Última Imagem
Abriu a janela afim de que pudesse, ver mais viva a entrada desse sol que irradiava luz. Sentada à beira da sacada no alto de um prédio à beira do mar.Sobrevivia mais, na certeza de que se elevara tanto, que possuía algo dentro de si mesma que não conhecia. Mas era uma elevação pessoal, muito mais intimista do que o normal. Porque tinha cheiro de nada, tinha gosto de vento, não podia tocar, e isso era a única coisa de que tinha saudade. Algo quase carnal, que envolvia algum sexto ou sétimo sentido. De certa forma pressentia, e as coisas com o poder do tempo iam se passando, e se esquecendo do próprio esquecimento. A alma parava de palpitar, mas a grande verdade era que escondia bem no fundo de seu próprio relicário as lembranças. Por que não podia, o destino não queria, e era melhor respeitar as normas desse grande vilão, pois os ventos mudariam, e o mesmo barco velejaria por novos oceanos. O grande problema é que toda vez que sentava naquela sacada, em fim de tarde, não podia esquecer do último pôr-do-sol lindo que havia visto. Correria, altos e baixos, mas nunca aquilo que marcara uma vez seu coração seria esquecido, e toda vez que voltasse a ouvir aquela música de passarinho, se recordaria da mesma última imagem. Era como uma esmeralda, alguma pedra preciosa qualquer, reluzindo e brilhando, com cristais cada vez mais finos, com uma perfeição de enlouquecer.
É que no fundo sempre fora fraca, apesar de sua dureza cotidiana. E quando as fraquezas são mostradas, é como romper um paredão de águas que inundam de todo. E tinha certeza de que aquilo era crescimento, algum entendimento qualquer, alguma etapa que precisava antes de ser vencida, ser substancialmente vivida. E acordava mais lúcida, com vontades que haviam se perdido, era algum sinal de reconstrução.
Apenas em um instante ali enfrente o mar, havia feito a maior reflexão de sua existência. Se salvou do martírio, soube perdoar a si mesma. E descobriu que poderia amar novamente, mas que amaria para sempre aquela imagem de fim de tarde.