OS MACACOS GUARIBAS E O DISCO QUEBRADO

No passado quase toda fazendas tinha seu engenho de cana. Alguns maiores outros menores. Movidos à tração animal, ou a água, quando havia um manancial hídrico disponível. Os grandes engenhos com sua potente roda motriz, fabricada com madeira nobre, ficaram conhecidos como engenho de pau. Estes provocavam um barulho enorme em suas moendas idênticas aos rangidos provocados pelos gritos peculiares dos guaribas, primatas muito abundantes no passado, que viviam em bandos, pelas matas com sua grande algazarra. Pendurado pela cauda o animal gira o corpo de forma espetacular dando um verdadeiro show de malabarismo. Seus grupos de até doze animais são liderados por um capelão de pele escura cuja mandíbula inferior é barbada.

Na fazenda de Antonio Candinho, situada na Ressaca tinha duas grandes preciosidades. O potente engenho de pau, e um grupo de guaribas que desfrutavam da simpatia, de um garoto de nome Divino do Neca. Divino, adorava imitar os animais, distribuido bananas a eles, escondido do patrão. Tonou-se famoso pelas inumeras verdades narradas, desde sua tenra idade até a maturidade, quando abraçou de corpo e alma o vicio de alcoólatra, tornando-se um cômico amador. Principalmente quando convalescia, após uma semana de bebedeira, em suas duas ressacas, a ressaca etílica e a do local onde residia. De qualquer maneira vivia sempre na ressaca, se não uma, nas duas quando convalescia.

A fazenda com muitas matas e cerrados e sua rica biodiversidade, era preferida pelos guaribas, que entoavam o som da garganta em seu rumor diário numa constante disputa com as moendas do engenho, que trabalhavam ininterruptamente, durante o período ente colheita e plantio. Duas juntas de bois moviam diariamente sua potente almanjarra atrelada a ela, naquela eterna caminhada em círculos, espremendo a cana, a jorrar seu precioso caldo.

Tanger os bois era serviço pra moleque, coube ao Divino Neca tal tarefa. Madrugadas sonolentas frio de rachar. Às vezes, em noites enluaradas, noutras negrume total, cheirando a breu de tão escuro. Eis que certa madrugada, nada de encontrar os bois, tranqueira do pasto partida pelos animais. Talvez assustados pelo inesperado voassar de alguma ave de rapina, no seu hábito noturno, fato muito comum no meio rural.

Um dia, dois dias de busca, e nada de encontrar os animais. Já preocupados com a perda da cana, decidiram recorrer ao vizinho com algumas juntas de bois por empréstimos. Mandaram lá o moleque Divino, para tal solicitação. Duas horas após ele retorna trazendo os bois fujões. Feliz o patrão perguntou! - Então Divino onde encontrou nossos bois?

-Resolvi pegar um atalho, cortando a parte mais fechada da mata,quando deparei com os quatro atrás um dos outros, circulando no entorno de uma enorme gameleira, e um bando de guaribas perdurados nela imitando o engenho... Nunca vi coisa mais engraçada, sabe que achei até bacana! Tinha um menorzinho com uma varinha na mão tocando os bois igualzinho a mim! Se o senhor achar que estou mentindo podemos ir lá que verá, formaram trilhas profundas no chão!

- Que isso Divino! Acredito piamente em você, que só abre a boca dizer verdades!

Desde aquela ocasião da moita de espinhos não duvido de mais nada do que sai da sua boca! Quando contou que os guaribas fizeram a festa com aquele pedaço de disco cantando la beira da lagoa? Como era mesmo a melodia! - “Eu mesmo cortei o pau eu mesmo fiz a gamela!”.

Lembro sim senhor! Há se lembro! Eu estava arrepiado de medo porque de tempo em tempo ouvia o cântico – “eu mesmo cortei o pau eu mesmo fiz a gamela!” Eu pensado que eram os bichos que cantavam! Depois descobri quando o vento soprava com mais intensidade na moita de espinho dagulha, um espinho passava em cima do pedaço de disco velho e cantava “eu mesmo cortei o pau eu mesmo fiz a gamela”! Os macacos corriam pra longe assustados e aos poucos iam chegando curiosos olhando desconfiados até que repetia o cântico, e mais uma vez eles corriam! Bicho danado de inteligente! Depois que tirei o disco quebrado de lá me arrependi! Devia o ter deixado!

Inteligentes como são com certeza iam aprender rapidinho a cantar com ele. - É bem provável Divino! Como será que apareceu aquele disco quebrado por lá?- Então não sabe patrão? Foi curiò e canarinho! Os dois moram numa arvore na beira do lago!

Geraldinho do Engenho
Enviado por Geraldinho do Engenho em 10/04/2010
Reeditado em 29/01/2011
Código do texto: T2188131
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