O Amante Pefeito
Era fiel, sensível, romântica, criativa, gostava de atenção só para si, mas era de uma dureza de coração como toda pessoa do signo de leão. Não gostava de ficar falando o que já era óbvio, porque achava tolice. Lívia vivia reclamando do comportamento do marido tal era a falta de atenção. Não que fizesse por querer, mas por achar que estava tudo ok. No namoro não fora assim. Geroboão dava toda a atenção possível, coisa que a deixava segura. Então, sua criatividade era eficaz para agradar o namorado:
- Cara você acredita que a minha namorada é um doce? Juro! Palavra! Imagina que ela, bom você sabe, ela é branca. Agora olhe bem para mim.
E o amigo:
- Você é um preto muito sortudo isso sim!
Geroboão dissera todo garboso de si:
- É isso mesmo. Mas isso não é a chave da questão.
- O que é, então? Leandro, que estava entrando no ramo de jardinagem quis saber, porque já estava sôfrego.
- Ela me deu um presente: uma casinha linda feita de papelão. Dentro um Sonho de Valsa, um Ouro Branco, uma carta romântica onde ela me disse o quanto me ama. Ao final da carta, ela me fez uma pergunta: “Você sabe o que significa?”
- Ela te fez um enigma?
- Exatamente! - disse todo eufórico. - É claro que o Sonho de Valsa significa a eu que sou o negão e o Ouro Branco a significa, porque ela que é branquinha. O doce do chocolate em si é o nosso namoro e a casinha é o nosso futuro lar.
Mas, isso fora há muito tempo. Naquele tempo não havia internet. Depois que se casaram, Geroboão achou por bem comprar um computador. Aí a máquina valia mais do que a própria mulher. Ele dava mais atenção para suas amiguinhas da internet do que para a própria esposa.
Lívia começou a mudar gradativamente. Já não era tão doce como fora; já não cozinhava com o mesmo esmero; não era mais paciente como fora no namoro; não dava mais aquele carinho cheio de ternura de outrora; não ligava tanto para fazer amor como no namoro. De certo Geroboão pensasse que era a vida de casado. “Isso é normal”. E dentro de toda essa normalidade o casamento ia sendo empurrado com a barriga na visão de Lívia, enquanto na visão de seu marido tudo ia de vento e popa.
Contudo, Geroboão batia no peito com convicção:
- Minha mulher é do tipo de pessoa que prefere terminar o relacionamento do que trair, porque a traição não é da índole dela e muito menos de seu temperamento. Com certeza se traísse não se perdoaria nunca.
Leandro, que era o amigo mais próximo, procurava dizer para ele tomar cuidado, porque Lívia estava diferente. Geroboão achava que era paranoia e que estava tudo bem, enquanto “a rosa é linda, mas espeta o dedo”.
Certa vez Leandro lhe disse:
- Pense numa rosa bem tratada no jardim. Linda, né é verdade? - O amigo concordou com um gesto. - Você como todo bom receptor quer expô-la para uma visita que vem de longe. O que você faz, então? Corta, põe num vaso lindo e a coloca em cima da mesa para ser vista. Quando a visita chega, elogia a sua rosa e lhe dá os parabéns. Mas, nem você e nem ela pensam que no momento em que a rosa fora cortada, ela tinha sido morta.
- Que nada! Você é cheio de filosofia de jardineiro. Disse, Geroboão sem se importar com a filosofia daquelas palavras.
Outro dia Lívia pegou uns email-s numa folha que seu marido deixara em cima da cômoda com uns nomes que nunca tinha visto na vida. Ficou triste, chorou àquela noite inteira. Logo depois bateu um ódio em seu coração leonino. Era a razão que lhe falava mais forte do que todos os sentimentos nobres. “deusadebano@hotmail.com; loraça_delícia@hotmail.com...” Uns fakes malditos mesmo.
“Estou triste, mas não vou mais chorar, porque você não merece. Depois que levar um chifre já sabe o porquê. Isso se souber. Não vou dar bandeira como você dá.” Colocou o recado em cima da cômoda juntamente com os email-s. Quando Geroboão viu, acariciou a mulher e deletou todos os endereços na frente dela como prova de seu amor. Achou que estaria tudo bem dali em diante. Deu uma maneirada na internet, para abrandar o coração da fera e seguiu como se nada tivesse acontecido.
Como Lívia era mais nova que Geroboão nem parecia ser uma senhora. Ela, que tinha os cabelos lisos, louros e longos, rosto angelical e cintura de pilão mesmo depois de ter Luís, não parecia ser mãe. Antigamente ela era bem esquelética, mas o Luizinho fez um bem tremendo para seu corpo, porque agora parecia uma autêntica brasileira, com dotes peculiares que chamavam a atenção de muitos homens. Sua meiguice era demais. Só que o nascimento de Luiz a atrapalhou em seus estudos. Agora com o filho maior, ela podia retornar.
E foi no colégio que conheceu Fabiano:
- Eu sou casada e não te quero.
Fabiano não teve muito que argumentar. E se o marido dela aparecesse armado na porta do colégio? “Melhor não arriscar, mas que ela tá querendo, ah, isso tá!”
Em casa Lívia dizia os seus “nãos” gloriosos. Coisa que deixava Geroboão todo feliz. Certa vez, ele pôde contemplar a mulher dizendo um não para um rapaz do colégio. Ela não o tinha visto, mas ele sim. Geroboão se sentiu muito bem amado, mais certo da fidelidade de sua esposa.
Mas, logo apareceu outra pessoa. Este, por incrível que parecesse, também se chamava Geroboão. Por não ser um nome tão conhecido, Lívia ficou apetecida por ele. Já não teria mais problemas em confundir os nomes. O homem sempre faz o seu papal, porque a mulher sempre é a cobaia da vez e a presa era uma mulher casada. “Ela deve fazer mil e uma coisas, porque é casada. Com certeza não tem fricote.” E ali, Lívia combinou com o amante de modo que seria segredo para todos no colégio, porque seu marido era louco o suficiente para matar. “E eu estou gamadinha demais em você para lhe perder, concluiu.”
O outro Geroboão ficou apaixonado pelo dolo. Aí faziam os trabalhos escolares juntos, mas ninguém suspeitava, porque Lívia era casada, o marido dela vinha buscá-la várias vezes na porta do colégio... E ele não tinha a sorte de ir buscá-la justamente nos dias que ela ficava na porta da casa do amante conversando e namorando.
Naquele dia Lívia não resistiu e cedeu à perfídia total.
- Assim eu não aguento! Disse o amante. – Você é linda, toda apertadinha. E eu lhe quero! Quero só para mim, por que você não larga o trouxa do seu marido?
Contudo, um filho e o marido pesaram muito. Ela não poderia simplesmente jogar tudo para o alto. O que sua mãe e sua irmã iriam dizer?
- Eu não vou terminar meu relacionamento por causa do meu filho. Seria uma grande tolice minha.
Aquilo acabou com o coração do amante. Mas, ele não podia fazer nada para mudar a situação. Ele, que era evangélico se bandeou para o caminho da prostituição de uma vez, para aliviar a dor que sentia.
E a dissimulada continuou sendo vítima, enquanto o marido continuava implorando para ela fazer amor com ele, coisa que acontecia uma vez por mês, para dizer que não estava cumprindo as suas obrigações de esposa.
- Você nunca me dá atenção! Porque eu tenho que lhe dar assistência? Lívia se desculpava.
- Estou trabalhando 12 horas por dia, amor. Chego morto de cansaço para pôr tudo aqui dentro de casa, não compro nada para mim e quando compro é para você e para o Luiz e você ainda não quer fazer uns carinhos para aliviar minha tensão? É claro que você não sabe o que eu passo naquela porcaria daquela empresa. Tem dia que eu me levanto e só vou trabalhar por causa de vocês.
A discussão tinha sido calorosa. Naquela noite, Geroboão não conseguiu dormir direito. Lívia começou a sonhar com o amante, porque fazia algum tempo que não o via, e dizia coisas loucas dormindo, como se estivesse frenética de excitação, de modo que acordou o marido:
- Ah, Geroboão, meu amor! Assim! Isso! Com força...
Geroboão conseguiu dormir mais tranquilo depois disso. Da empresa ligou para Leandro com um sorriso enorme no rosto.
- Minha mulher é uma santa. Até dormindo, em seus sonhos chama pelo meu nome.
16/12/2010 17h37