A Consulta

Naquele ano a seca fora terrível, por falta de chuvas o milho e o feijão plantados no dia de São José, com colheita certa para o mês de junho, havia secado, não sobrara nem a palha para a forragem do gado.

Os açudes da redondeza estavam secos, água para os bichos e até para o consumo humano, só no grande açude da fazenda de um rico fazendeiro, localizado a cinco quilômetros dali. - Os animais estavam tão magros e fracos que não tinham mais “pernas” para caminharem aqueles dez quilômetros em busca d’agua. - Verdadeiramente a situação estava periclitante para Manoel João, velho caririzeiro, nascido na Chapada do Araripe; ele não sabia mais o que fazer.

Até a pequena aposentadoria do Funrural, conseguida com tanta dificuldade que lhe ajudava nas despesas da casa, fora cortada por determinação do governo, até que uma comissão desvendasse o mistério de algumas fraudes cometidas no posto da entidade.

Diariamente Manoel João saia de casa, andava pelas redondezas a procura de biscates que lhe rendesse alguns trocados, quase sempre, retornava de mãos e bolsos vazios, a situação de penúria era idêntica em toda a região.

Manoel estava tão aperreado com aquela situação, que já não conseguia conciliar o sono. A comida para a família começou a rarear, sua sorte é que tinha um pouco de feijão e farinha guardados à sete chaves num velho silo de zinco.

Com aquela série de problemas, Manoel João começou a ficar fraco do juízo, já passara a conversar “miolo de pote”, os parentes começaram a ficar preocupados, então, resolveram se cotizar, juntaram dinheiro para levarem o Manoel João a um médico na cidade do Crato – CE para se consultar. - Este quando soube da intenção da família ficou intrigado, relutando para não ir ao médico. Quando estava só, imaginava com os seus botões:

- Quem sabe se eu to doente sou eu, não “danado” de Dotô ! -

Dotô é coisa de mulé !

Imaginava Manoel mordido da vida.

A cada dia que se passava a coisa se complicava ainda mais, finalmente os parentes se reuniram e levaram Manoel mesmo na “marra” para fazer a consulta.

Acompanhado por cinco homens da família, Manoel é conduzido ao Crato, até o consultório médico, onde mesmo a contra gosto é empurrado pelos parentes consultório a dentro, onde é colocado sentado em uma cadeira bem em frente a mesa do médico, este olha para Manoel, e. . .

- Como é mesmo o seu nome meu velho ?

- Mané “seu” dotô, Mané João para lhe servir !

- Manoel me diga uma coisa, o que é que o senhor tem ?

- Cuma “seu” dotô ?

- O que é que você tem homem ?

- O que eu tenho é muito pouquinho “seu|” Dotô ! - Eu só tenho:

sete vaquinha maga, trei sevado e umas trinta cabeça de bode !

- Não é isto que lhe perguntei Homem ! O que eu quero saber é o

que o senhor esta sentindo ! - Entendeu ?

- Agora entendi “seu” Doto ! - Oí, o que eu to sentindo é uma

vontade “danada” de vender os meus troços e arribá com a mulé

pra São Palo, “seu” Doto !

° ° °

Estava diagnosticada a doença de Manoel João. . .