Episódio do inimigo

Tantos anos fugindo e esperando e naquela hora o inimigo estava em minha casa, da janela vi-o subir penosamente pelo áspero caminho do cerrado, com a ajuda de uma bengala rústica, que em suas mãos não poderia ser uma arma e sim apenas um báculo de sustentação.

ouvi com dificuldade o que já esperava, a débil batida na porta, olhei sem nostalgia para os meus manuscritos, eram rascunhos, sem terminar, do meu livro "Entre Áspas", livro este que, jamais seria anômalo ao ser publicado, mais outro dia perdido! eu pensei. Tive que forçar a chave naquela fechadura velha, verdadeiramente temi que o homem desfalecesse, ele deu uns passos incertos, soltou a bengala e caiu em niha cama exausto. Minha ansiedade o imaginara muitas vezes, mas, só então notei que ele se parecia, de modo familiar, era como olhar um quadro da própria Laura, com bigides e costeletas, seriam quatro horas da tarde naquele instante.

Pedi apenas licença para poder me levantar de perto daquele velho, rodiei a cama e pus-me de frente, olhei-o nos olhos para que me ouvisse e falei:

-Para nossos rostos passaram-se muitos anos mesmo, você por exemplo está acabado, tão velho! Parece que não se cuidou em todos esses anos ou está assim porque não conseguiu esquecer aquela nossa antiga briguinha?

Enquanto eu falava o velho forçava as pernas com aparencia de fraqueza, porém num impulso, conseguiu levantar-se e encarou-me de pé, a minha altura e falou com a voz arrastada:

-Você sabe muito bem que não não é uma simples briguinha de adolescentes, fomos forçados pelo destino a essa desavença para o resto de nossas vidas e hoje que estamos aqui frente a frente, mesmo muito velhos, temos que esclarecer as coisas e que vença o que resistir.

Enquanto ele falava, imaginei algumas palavras e entre elas, resolvi contar-lhe a verdade, só assim conseguiria com que ele mudasse de idéia, assim o fiz:

- verdade que fui muito ruim para você, quando, sem motivos, não pemiti que namorasse com minha irmã Laura, não foi somente por ela ser mais velha que você... E sim por que vocês eram irmãos.

Vi naquele instante, mudar totalmente o semblante do velho, enquanto curvava-se e sentava-se novamente na cama e retrucando:

-Quer dizer que somos irmãos, eu e você?

-Não. Respondi imediatamente

E ele:

- Como não? Então porque dizes que Laura era minha irmã?

Então expliquei:

-Laura não era minha irmã, sua mãe a deu a meus pais, mesmo antes que tu nascesses, eles viviam uma situação muito difícil e não podiam criá-la.

Naquele instante vi surgir dos olhos e descer no rosto enrugado daquele velho lágrimas de angustia e ao mesmo tempo um sorriso demorado com um silencio acompanhado da frase mais bonita que ouvi em toda minha vida:

-Então quando eu chorava no velório de Laura, estava chorando pela minha irmã?

Eu apenas fiz que sim com a cabeça e ele continuou:

-Desculpa amigo!!

Disse isso meio a um abraço fraternal e demorado entre ele e eu.

Luís Pereira
Enviado por Luís Pereira em 23/02/2010
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