O ENGANO DO COMPADRE
O caboclo ficou muito feliz em receber a visita de um compadre, sertanejo tal como ele, mas que a tempos havia mudado para a cidade grande, agora, tendo vencido na vida, sentiu saudades do sertão onde se criou com os demais caboclos da região, resolveu voltar as suas origens, rever os velhos amigos da roça e contar as vantagens e aventuras vivenciadas na capital do estado, onde agora sim, já não é mais capacho destes pequenos proprietários do lugarejo perdido na imensidão deste pais colossal. Lá na cidade tem um trabalho com carteira assinada e todos os direitos da tal Lei Trabalhista, todo final de mês, faça sol ou faça chuva, la no banco esta depositado o valor de seu salário e segundo o caboclo ingrato, isso sim é que é vida de gente.
Muito bem acolhido pelo compadre do campo, companheiro de infância e juventude, ficaram até altas horas da noite no papo ferrado sob a luz de uma lamparina de querosene quase apagando, a comadre cochilando sentada a beira da taipa do fogão de lenha onde o braseiro mantinha quente o café no bule de ágata, recordaram ali os fatos passados e o visitante contando suas vantagens relatando que lá na cidade grande não tem isso de tirar água do poço ou descer até a bica na mina para trazer água pra dentro de casa com o pote, lá tem água encanada é só abrir a torneira e ela corre abundante, o banho, é chuveiro elétrico, não precisa esquentar a água pra por no chuveiro, é só descochar o registro e a água cai morninha como uma chuva sobre a cabeça da gente, lá não precisa de usar urinol a noite, a privada é dentro de casa e com a vantagem que faz as necessidades sentado no vaso. Os sertanejos que nunca tinham visto coisa igual ficaram maravilhados com os papos do compadre, e a bem da verdade até acharam um certo exagero nas suas colocações, era a primeira vez que ouviram dizer que se cagava sentado, ainda mais num vaso pois aqui na roça, quer atrás da bananeira ou na privada, é de coque mesmo que se faz este serviço mas afinal de contas, o compadre era um homem digno de toda confiança, impossível ter se tornado um mentiroso descarado desta forma, assim neste papo furado foram dormir altas horas na certeza que no dia seguinte a vida continuava, vacas para ordenhar, porcos para tratar e os serviços rotineiros do sitio que embora sendo um domingo não podia deixar de ser executado.
A Comadre arrumou a cama para o compadre no quarto ao lado, haja visto que a casa de caboclo não tem forro, tudo o que acontece no quarto, até ao virar na cama com o colchão de palha é aquele barulheiro que é escutado no quarto vizinho, assim a o deitarem logo pegaram no sono mas nada do visitante dormir, desacostumado com este tipo de colchão, estranhou a cama, o compadre roncava feito um capado gordo e quanto o visitante chegou cochilar, logo acordou num sobressalto, teve a impressão que os compadres já haviam levantados e que o dia estava amanhecendo, desacostumado que estava com os sons campestres mas ao ouvir um barulho que parecia vir da cozinha, teve absoluta certeza de que a bondosa comadre já estava coando o café, resmungou em voz alta na tentativa de obter dialogo com o compadre anfitrião
___ Eita compadre por isso que é bom aqui no sitio, num é que já estou escutando o barulhinho daquela coisa que aprecio muito.
O Barulho foi minguando e logo o silencio voltou a reinar, ouviu-se o cantarolar dos galos, primeiro no terreiro do compadre, depois a ecoar pelo bairro e foi então que percebeu que ainda era noite, o barulho no colchão de palha no quarto vizinho indicou que a alguém voltara ao aconchego do leito e então teve a certeza de que aquele som familiar não era a bondosa senhora coando o café, estava apenas fazendo xixi no pinico.