APARENTE DO APARENTE

 

 Em uma família não muito distante...



Eu sei. Você já disse inúmeras vezes para ela:

- “ Essa é a melhor idade. Bom, se não é a melhor, ao menos é uma boa idade”.

- “Para quem? Para quê?” Ela questiona.

Lembro-me bem de suas palavras:

- “É a forma de lidar com o envelhecer que realmente importa. A sabedoria a fluir das experiências vividas; a maturidade a compensar a impulsividade, etc, etc...”

Há anos você vem repetindo essas palavras em seus ouvidos. Um dia, quiçá ela se convença dessa verdade. Na realidade,  percebo: ela só acredita que existe alguma vantagem nessa terceira idade quando paga meia-entrada no cinema, teatro, etc... e não precisa enfrentar uma fila. No entanto, no fundo, no fundo... se irrita. A cada argumento meu ou seu em relação a qualquer coisa, ela refuta:

- “O que você me diz quando a cada manhã olho no espelho e não me reconheço. Onde está a prerrogativa da madureza? Está lá... apenas a espreitar um esforço vão”.

Eu sei, eu sei... você já disse a ela também: “apenas o aparente do aparente... “A essência permanece intocável, sem idade, sem rugas se o espírito permanecer em harmonia”. Mas o que fazer? Desde quinta feira passada ela faz esse ritual: coloca-se defronte ao espelho suspenso num galho sob a sombra da jabuticabeira e assinala as novas marcas do rosto. E as relaciona com os aborrecimentos de cada dia.

- "Eu sei o que vai dizer. Está bem: aguardo o tempo de o vento soprar, seu espírito se aquietar e retomo o assunto tão logo ela saia debaixo dos ramos da velha árvore plantada na infância do seu quintal..."







heleida nobrega
Enviado por heleida nobrega em 22/09/2010
Reeditado em 22/09/2010
Código do texto: T2513967
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