O MENINO E O MONJOLO
Eram tempos bem diferentes dos atuais no lugar onde a tecnologia, leis e a ganância por vencer na vida levaram seus moradores para a cidade, principalmente os grande centros urbanos em busca de melhor qualidade de vida, levado por propagandas enganosas com anuência dos nossos governantes, desprezando a verdadeira qualidade de vida que possuíam na roça, a bem da verdade sem as regalias que a cidade oferecia, entre as quais a energia elétrica, água encanada. A vida aparentemente era mais difícil, verdade era também que a falta de investimentos no campo dificultava a vida, porem jamais tirava a dignidade e a qualidade da mesma, visto que o campo fornecia ao camponês tudo aquilo que ele carecia para sua sobrevivência, bastando para isso, homens públicos suficientemente capazes de defender os interesses dessa gente que se afastaram de suas origens, mestiçados por costumes e tradições estrangeiras, hoje se perdem nos grandes centros urbanos, mas ainda se encontram migalhas de historias vividas naqueles tempos difíceis.
No bairro populoso não havia escola para o ensino básico, primário na época, assim um movimento encabeçado por alguns pais de crianças que queriam que seus filhos freqüentassem escola para aprender ler, escrever e fazer contas, até nem tinham a preocupação com estudos mais avançados, mais queriam dar o básico para que não fossem taxados de analfabetos como muitos deles eram, pressionado o então prefeito na época pleiteou junto aos órgãos competentes uma escola de emergência para o bairro, o que aparentemente não foi difícil, porem depois de tudo arranjado, surgiu um outro problema: o espaço físico para a instalação da dita cuja sala de aulas.
Um dos sitiantes do lugarejo cedeu de bom grado e como o ano letivo já se iniciava e a titulo de urgência, a sua tulha onde depositava o seu café, visto que estava vazia e só no segundo semestre seria utilizada e ali instalou a sala de aula da Escola de Emergência do Bairro Água das Barras até a construção de um prédio próprio num ponto estratégico do bairro e que por coincidência ou não, também foi cedido pelo mesmo sitiante e assim começaram as aulas na escolinha do bairro.
A professorinha era uma bela jovem que vinha da cidade todos os dias numa charrete de aluguel, ao todo eram 42 crianças que se abarrotavam na tulha de café, sentando até três crianças por carteira onde normalmente cabiam duas, a lousa improvisada eram um grande quadro de madeira pendurada em uma das paredes e ali eram ministradas aulas simultaneamente para o primeiro, segundo e terceiro ano, sendo que a maioria das crianças estavam no primeiro ano.
A hora do recreio era uma correria só, crianças a brincar pelo terreiro de secar café, a água vinha do poço da residência do colono mais próximo da tulha, os sanitário era uma privada também nas imediações da escola, porem de uso único para meninos e meninas, cabendo a professora nestes momentos cuidar da correria da molecada e organizar o uso do banheiro, fazendo com que os meninos respeitassem e dessem prioridade as meninas. Merenda escolar não existia, muito embora as crianças sempre levassem seus lanches, cada um conforme sua criatividade e poder aquisitivo, geralmente era m embornal de pano para o material escolar e outra para o lanche que nesse momento era trocado entre os alunos e que portanto a professorinha também deveria observar para que os molecotes maiores não ludibriassem os menores.
Nas proximidades da escola a uns duzentos metros aproximadamente, corria o ribeirão que dava nome aos bairro, tinha uma bela mina onde as mulheres lavavam roupa, uma pequena represa para a tirada de água utilizada para tocar um monjolo, ferramenta utilizada pelos caboclos para descascar arroz e café, também para socar milho, fazendo o fubá e a canjica, enfim uma ferramenta útil e que não tinha custo algum, era só colocar o produto a ser beneficiado no pilão, abrir a entrada de água pela tirada, e a água caindo através de uma bica no cocho do monjolo o punha em movimento, cocho cheio de água, que ficando mais pesado,fazia com que a cabeça do monjolo se levantasse e a água do coxo era despejada no rio, no lugar conhecido por “inferno do Monjolo”, uma vez esvaziado o cocho ficava mais leve e a cabeça do monjolo por sua vez caia sobre o pilão, onde estavam os produtos, num vai e vem incessante ate a completa realização do serviço planejado. Era uma bonita cena de se ver.
Por mais cuidado que a professorinha dispensava aos seus pupilos, estes sempre fugiam pelos arredores da escola e acabava aprontando, foi assim que certo dia na hora do recreio, foram parar na beira do ribeirão, ninguém por perto, as mentes férteis já começaram a maquinar. Ao final do recreio a professora tinha um sininho para chamar a criançada para sala de aula, o sininho tilintou, saíram correndo rumo a tulha mas dois dos meninos, peraltas que eram, apossou de um mamão maduro que estava num pé a beira da mina perto do monjolo, colocou no pilão onde estava socando milho talvez para fubá e saíram correndo alcançando os demais a entrada da sala de aula como se nada tivessem feito. A professora só ficou sabendo do acontecido quando no dia seguinte o seu Aristeu, colono e responsável pelo monjolo, apareceu furioso e comunicou a professora o ocorrido e como ninguém delatou o delinqüente, o resto da semana os meninos ficaram sem recreio, castigo merecido pelo ato de vandalismo, alem do que nunca mais foi permitido a descida dos alunos e alunas as margens do ribeirão.