O aquário...
 
O ambiente é restrito, nele poucos podem entrar! Também é milimétrico, poucos podem ficar dentro dele, de tão pequeno!
Também é muito quente, com um ar abafado!
É quase um aquário, com vidros transparentes, á prova de bala...
É uma bilheteria, numa estação de trem, donde se vê quem passa, donde se vende as passagens para quem embarca, donde se informa quase de tudo, para aqueles que estão perdidos em seu caminhar...
O som da voz das pessoas do lado de fora, chega aos ouvidos do operador da bilheteria, filtrada por um sistema de som, que vez e outra falha, que em todas as vezes que é usado, retira a humanidade da voz das pessoas que o utiliza...
E de quem os ouve, por detrás da parede blindada.
Assim dentro deste aquário, sem água, ou apenas as do suor em nossas faces, as horas passam lentas e abafadas...
Fora o afazer inerente á venda de passagens, sua contabilidade e guarda nada mais nos resta, até ouvir um som é tarefa árdua, pois o som que vem de fora, somado ao barulho dos inúmeros ventiladores, chega deturpado e confuso aos ouvidos do bilheteiro, que assim tenta cumprir o seu turno no aquário, na bilheteria blindada...
Entre as horas mortas de espera, para a venda de alguma passagem, o pensamento voa, indo até paragens que em nada, tem a ver com o trabalho...
Em meu turno, tem ocorrido que meu pensamento se dispersa por tantos caminhos. E foi desperto vez e outra, por fatos inesperados, tristes e engraçados...
As necessidades das pessoas são tantas, e são muitas, que conflitam com as regras impostas pelo serviço de venda de passagens...
Um desses momentos, foi quando olhando para a usuária a minha frente, fiquei meio sem jeito...
Ela era uma mulher alta, cabelos compridos, olhar insinuante!
Trazia na mão um sorvete de casquinha, que abocanhava loucamente!
Enquanto pedia o seu bilhete, tomava ciência do valor da passagem, remexia em sua bolsa á procura do numerário, olha-me de soslaio, abocanha ainda uma vez mais o sorvete, enquanto eu, dentro da sauna, dentro do aquário, fiquei imaginando o sabor, o frescor daquele sorvete, que sumia entre lábios vorazes...
E era um tal de vasculhar a bolsa á procura de dinheiro, equilibrar o sorvete na mão esquerda, quando subitamente ela me pergunta:
-O que foi?
E rapidamente disse-lhe meio sem jeito:
-Não consigo tirar os olhos do seu sorvete!
-Eu não acredito que estou ouvindo isso... Disse-me a usuária...
Olhando ao seu redor a usuária como que procurando algum anonimato, muito desinibida, beijou o vidro da bilheteria, com lábios gulosos... Aprumou os seios, volumosos e fartos, dentro do corpete... Rumando para as catracas de entrada da estação!
A venda do bilhete foi concluída... Em meio ao inusitado da cena...
Enquanto eu a via, indo-se embora, toda rebolativa, sentia que o resto do turno no aquário, daquela estação de trem, da Av. Indianópolis, S.P não seria mais o mesmo...
Mas, na verdade, quem seria ela?
E antes de virar a esquerda, descer as escadarias de acesso aos trens,a desconhecida usuária me jogou um beijo, que preso dentro do aquario não apanhei...
Olhei um vez mais para fora do aquário...
Na bancada da bilheteria, um sorvete vermelho, talvez de morango, jazia inerte!
Desmanchando-se, sem dar prazer a ninguém...

Edvaldo Rosa
28/02/2010
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