UM MILAGRE DE NATAL
UM MILAGRE DE NATAL
Nando caminhava pela Rua Grande, e via as lojas todas enfeitadas para o Natal, grandes arvores com bolas cintilantes ente laços de fitas coloridas, via as coisas, roupas, e brinquedos e mirava-se nas vitrines onde as suas vestes e sapatos desgastados pelo tempo e muitas lavagens pediam algo novo. Mais como adquirir essas coisas, se Vó Juliana mal ganhava para os alimentos e, para completar fazia seis meses que inexplicavelmente o Governo havia cortado a bolsa família que complementava a aposentadoria de sua avó. Nando desde que a sua mãe morreu que ele pedia a Deus todos os dias que fizesse com que o seu pai o procurasse, ele jurava que nada pediria ao pai senão poder abraça-lo e com a sua mãozinha de um menino de oito anos senti-la beijada na hora da benção paterna. Sempre quando os meninos da rua da estrela no morro do tatú se reunião para contarem as suas histórias ele logo se retirava quando algum fazia comentários sobre o pai, a mãe e as coisas do dia a dia de uma família, pois Nando só tinha a avó e rezava constantemente para que ela vivesse muito para que ele jamais ficasse só em um mundo repleto de maldades e covardias, as quais ele já se acostumara a ver desde cedo. A sociedade do morro do tatú dividia-se em: traficantes, criminosos comuns que se intitulavam de milícias e exigiam pedágios para dar a segurança à classe de trabalhadores que por falta de opção viviam no morro a Deus dará e sujeito a todas as leis impostas pelos senhores do trafico e dos milicianos, restava somente aos trabalhadores pobres e honestos a situação de margem e submissão para poderem continuar vivos. Um grande malabarismo viver em uma situação delicada como essa, quando diariamente alguém era vitimado pela violência ou das balas perdidas da guerra entre policia e bandido, a celebre novela de todos os dias das comunidades pobres desse país.
Sempre vó Juliana dizia :Nando não fique triste pois para Deus nada é impossível e milagres existem, quem sabe o teu pai uma horinha dessas não aparecesse e nos tira daqui. Olha que a Maria Julia tua mãe falou que ele era gente grande, de respeito e de dinheiro, afinal ele até te registrou, assim filho ele sabe da tua existência e os pais não abandonam os seus, tenha fé, estamos perto do Natal e os anjos estão a procura daqueles que esperam um milagre, mais Nando retrucava qual vó, eu nem sei se o pai existe, como ele é, se é grande ou pequeno ou a cor dele. As vezes eu sonho que passeamos juntos e que ele me carrega nos brações e beija a minha cabeça, mais eu nunca vejo o seu rosto, porque vó Juliana? Ah filho eu não sei, são coisas dos sonhos, mas de uma coisa eu sei, se você anda sonhando ele logo vai aparecer.
Os dias se passavam depressa e Nando a esperar, por uma oportunidade de ir à escola aprender como todos os meninos e quem sabe um dia ser até um doutor, de ter brinquedos de verdade e não as garrafas pet que ele apanhava no lixo dos arredores, de poder usar roupinhas novas e transadas e até usar aquela agua cheirosa chamada perfume que Chico filho do quitandeiro usava. Ele navegava nos sonhos lindos e ingênuos da sua infância e as vezes confundia-os com o pesadelo da imagem da mãe morta com um filete de sangue a escorrer pela boca quando foi atingida mortalmente por uma bala perdida em um confronto entre as forças do bem e os traficantes, assim acordava agitado e logo vó Juliana o recebia em seus braços com lagrimas nos olhos ao ouvir o sonho e a perda da filha tão bela, tão jovem e tão esperançosa levada tão rapidamente quando ainda nem chegara a maior idade.
Dia 23 de dezembro, chovia intermitentemente, a casa de chão batido logo as goteiras formaram um lamaçal só, vó Juliana sentou-se na única cadeira que existia e pós os pés sob uma mesa tosca, com o neto nos braços para evitar uma gripe que para as crianças pobres daquele lugar quase sempre era fatal, mais se aproximava o Natal, ela cantarolava melodias de época e orava com muita fé pelo milagre que aconteceria no grande dia do nascimento do Menino Jesus, Nando quieto, a chuva cedeu e logo o sol surgiu assim como numa manhã de outono quando os raios multicoloridos se confundem com os enfeites natalinos e uma canção se fez entoar com a gravidade das notas sonoras das folhas batidas pelo vento que ressoavam como se fosse um fundo musical da cantiga de vó Juliana, assim, eis que repentinamente alguém bate na porta esta aberta escancara e joga o visitante inteirinho na lama. O jovem esbelto, elegantemente vestido e cheirando a perfume francês se levanta desajeitadamente, sacode a lama presa nas calças e fala: Então a senhora é que é a dona Juliana? Sou sim senhor e o senhor, é o advogado que o dono da casa mandou me expulsar por não pagar os aluguéis? Não senhora, esse menininho lindo em seu colo é o Fernandinho? É senhor, o meu neto, filho da minha filha que Deus levou. O jovem começou a chorar, de ver tanta pobreza e simplicidade naquelas pessoas que careciam de tudo mais mesmo assim ainda eram gentis e bondosos . Se sentiu culpado por nunca mais ter voltado a procurar Maria Júlia nem para se despedir dela quando voltou a São Paulo para terminar a sua especialização, viu pela primeira vez o que o descaso leva as pessoas ao abandono e o entrega à mercê da miséria e da degradação. Sentiu como se fosse na própria pele o que é ser pobre bastante em uma sociedade que não liga para o seu próximo a não ser quando esse lhes interessa. A soberba, a ingratidão, a falta de solidariedade e todas as faltas que o acometimento intrínseco do abandono causa o ser humano. Ele, não sabia explicar o que estava acontecendo, nem se foi um sonho ou visão que teve daquele anjo lindo de grandes asas azuis, que pousou na sacada de seu apartamento e falou sobre o menino Nando, seus filho esquecido e abandonado e porque? Logo ele estava voando para São Luís desembarcando e sem nem ao menos ir a casa de seus pais começara a grande procura. Em uma cidade pequena as pessoas logo são encontradas e agora o que ele faria. Primeiramente tomou o filho nos braços e chorou copiosamente, abraçou a avó da criança e disse depois direi o que faremos, vamos. Vó juliana replicou para onde moço? Senhora eu sou o pai do seu neto e os estou levando a morar provisoriamente com a minha família que resume-se em meu pai e minha mãe, mais logo vou arrumar uma casa que nos abrigue com dignidade. Então Juliana disse espere enquanto eu arrumo as coisas, mais Fernando disse não senhora não leve nada que nos faça lembrar o que vocês passaram, agora a vida se inicia de verdade.
E era mesmo a verdade porque Nando agora realizou o seu sonho, tinha um pai, continuaria com a avó e ainda de sobra consegui-o mais dois avos. Fantástico e maravilhoso como as bênçãos de Deus, e todos nos estamos felizes porque mais um milagre de Natal se realizou.