Abedula – A roupa da gorda

*Da série de contos ABEDULA

** Leia também outras histórias do árabe ABEDULA

*** Início da série - o conto ABEDULA

Abedula sempre primou pela inovação no comércio e foi ele quem inaugurou “nos pagos” de Uruguaiana a venda em grande quantidade de roupas prontas – eram peças de vestuário industrializadas nos grandes centros – novidades que literalmente provocaram sensação na cidade , onde ao longo de sucessivas gerações as famílias davam prioridade à confecção de roupas por “costureiras” ou “alfaiates” . Pela influência da fronteira com a Argentina costumava-se chamar esses profissionais de “modistas” ou “sastres”, conforme a especialização em roupas femininas ou masculinas.

Naqueles “idos tempos” a grande maioria das lojas se especializava na venda de tecidos que eram vendidos por metro linear, expostos em grandes bobinas sempre circundadas por vendedores e vendedoras, todos munidos de uma régua de madeira e de uma tesoura para medição dos retalhos . Comprava-se o pano , a linha , o botão e levava-se todo o material para os profissionais que tomavam as medidas do cliente e se jogavam à arte de produção das roupas “sob medida”.

Abedula começou a fazer viagens para São Paulo, onde adquiria roupas que eram fabricadas em série , imitando tendências industriais que se inspiravam em experiências da Europa e dos Estados Unidos . Certa tarde, numa rua do Brás, ele conversou com um imigrante libanês que lhe disse: “Batrício : - “brebare sua loja bara rouba bronta, borque essa realidade não tem volta”...

Comerciante nato, ele ouviu com atenção os conselhos e já na primeira experiência as roupas prontas que Abedula expôs em sua loja causaram uma revolução na região inteira . Não custou muito tempo para que famílias de Itaqui, São Borja e até de Alegrete se deslocassem a Uruguaiana para comprar as “novidades” que Abedula havia introduzido no conservador comércio da fronteira.

As mulheres, sobretudo, estavam encantadas com os vestidos industrializados, em variadas cores e com “apliques” decorativos inimagináveis para os padrões de elaboração das costureiras e “modistas” . Compravam alucinadamente, para a felicidade do árabe que não parava de contabilizar lucros.

Um dia chegou à Loja uma das mulheres mais ricas de Uruguaiana, pessoa educadíssima, mas que ostentava um peso bem acima do normal . Obesa era popularmente conhecida como a “Gorda do Cofre” , não obstante ninguém tivesse coragem de se dirigir a ela dessa forma. A mulher saía frustrada da Loja, porque não encontrava roupas na sua “medida” .

Abedula ficava ainda mais frustrado por não lançar mão no dinheiro da ricaça, pensando como poderia entrar no bolso da gorda .... até que uma noite levantou-se da cama , sacudiu sua esposa , e disparou “Abedula teve uma idéia ” – Chamou a mulher, desmancharam dois vestidos iguais, cortaram e costuraram as laterais, fazendo de duas peças apenas uma . Foi um trabalho que exigiu algumas horas de paciência na antiga máquina de costura a pedal, mas o resultado foi excelente.

Dias depois, Abedula mandou chamar a mulher gorda e lhe disse que havia recebido um mostruário de roupa em “tamanho especial” , abrindo um grande sorriso na cliente que já começava a se sentir diminuída em relação às outras damas da sociedade local. O preço do vestido, ponderou o árabe é bem mais caro, custa quase cinco vezes o valor de um comum – disse – mas a senhora não esboçou qualquer reação e pagou na mesma hora o preço exigido, com felicidade e disse mais , - que poderia encomendar mais peças pois ela compraria tudo ...

Abedula, não apenas duplicou seu lucro, como acrescentou essa curiosa criatividade à história do comércio de Uruguaiana. Dizem que ele só confessou esse causo depois de sua aposentadoria ...