LONGA ENFERMIDADE

LONGA ENFERMIDADE

ALTO SUGESTIONAMENTO

VIRGULA: 3

O sol já cortara preguiçosamente o zodíaco iluminando o mais possível aquele céu azul de verão. A população também acompanhava a jornada calorenta do astro-rei, é claro alguns raros cidadões iniciara a labuta diurna bem mais cedo que o sol, principalmente Onofre José de Lima que naquela altura já ordenara as seis vacas, enchendo o caldeirão grande de alumínio e dois garrafões de vinho, com o leite branco e saudável do seu pequeno rebanho. Suas três filhas mais velhas estavam com ele, elas adoravam tomar aquele leite quentinho ora com açúcar mascavo, ora com conhaque, cerimonial inadiável do dia a dia.

Como era esperado Das Dores da Silva Lima acorda e aos berros, escandalosa como era, chama a atenção de todos os vizinhos. Foi socorrida pela sua irmã Margarida, que desde cedo aguardava o seu despertar. Sempre que acontecia alguma coisa era a primeira a dar assistência a ela, pois conhecia como ninguém o gênio da irmã mais velha. Prestimosa, verdadeira artista em trabalhos manuais, filha de Maria, respeitada por todos, professora, enfim tudo de bom que pudesse encontrar em uma pessoa. O seu marido era o lado oposto, o Tião Nunes, alcoólatra inveterado, mulherengo, não tinha nenhuma semelhança, com o comportamento, a moral e o trabalho da esposa.

- Meu Deus, o que vai acontecer comigo, vou perder o emprego, essa menina precisa apanhar. Onofriii, me acode, não agüento de vergonha, vou morrer. Uaaaahhh dava tremenda ânsia, como se fosse por para fora tudo que tinha no estômago. Como não tinha nada ficava só no uaaahhh.

-Calma Das Dores, aquieta, vamos esclarecer tudo com a comadre Elza. Aquietava-lhe Margarida.

- Atenção, atenção, o serviço de alto falante de Anicuns tem a subida honra de comunicar o falecimento do Sr. José Terra Baía, ocorrido em sua fazenda, após longa enfermidade, o féretro, será realizado amanhã ás 10:00 horas no cemitério da capela, em sua propriedade. Agradecemos por mais este ato de fé Cristã. O anuncio era pré e sufixado pela marcha fúnebre de Mozart.

Justamente os acordes acalmam a Dona Das Dores quanto à explosão da expulsão da sua filha, mas simultaneamente começa outro drama. Basta ouvir esse tipo de notícia, que ela passa a sentir os mesmos sintomas da pessoa que morreu.

-Manda Margarida alguém na farmácia do Onofre Tintim buscar remédio bom para longa enfermidade. Ele sabe qual o Zé Terra tomava, manda o Onofre buscar. Esterica, rolava na cama, urrava, blasfemava, reclamava, fazia tudo para chamar a atenção, era essa a sua doença mais grave, o alto-sugestionameto.

- Onofre ainda não chegou do curral, parece que foi atrás da Garrinchinha...Era a vaca curraleira preta com manchas brancas e pernas, óbvio, tortas, fugiu. Propriedade de uma das suas filhas que ganhou de presente de batizado do seu padrinho.

- Manda então as meninas.

- Elas foram com Onofre.

- Manda outra pessoa, qualquer pessoa, basta falar ao Onofre Tintim que ele prepara o remédio e põe na conta.

- Sim Das Dores, já foi providenciado.

Neste momento adentra pela sala, bem trajado, o Dr. Dione,

-ÔÔÔ de casa, bom dia...

Como não encontrou ninguém, foi entrando até o quarto escuro e com mau cheiro, onde dona Das Dores era assistida pela sua dedicada irmã.

-Bom dia! ...

Recebendo de Margarida o mesmo cumprimento, mas dona Das Dores mais rabugenta ainda nesses momentos resmunga:

- Bom dia nada, além da expulsão da Gema, estou passando muito mal, sito todas as dores que o Zé sentia, a tal de longa enfermidade mata, não mata Doutor? Estou sentido tudo que ele sentia.

- Calma Das Dores, não é assim. O Sr. José Terra, sofreu a alguns dias uma chifrada de uma vaca brava, perfurando-lhe o intestino, teimoso como uma porta, não quis ir para a capital operar. A chifrada deu-lhe uma infecção e por causa disso ele faleceu.

-Vou falar para o Onofre de Lima não me levar mais para o curral, sei lá se uma vaca vem p'ra cima de mim fazendo-me um tremendo estrago, eu heim, não vou mais ao curral, não vou de jeito nenhum.

Dr. Dione toma uma xícara de cafezinho servido por Margarida, após medicar a sua doente, dá uma boa xingada nela como de costume, despede-se e vai embora.

Onofre chega do serviço de ordenha, ajeita os vasilhames de leite na cozinha, vai para o quarto, onde a sua mulher desesperadamente o aguarda. Ao vê-lo, dona Das Dores solta um longo gemido rolando na cama.

-Aaaííi'...

- Mé que é mulher? Vamos levantar? O dia está lindo, vamos conversar com a Gema? Fala com muito respeito e ressabiado, devido a um segredo, que ali da casa só ambos conhecem.

-Sim, vou me levantar, daqui a pouco estarei na cozinha para conversarmos com ela. Responde, levanta espreguiçando e sonolenta devido aos calmantes que lhe foram aplicados.

GOIÂNIA, 15 de JUNHO de 2010.

jurinha caldas
Enviado por jurinha caldas em 15/06/2010
Código do texto: T2321948
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