Promessa para Todos os Santos
O Ronaldo era um jogador inveterado de “pif-paf”. Todas as tardes na cidadezinha onde morava, se alguém precisasse falar com o Ronaldo era só ir à casa do Argentino. Lá estava o nosso jogador em uma mesa de jogo, rodeado pelos seus amigos de carteado.
Na época de chuvas, a cidade vizinha costumava ter grandes enchentes, uma vez que cortava a cidade um rio caudaloso. Anualmente, todos sofriam com as inundações e não era raro acontecer uma ou outra morte, sem falar nos prejuízos materiais.
Em determinado ano, correu a notícia de que a enchente no município vizinho tinha sido a pior de todos os tempos e já se noticiava algumas mortes. Ronaldo, o jogador compulsivo, apavorou-se com o noticiário, pois tinha um filho residente na cidade das enchentes.
Temeroso, Ronaldo faz uma promessa para todos os Santos. Durante um ano inteirinho não jogaria mais cartas, desde que não acontecesse nada de mal para seu filho.
Finda a enchente, realmente, nada aconteceu de ruim para o filho do Ronaldo.
O carteado continuava firme na casa do Argentino e o Ronaldo limitou-se a apreciar o jogo de seus amigos. Em pé, rodeando a mesa, andava de lá pra cá e de cá pra lá, mostrando nervosismo. Ficava numa torcida danada. Roía as unhas, “sapeava” as cartas dos companheiros e só retornava à sua casa depois que todos acabavam de jogar.
Havia um respeito mudo ao compromisso do Ronaldo. Afinal, promessa é pra ser cumprida, ainda mais que tinha sido não apenas para um Santo, mas para todos os Santos.
Lá pelo quarto mês de promessa, aparece o Aderaldo na cidade. Costumava passar férias com a família na pequena cidade e tomou conhecimento da promessa do Ronaldo.
Aderaldo, todos conheciam, era aquele tipo de homem que tinha solução para qualquer coisa. Quando viu a agonia do Ronaldo, passou a “maquinar” uma maneira de fazer seu amigo romper com a promessa. Fez de tudo para que o jogador pedisse aos santos a quebra dos votos, sem qualquer êxito.
Veio, então, a idéia maravilhosa, até hoje comentada na cidade. O Ronaldo deveria mudar o juramento para algo pior do que havia prometido, quer dizer, aumentar, de cara, a penitência de 1 ano para 05 anos, mas com importante alteração, que a seu ver, contentaria todos os santos e mais alguns que porventura viessem a se tornar santos, segundo os critérios da Igreja.
Na casa do Argentino, onde o jogo “comia solto”, surgiu o famoso diálogo:
- Ô Ronaldo, troca a penitência, ao invés de deixar de jogar baralho, você deixa de comer jaca!
- Mas, Aderaldo, aí não tem sacrifício, não posso fazer isso - respondeu o Ronaldo.
- Deixa de ser bobo, você acha, então, que eu faria essa troca com todos os Santos, sem uma compensação bem grande? Não, você vai deixar de comer jaca, mas por 05 anos.
- Isso ainda é pouco, Aderaldo!
- Não é, não! Presta atenção: 05 anos sem comer jaca e sem tomar licor de jenipapo, tá bom assim?
A turma que estava jogando só viu quando o Ronaldo pulou em cima da mesa de jogo , já pedindo cartas, ao mesmo tempo em que dava um tremendo berro de alegria : “ACEIIITOOO”.