não me ouvia com os mesmo olhos brilhantes e por não mais me ouvir, passou a atravessar os nossos diálogos com assuntos distintos. O que parecia coisa pequena, foi virando uma bola de neve, onde os esquecimentos também passaram a se fazer presente, o esquecimento de datas importantes, de compromissos e até mesmo aquele “te amo” na hora das despedidas. Certas coisas apesar de parecerem bobeiras, na verdade fazem uma enorme diferença e geralmente quem percebe, passa a ser tratado como uma pessoa paranóica então, passamos a engolir certos sapos, pondo em xeque nossa própria crença, só para não chatear, mas as atitudes ou a falta delas se mantém e cada vez mais fica difícil se manter calado e as brigas passam a se fazer cada vez mais presentes.

Nós estudávamos na mesma universidade e fazíamos os mesmos cursos, andávamos sempre juntos e de repente, ela passou a andar mais com as amigas novas e assim, cada vez mais foi se distanciando, nos víamos pouco e a sua forma de falar comigo passou a ser mais ríspida, foi quando eu descobri o que estava havendo. Nós sempre sentávamos no canto da sala, mas isso foi mudando, onde nas aulas de português, ela passou a se sentar na frente e foi então que peguei algo no ar, os olhares dela e do nosso professor em meio a risos, aquilo me enfureceu, senti o estômago congelar e o meu rosto esquentar, passei então a me perguntar desde quando isso acontecia e eu nem percebia. A aula enfim acabou e eu saí decidido a falar com ela, a turma inteira saiu e ela demorou mais do que de costume, na verdade ela fora a ultima a sair, foi então que ela arregalou os olhos quando notou que eu a estava esperando.

-“Então é o professor, não é mesmo?”

-“Não começa, depois conversamos”

Ela mal olhou nos meus olhos, é incrível como quando uma pessoa percebe que fora descoberta, se mostra incapaz de manter um diálogo, a culpa estava não só em seus olhos, mas em seu corpo inteiro. Chegando na hora do intervalo, fui até a sua mesa e ela rapidamente fechou o seu noot book, disse que iria ao banheiro e que logo falava comigo. A partir dali eu passei a lembrar e a perceber que nos últimos dias, ela passava muito tempo naquele noot book então, enquanto ela saiu, resolvi abrir e foi então que acabei flagrando. Ela estava conversando com o professor, irritado, eu puxei todo o histórico da conversa, foi quando descobri que eles já faziam juras de amor e muitos planos de ficarem juntos, ela então apareceu sem que eu pudesse perceber, pois estava muito focado naquilo tudo e arrancou o noot book das minhas mãos e ao perceber que eu havia lido tudo, ela não teve como negar, mas também não quis parecer na defensiva e acabou me atacando. Eu nem tive forças de retrucar, em meio aquilo tudo, eu apenas me levantei e fui em direção a sala onde aconteceria a próxima aula. No meio do caminho, um rapaz que adora zoar com todo mundo, acabou me pegando pra Cristo, geralmente eu apenas ignoro, só que eu estava tão nervoso que acabei desferindo um soco em seu nariz, o que fez ela me olhar com um olhar de culpa e baixar a cabeça. O problema é que ele só tinha dezessete anos, era novato e seus pais foram avisados sobre o ocorrido, o que me faria ter que ficar após a última aula e assim, adiar ainda mais a minha conversa com ela, o que só aumentou a ansiedade. Por mim eu largava tudo e iria direto nela.

Pra piorar, a ultima aula era justamente com aquele professor, que pela forma como me olhou, já sabia do acontecido, ou seja, já sabia que eu estava ciente do que estava acontecendo. Respirei fundo e apenas segui em frente sem conseguir olhar em seus olhos. Ironia ou não, tínhamos que entregar uma redação falando sobre felicidade, eu até já tinha feito a minha e tínhamos que ler para que a toda sala ouvisse. Eu olhei para a minha redação e de repente tudo aquilo havia perdido o sentido então, rasguei a redação, peguei um papel em branco e falei o que havia na minha cabeça, mas agindo como se estivesse lendo:

“A felicidade é uma coisa louca, um estado de êxtase que nos cega e nos ensurdece, não nos permitindo enxergar nada a nossa volta nem ouvir o que não quer, como se assim ela quisesse. Às vezes ela é alegria por trás da triste de alguém. Às vezes ela é companhia, às vezes ela não é ninguém. Ela é inconstante, não sabe se fica ou se vai embora. Nos atormenta, nos provoca, brinca com a nossa mente, está sempre nos pondo a prova. Às vezes a enxergamos e a possibilidade nos faz achar que a podemos sentir. Então alimentamos isso, para não ter que vê-la partir. Ela não enxerga erros, não escuta as suas falhas e se alimenta apenas de si. Enquanto lateja, faz do errado certo e vice versa, cria seus próprios argumentos, segue em um ciclo vicioso, escuro e silencioso frenesi. A minha felicidade foi embora, nem olhou para trás, foi ser feliz sem mim. Nem sequer se despediu, parecendo não lembrar que um dia me disse que não teria fim”.

O silêncio tomou conta da sala, ela de repente me olhou nos olhos como quem dizia “sinto muito” e o professor ao recolher a minha folha, notou que aquilo tudo saiu como desabafo. Arrumei as minhas coisas e saí em silêncio rumo à direção, onde antes mesmo de ultrapassar a porta, o pai do aluno já me fuzilava com os olhos e antes que ele pudesse dizer algo eu disse:

“Desculpe ter feito o senhor vir até aqui, desculpe por preocupar um pai que estava trabalhando, fazendo-o vir até a escola de seu filho. Sei que por ser pai, a preocupação é em dobro, sei que deve ter sido apavorante saber que seu filho apanhou na escola, onde deveria estar apenas aprendendo. Confesso que não sei o que houve, mesmo que eu tivesse todos os motivos para fazer isso e eu sei que tive, pois o seu filho não é uma pessoa fácil de se conviver, acabei agindo da forma mais errada, eu não fui eu naquele momento, o que mais me chateia, é que o que me fez fazer isso, não foi o insulto dele em si e sim, os meus problemas buscando uma saída. Sei que o senhor está irritado e tem todos os motivos para isso então, seja lá qual for à punição que decidir junto a universidade, eu estarei de acordo e nem argumentarei sobre”.

Ao que parece, ele estava disposto a no mínimo gritar muito comigo, mas toda a sua fúria acabou dando lugar a um suspiro fundo e seu olhar passou a fuzilar seu filho:

“Você o provocou?”

Seu filho apenas abaixou a cabeça dando a entender que sim, o que fez seu pai deixar as coisas como estão e ninguém acabar sendo punido. Ao sair da sala, me deparei com ela me esperando, seu olhar era de culpa, estava chorando então, seguimos para um lugar mais calmo e ali começamos a conversar.

- O que mais me chateia, não é você ter encontrado alguém… O que me chateia é você não ter sido sincera comigo. Eu talvez não mereça mais o seu amor, mas por tudo o que passamos, eu acho que no mínimo, eu merecia algum respeito. Éramos além de tudo, grandes amigos poxa, sempre conversamos sobre tudo e de repente, você passou a me ignorar, mentiu pra mim e eu tentei te alertar, mas você passou a me atacar.

- Não sei o que deu em mim, aconteceu tudo tão rápido e você estava certo na sua redação, eu fiquei cega, passei a ignorar muita coisa sem perceber, como por exemplo, estar te magoando, eu não queria isso, mas infelizmente aconteceu.

- Como, quando e o que aconteceu?

- Minhas amigas gostavam dele, mas eram tímidas e pediram pra eu arrumar uma forma de aproximá-lo delas então, eu pedi o email dele e passamos a conversar. Com o tempo fomos nos conhecendo mais e mais e acabamos encontrando muitas coisas em comum.

-Parou nos Emails?

Ela não conseguia olhar nos meus olhos, a pergunta a incomodou bastante então, ela passou a responder de forma seca, sem detalhar muito.

-Nos encontramos algumas vezes.

-E o que houve nesses encontros?

-No primeiro encontro nada, no segundo acabou rolando um beijo.

-Foram além do beijo?

-Sim!

-Como foi?

-Como assim?

-Como foi o beijo? E na hora, em algum momento você pensou em mim? Teve orgasmos?

- Porque ta fazendo isso?

-Preciso saber.

-Pra que? Eu estou aqui assumindo o erro, não estou?

-Preciso saber exatamente como foi, para eu não perder noites de sono imaginando como e quando foi. Se quando você desmarcava alguma coisa comigo ou quando simplesmente esquecia de aparecer. Não quero ter que viver e alimentar essas coisas na minha cabeça, apenas me ponha a par de tudo, para que doa tudo de uma só vez e não dure mais do que deveria.

-O beijo é bom e sim, tive orgasmos e tentei não pensar em você.

-Para não se sentir culpada e assim, não enxergar motivos para não fazer. Você estava disposta a fazer! Onde foi na primeira vez?

-No carro dele.

-Quando?

-Nos encontrávamos toda noite no fim do expediente dele.

-Então inventou o curso de fotografia.

-Sim.

-Ele fode bem?

-Não faça isso, por favor!

-DIGA!!! É melhor que eu?

-Apenas diferente.

-Diferente como?

-É mais carinhoso, mais cuidadoso.

-Eu te trato como uma vadia?

-Muitas vezes.

-Porque será?

-(…)

O silêncio dela só me irritava, eu queria saber de tudo, que ela atirasse todas as verdades em meu coração:

-PRETENDE FICAR COM ELE? QUAL O GOSTO DA PORRA DELE? ESTÁ APAIXONADA?

-SIM, FICAREMOS JUNTOS, SIM ASSUMIREMOS ESSA RELAÇÃO QUANDO FOR POSSÍVEL E O GOSTO É MAIS AMARGO, MAS DE INTENSIDADE DOCE. ELE ME FAZ BEM, ELE TRANSA BEM, ELE BEIJA BEM E É COM ELE QUE EU QUERO FICAR!!!

-Ótimo, era isso que eu esperava, que pelo menos uma vez, fosse sincera… e não se preocupe, eu não falarei nada sobre vocês. O que me tranqüiliza, é saber que ele só está te usando, que logo ele pegará outra aluninha ingênua e você será só mais uma em sua lista. Agora sai da minha frente sua vagabunda, a sua presença me enoja!

O tempo passou e lidar com isso fora mais difícil do que parecia. Ter que conviver com os olhares deles e tudo o mais. Acabei trancando a faculdade e decidi viajar, tirar um tempo para mim, ficar longe de tudo e todos. O tempo é realmente o mais sábio e também o melhor remédio. Aos poucos a dor foi passando, cada vez mais fui aceitando que o problema não estava comigo, mas confesso que o que mais me fez bem, foi abrir meus Emails e receber uma Email dela dizendo:

“Você estava certo”

(Fictício) (inspirado no filme Closer - Perto demais, somado a pensamentos meus)

(Sujeito a mudanças)