MEU CACHORRO PERI (parte 2)
Enquanto o Peri estava aprendendo a pegar frangos foi mais fácil, tocar os porcos para o chiqueiro um pouquinho mais difícil, mas o terrível foi ensinar tirar vacas da roça de milho. Nas primeiras vezes eu gritava: Pega Peri! Ele latia, de longe, com medo daquele bicho cem vezes maior que ele. Eu ficava rouco de gritar: pega Peri, pega Peri e nada. A vaca só abanava o rabo como se ali só existisse um mosquito lhe incomodando. Teve um dia, depois de me cansar de correr atrás, ele criou coragem e deu uma mordida na perna da vaca que lhe deu um belo de um coice que o mandou a cinco metros de distância. Aquele episódio foi motivo para ficar uma semana de molho com a perna machucada e sem tomar nenhum puxão de orelha. Pedi meu pai para arrumar a cerca de arame mas não adiantou. Depois de sua recuperação, lá estávamos de novo, tentando tirar a bendita vaca da roça. Parecia que ele queria se vingar dela. Deu uma mordida, a vaca deu um coice e ele se esquivou, outro coice, outra esquivada, outra mordida e a vaca começou a andar. Aí dei uma pequena ajuda para ele pensar que era grande: Peguei um pedaço de pau e saímos correndo atrás da bendita vaca ladrona. Tive que gritar para o Peri parar senão ele matava a pobre coitada. Penso que foi o dia mais feliz da minha vida, meu Peri mais parecendo um mosquito correndo atrás de um elefante, e a vaca deveria estar pensando como um bichinho tão minúsculo tinha os dentes tão afiados. Nunca mais precisaria correr atrás da Mantiza, nome que meu pai deu para esta vaca que até hoje não consegui descobrir de onde veio. Cerca de arame para a Mantiza era igual onda para surfistas, tirava tudo de letra.
Subia a escada de minha casa, entrava na cozinha para ver se tinha alguma palha de milho que minha mãe levava para ascender o fogo. Eu já estava cansado de ouvir meu pai me pedir:
-Zé, tira a Mantiza da horta.
-Zé, tira a Mantiza da roça.
-Zé, tira a Mantiza do chiqueiro.
-Zé, dá um jeito na Mantiza!
Agora eu já tinha um aliado de peso, meu Peri.
O Peri aprendeu todos os desejos da Mantiza. Quando ela tentava entrar dentro de casa tomava uma mordida no focinho, quando tentava entrar no chiqueiro tomava uma mordida nas pernas e quando entrava na roça de milho ele corria atrás dela até que saísse entre dois fios de arame, cortando suas tetas. Em cada parida que a Mantiza teve perdeu uma das tetas, chegando ao cúmulo de no último bezerro, ela não ter mais teta e meu pai ser obrigado a dar mamadeira para o pequeno bezerro não morrer de fome. Infelizmente, esta história do Peri com a Mantiza acabou terminando em tragédia depois que fui obrigado a estudar na cidade.
Meu pai tinha arado uma terra nova. Pedi a ele que cercasse a roça com seis fios de arame bem esticados para não precisar ficar eu e o Peri vigiando a roça crescer. E assim foi feito, cercada de três lados por 6 fios de arame, esticados de uma forma que um ser humano não conseguia passar. No quarto lado, era uma ribanceira de ribeirão de dez metros de altura que nenhum cabrito conseguia subir. Quando a roça começou a nascer, fui obrigado a ir para a cidade estudar, coisa que mais para frente vou relatar. O dia que meu pai foi medir tarefas para os empregados capinarem, deu de cara com a Mantiza comendo milho que já estava pela metade. Como eu estava na cidade, o Peri estava com meu pai. Ele estava com tanta raiva da Mantiza que mandou o Peri pegar e foi embora.
Falou:
- Pega Peri!
Ninguém sabia a palavra de ordem para o Peri parar de fazer qualquer coisa era: - Deita Peri! Ele correu atrás da Mantiza até ela se atirar num barranco de dez metros de altura.
O dia que cheguei da cidade e fiquei sabendo, foi umas das minhas maiores tristezas. Até o Peri ficou triste porque parecia que a vida dele sem a Mantiza não tinha sentido. Ninguém conseguiu entender como a Mantiza entrou naquela roça mas o Zé Batista, companheiro de meu pai desde a infância, me falou que ela deitou debaixo da porteira de arame e foi se arrastando igual a uma cobra até conseguir ficar do lado de dentro da roça. Difícil acreditar mas, em se tratando da Mantiza, tudo era possível. Infelizmente foi a última travessura dela em busca de um capim mais verde.
JOSÉ EDUARDO ANTUNES